Friday, October 30, 2009

FLUMINENSE 2 X 1 ATLÉTICO-MG (29/10/2009)

Ainda estamos vivos (30/10/2009)

O Maracanã é um palco que jamais se repete, por mais que eventuais cenas possam ser razoavelmente parecidas. Cada jogo é um jogo, uma história, um momento ímpar. E, ontem, mais uma vez, na vitória avassaladora do nosso querido Tricolor sobre o Atlético Mineiro, pude presenciar isso, testemunhando uma linda cena que jamais se apagará de minha memória. Ao término da partida, com o triunfo em nossas mãos, contrariando todos os idiotas da objetividade, o Maracanã era tomado por uma chuva galáctica. Nossa torcida, abrigada nas cadeiras azuis do estádio, começou a correr para o molhado, procurando se aproximar cada vez mais do nosso time que, humildemente, veio à beira do anel que nos separa do campo, para nos agradecer o apoio. Muitos companheiros nossos choravam, riam, gritavam. Álvaro Doria, como sempre, bradava e arrancava gargalhadas. Tiba mostrava a serenidade de sempre. E tenho certeza de que o nosso Presidente Sussekind, no camarote do alto das arquibancadas, sorria ali. O Fluminense ainda está vivo, o Fluminense não vai morrer. Ricos e pobres, jovens e velhos, em meio ao temporal todos ali saudavam a monumental vitória sobre o time mineiro, postulante ao título de campeão brasileiro deste ano; uma vitória que pode ser capaz de nos alavancar para uma grande seqüência de vitórias que nos permita escapar do descenso. Tudo ainda continua muito difícil, dirão os sóbrios, os céticos e, principalmente os idiotas da objetividade que, em tom professoral, já preveram a queda do Fluminense. O jornalista Kfouri, solidário aos idiotas, vociferou contra nós, dizendo que o Atlético teria mais torcedores no Maracanã do que o Fluminense; raras vezes um comentarista de futebol conseguiu ser tão abençoado pela mediocridade. Éramos dez mil, na chuva e na última colocação do certame. E vencemos. É uma situação ainda dramática, esta que vivemos, mas a maneira como vencemos ontem nos dá esperanças muito sérias de revertermos este quadro. Cada jogo será uma decisão. E o Fluminense é um dos times mais acostumados no mundo ao momento decisivo.

Foi um jogo duro e sofrido, bem de acordo com a nossa sina. O Tricolor nasceu para a obstinação, a luta, o sacrifício. Em nossa centenária sala de troféus, não há taças conquistadas de mão-beijada; tudo veio com esforço heróico, com o estoicismo que nasceu antes dos anos 10 e, mais tarde, foi consagrado por Carlos José Castilho. Precisávamos da vitória a todo custo e começamos no ataque, mas sem muitas conclusões. E era perigoso dar espaço ao time do Atlético; tomar o gol primeiro seria fatal para as nossas pretensões. Fred era muitíssimo marcado assim como Darío Conca. Pela direita, talvez nervoso por enfrentar o ex-clube, Mariano errava jogadas, mas compensava com uma garra extraordinária – tem sido dos jogadores mais aplicados em campo, desde que reconquistou a titularidade. Equi Gonzalez, mostrando muita categoria, liderava a meia-cancha com passes perfeitos. Fred, heróico. Aos poucos, fomos nos aproximando do gol. Diguinho acertou um chute perigoso à direita do experiente goleiro uruguaio Carini, titular de seu país. Numa outra jogada, o zagueiro Jorge Luiz testou em recuo contra seu próprio gol, quase nos favorecendo no marcador. Parecia frágil, era importante forçar o jogo com cima dele. E deu certo. Em meia hora de jogo, eis que Maicon, inconstante como nos últimos jogos, caiu pela esquerda de ataque e fez o cruzamento; Jorge Luiz praticamente socou a bola. O penal foi assinalado. Até neste momento vemos o que é o sofrimento nas Laranjeiras: Fred deu a tradicional paradinha, mas Carini não se mexeu. Foram quase dois segundos até que a bola morresse no canto esquerdo do arqueiro atleticano e nossa vantagem estivesse estabelecida. E posso dizer que o grito de gol dos nossos dez mil torcedores valeu por cinqüenta mil. A boa torcida mineira presente, em dois lances de cadeiras azuis, acusou o golpe e se calou momentaneamente. O Fluminense não é um peso-morto, um balaio de gatos que só existe na cabeça de Kfouri e os idiotas da objetividade que lhe prestigiam. Ainda houve tempo para Gum acertar uma boa cabeçada, mas para fora. Descemos para o vestiário no intervalo sob dois sentimentos: o de temor, por conta das partidas que poderíamos ter vencido recentemente, mas deixamos empatar; o de confiança, pois o time parecia bem, mostra evolução a cada partida e, especialmente ontem, dominara o adversário em boa parte do primeiro tempo.

O temporal inundou Maracanã. Chuva que não parava. E, no primeiro minuto da fase final, no primeiro ataque nosso, todos os que estavam atrás do gol defendido por Carini ou na diagonal, perceberam quando Conca matou a bola e ia chutar no canto direito do uruguaio. O gol já se desenhava dois segundos antes de sua feitura. E não poderia ser menos chorado: a bola bateu nas pernas de Jorge Luiz antes de entrar. Não gritamos o gol: urramos. Urramos com toda fúria e alegria. O Fluminense mostrava que é possível escapar do pior, por mais difícil que as coisas estejam. Os idiotas da objetividade calaram, mas ainda suspiraram quando, logo a seguir, numa infeliz jogada do excelente goleiro Rafael, o Atlético descontou numa cabeçada de Tardelli. Fizemos silêncio: o fastasma do empate nos atordoava. Mas não aconteceu: éramos melhores, continuamos melhores em campo e o Fluminense esteve mil, duas mil vezes mais perto do consagrador terceiro gol do o Atlético do empate. Uma linda troca de passes no meio de campo entra Conca e Fred quase resultou em gol de Mariano. E Fred quase marcou mais duas vezes: uma, em um chutaço que Carini, no chão, nem viu a bola que lhe abalroou e tomou a linha de fundo; outra, numa cabeçada perfeita, de cima para baixo, no canto direito do goleiro, tirada em cima da linha pelo arqueiro.

No final do jogo, o Atlético, já com um a menos, