Friday, May 11, 2007

O grande campeão

Amigos, depois de longa jornada, finalmente o campeão do Rio recebeu os louros. A massa flamenga está de pé pelas ruas, bares, alamedas; pelos telhados e coletivos; na chuva ou no sol. Campeões.

Quando se pensa num melhor futebol jogado pelo Botafogo em boa parte do certa, como tudo em futebol, pensa-se questionar a conquista. Nesse caso, entretanto, fica mais difícil. O próprio Flamengo chegou à final do certame pela conquista da Taça da Guanabara, e entrou meio que de “araque” – goleados pelo Madureira, em tarde impiedosa de Marcelo, os da Gávea tiveram o favorecimento pela derrota do Botafogo para o Boavista. E então? Quem falhou mais?

O Botafogo apresentou um bonito futebol na Taça do Rio. Parecia que ia arrancar para o título. Contudo, a muralha de vermelho e preto brecou caminho.

No domingo passado, um detalhe selou o empate, quando da expulsão do jovem goleiro Júlio César. O Botafogo era muito superior, perdeu as rédeas da partida e não seria injusto se o Flamengo tivesse virado o jogo. Quem falhou mais?

Foi um grande jogo, o de ontem. Mesmo com limitações e sem jogadas de brilho intenso, a disposição dos dois leões era uma enormidade. Um primeiro tempo de idas e vindas, com chances para ambos os times. Ainda assim, o primeiro tempo foi de ôxo. O Botafogo, tenso pela oportunidade que teve de liquidar a competição na primeira partida; o Flamengo, sentindo o peso da derrota de três tentos para o uruguaio Defensor, no meio de semana. Os dois, naturalmente, muito preocupados um com o outro.

Quando veio o intervalo, Alexis Cuca Stival, o coach alvinegro, inovou: ficou com seu plantel no banco de reservas, em vez de tomar direção do túnel. Tinha a intenção de manter o time aceso com a chama da proximidade dos torcedores botafoguenses. O Flamengo desceu sereno.

E veio o segundo tempo. Arrebatador. Empolgante, talvez, como somente duas outras segundas etapas em muitos anos no Rio: a dos históricos confrontos entre Flamengo e Fluminense, 1995, e Vasco contra Flamengo, 2000. Jogo de arrepiar.

Começando tudo, um gol do artilheiro Souza, quase de carrinho, atirando-se à bola feito um kamikaze, após cruzamento de Juan, aos sete minutos. Boa parte do estádio explodiu como um tiro potente de canhão. E o que se esperaria era o recuo da Gávea, coisa que não aconteceu. Ou o abalo alvinegro, coisa que também não aconteceu.

Oito minutos depois, uma das viradas sensacionais que só o estádio de Mário Filho é capaz de abrigar. O Glorioso tomou frente no marcador. Tinha empatado a peleja com um gol de cabeça do zagueiro Juninho, aos doze. Três minutos depois, um golaço de Dodô, tocando suavemente e encobrindo o excelente goleiro Bruno. Mal sabiam que, uma hora depois, teriam trocado lugar nos postos de glória e lágrimas.

O Botafogo ainda acertou o travessão de Bruno, com nova jogada de Dodô, ao passo que o Flamengo, heróico, atacava incessantemente. Aos trinta, veio a apoteose: Renato Augusto, de longe, acertou o canto médio esquerdo de Max, num petardo daqueles que levanta qualquer torcida em qualquer decisão. Um golaço, digno da galeria de um título.

O empate da Gávea não trouxe predominância para os flamengos, e a partida manteve o equilíbrio que trazia desde o primeiro apito. Lutaram e lutaram, sem maior sucesso no gol redentor. Mais quinze minutos e o Botafogo levou nova estocada: era o fim do jogo. O ataque botafoguense entrou pelo meio de área, em condição legal. Dodô tocou para o gol no canto esquerdo, após a marcação errada do auxiliar Moutinho. Imediatamente, tendo já recebido o cartão amarelo, foi expulso. Uma grande confusão se instalou no gramado, o que geraria vários minutos de acréscimo. Contudo, o árbitro Beltrami, que já vinha com certa lesão no decorrer do jogo e trotava com dificuldade, e que acompanhava os lances à distância, preferiu não correr o risco de estar longe novamente num lance polêmico – e terminou a partida um minuto depois do imbróglio.

Exasperação alvinegra, Dodô fora. Pênaltis.

Bruno pulou com maestria e defendeu o primeiro pênalti, cobrado logo por Lúcio Flávio, um dos melhores do campeonato. Voou no canto direito baixo. Em seguida, fez nova grande defesa e contou também com a sorte: desviou o chute de Juninho e a bola foi ao travessão. Foi o que bastava, aliado aos bons cobradores da Gávea, todos com precisão na hora de converter. E o último, Leonardo Moura, deu uma paradinha de longe, antes de deslocar Max e chutar a bola no canto direito, trazendo a vigésima nona taça do Rio para a Gávea.

Flamengo e Botafogo foram iguais nos três empates que tiveram durante a competição. O Flamengo não conseguiu vencer os outros tradicionais rivais durante a disputa, Vasco e Fluminense. O Flamengo nem sempre teve brilho nas partidas. Porém, no detalhe, na pequena nuance, soube ser o vencedor.
O merecido vencedor. O grande campeão.
E, aos derrotados, o ônus da lamúria.

Paulo Roberto Andel, 07/05/2007

O tropeço

Em sua trilha pela Copa do Brasil, o Tricolor encarou ontem o Atlético do Paraná. Vinte mil pessoas na expectativa, o que pode ser considerado um bom público para os dias de hoje: além do horário tardio, a má jornada de Laranjeiras no ano é um revés para o estádio lotado.

Além do caráter decisivo, enfrentar o rubro-negro sulista tem sido uma batalha de vida ou morte para o Tricolor, seja em pingue-pongue, carteado ou futebol de botão. A massa das Laranjeiras não esquece jamais das cenas lamentáveis ocorridas nos jogos de 1996 – tanto a conturbada e violenta derrota em casa quanto a vergonhosa entrega do jogo seguinte, quando os paranaenses favoreceram claramente o Criciúma e nos conduziram ao descenso. Anos depois, cá estamos nós em nova batalha.

Novamente o Tricolor apresentou um velho problema. A síndrome do gol sofrido.

Tudo corria bem, num bom jogo. Com a volta de Renato à liderança do plantel, parecia um time vibrante, guerreiro, e com um espantoso aumento médio de velocidade, até mesmo de jogadores que não têm a explosão como forte, vide o exemplo de Carlos Alberto.

Na correria, logo veio o gol. Passe de Júnior César, um excelente cruzamento do lateral Carlinhos e uma cabeçada certeira daquele que tem sido o melhor Fluminense da temporada: Thiago Silva. Ângulo esquerdo do goleiro Guilherme vazado, havia um clima de alívio: depois de tempos sem atuações convincentes, o Tricolor parecia estabilizar-se. Ainda havia muito jogo pela frente e, quando ele veio, tudo levava a crer numa vitória convincente, gols e gols sendo perdidos. Supremacia completa de Laranjeiras, ainda que o Atlético não fizesse um mau jogo – estava, sim, era completamente perdido pelo poder do adversário. Aos poucos, o match tomou ares de equilíbrio e então veio a derrocada.

Aos trinta minutos, o time paranaense empatou o jogo, num lance quase despretensioso. O lateral-esquerdo paranaense Nei desferiu um chute de longa distância, com força. A Bola ainda resvalou na defesa e tomou a direção do ângulo esquerdo. O goleiro Fernando, que não tem sido muito afeito às bolas defensáveis, nada pôde fazer para desviar o tirambaço do gol. E o mar negro tomou o Maracanã. Um silêncio enorme, oceânico. Parecia a própria eliminação. Muitos exaltaram-se e passaram a xingar Fernando até mesmo na cobrança de um tiro de meta.

O time desmoronou. Passou a errar passes de meio metro. Tudo virou impaciência. O jogo passou a ser atleticano, o que perdurou até o apito final da primeira etapa.

Na volta, o que se viu foi o Tricolor em chamas, machucado, partindo até meio que atabalhoadamente para a vitória, enquanto os paranaenses agüentavam firme na defesa, buscando esparsos contra-ataques. Por volta do primeiro terço, Rafael Man e Carlos Alberto tiveram oportunidades. Em seguida, o Atlético encaixou sua primeira resposta firme, em chute de Pedro Oldoni e defesa esperta do desacreditado Fernando. Impaciente com as más finalizações, Renato sacou o centroavante herói e inseriu Adriano, o Magrão, buscando novos ventos.

A tendência do jogo não se alterou, exceto pelo maior equilíbrio nos volumes de posse da bola: o Fluminense mais voltado para o ataque, o Atlético buscando os golpes mortais. Os ataques não prevaleceram.

Renato, desesperado com o gol sofrido em casa, que conta como desempate em caso de necessidade, e sem a vitória, buscou ofensividade máxima, substituindo Cícero e Fabinho respectivamente por Thiago e Lenny. Nenhum maior efeito.

Os dez minutos finais ficaram por conta de mais dois gols perdidos: o Tricolor, em bom chute de Alex Dias e grande defesa de Guilherme; o Atlético, num chute de Ferreira para o gol vazio, com excelente corte de cabeça de Luiz Alberto.

O fato é que, se o Fluminense fosse durante todo o jogo o mesmo time dos primeiros trinta minutos, dificilmente não venceria. Ainda assim, foi visível o aumento de certa empolgação do time.

Ao final, claramente o Atlético saiu satisfeito. Jogará em casa por um empate em zero a zero ou uma vitória simples. Novamente os de Laranjeiras estão em apuros: vencer o adversário difícil, rancoroso, em seu campo. Esse time já tirou o Bahia na Fonte Nova lotada. Pode repetir o feito. Por que não? Para o Fluminense, o céu não é limite.


Paulo Roberto Andel, 03/05/2007


Mudança de rumos

Depois de meses, finalmente começou a grande final do campeonato carioca – ou fluminense, para os que queiram corrigir. Dois times com momentos distintos na competição. Dois gigantes que, em raríssimas oportunidades, digladiaram-se pelo título estadual, embora tenham quase cinqüenta taças, quando reunidos.

Com o digno público de uma final, o Botafogo disse ao que veio e foi todo ataque, todo velocidade e toque de bola, contra um Flamengo que veio mais fechado, cauteloso. Entretanto, essa mesma cautela não serviu para deter o ímpeto botafoguense: além dos dois gols, o Alvinegro foi absoluto na primeira etapa. Caso tivesse feito quatro ou cinco, ninguém que tivesse visto o match se assustaria, tamanha a superioridade de General Severiano.

A vantagem do Botafogo, contudo, não se cristalizou de primeira mão. Inauguraram o placar apenas depois de meia hora de jogo, quando um cruzamento rasteiro e esperto de Zé Roberto encontrou Dodô livre na pequena área. Ao contrário da tradicional classe nas finalizações, o sete botafoguense não titubeou: com a chance de gol, praticamente deu um carrinho na bola para impedir a chegada do goleiro Bruno. Ressalte-se, porém, que até os carrinhos de Dodô possuem charme, possuem classe. Talvez, ao notar tantos gols perdidos, Dodô viu a necessidade de que aquela bola entrasse – e, como já dito antes, até sujou o calção pelo tento.

O Flamengo, que já vinha impactado pela completa inferioridade técnica em campo, curvou-se. Havia o temor de uma goleada. Os flamengos, apaixonados por todo o estádio, silenciavam. A cinco minutos do fim, então veio o grande golpe numa rápida cobrança de falta, Lúcio Flávio, entrando elegantemente pela intermediária e meio da área rubro-negras, deixou cinco ou seis adversários caídos até deslocar Bruno com um leve toque no canto direito e explodir a massa alvinegra, num verdadeiro golaço.

O primeiro tempo fechou com a superioridade do Botafogo, tanto no placar quanto em termos de atuação. Magnífica. Tivesse alguém que apontar o vencedor ao final, creio que cada nove entre dez fichas seriam em branco e preto. Futebol, porém, é jogo de surpresas, de idas e vindas, mudança de rumos. E os times voltaram muito diferentes para o segundo tempo.

O Botafogo, estranhamente, recuou mais do que tinha feito em jogos anteriores, e talvez mais do que havia feito durante todo o ano. O Flamengo, que tinha sido um indefeso cordeiro, presa fácil para os alvinegros, voltou como um leão ferido, de Biafra, e ganhou a intermediária adversária. O jogo virou, o Flamengo passou a dar as cartas, alguns bons ataques aconteceram.

Tudo mudou de vez aos dezessete minutos do segundo tempo. Numa jogada rápida, Renato entrou livre pela esquerda do ataque; o jovem goleiro Julio César, afoito, trocou o gol real pela chance de defesa de um pênalti, defesa que a ele não caberia: era o último homem e foi justamente expulso. Renato fuzilou o ângulo direito do reserva Max, e a Gávea descontou.

O estádio levantou vôo com o grito da massa rubro-negra, e os botafoguenses é que tomaram lugar de calados, aflitos, ao enfrentarem um adversário recuperado, veloz e atuando com um jogador a menos. O Flamengo é que passou a mandar no jogo e perder gols seguidos. Tudo pelo avesso.

Aos trinta e três, novo golpe rubro-negro, jab de esquerda. Cruzamento de Leo Lima, que tinha acabado de entrar, falha do inseguro Max e soltura de bola nos pés de Souza, que completou para o gol vazio. Decretado o empate em dois tentos.

Em seguida, confusão. Um bate-rebate, falta quase na linha central do campo, Leo Lima e Diguinho, que tinham acabado de entrar, foram devidamente expulsos. O Botafogo, já sem Lúcio Flávio e sem o seu amuleto cão de guarda, esmoreceu. Por outro lado, o Flamengo, que tinha acabado de reforçar seu ataque, para explorar a vantagem de mais um jogador, perdeu opções. Leo Lima, mais uma vez, pareceu predestinado a seguir o autor de uma jogada só: o famoso cruzamento de letra para o gol vascaíno, na final contra o Fluminense, em 2003. E, portanto, perdendo chances de firmar-se de vez no futebol, enquanto o tempo passa.

Três jogadores a menos em campo significaram muito mais espaços; contudo, o cansaço das equipes, particularmente do Flamengo, que tinha um a mais, não contribuiu para novos gols. E o jogo terminou em empate final.

Cada time teve um tempo a seu favor. Pelas circunstâncias finais, meu palpite é de que, se houvesse um vencedor, ele estaria mais próximo de ser o Flamengo. Não foi. Assim são os clássicos.

Domingo, está programada a batalha final. Ambos os times têm compromissos perigosos no meio de semana: o Botafogo encara o Atlético em Minas, pela Copa do Brasil; o Flamengo visita o uruguaio Defensor, pela Libertadores. Depois de quinta, ficam as expectativas para se conhecer o novo campeão do Rio.

Paulo Roberto Andel, 30/04/2007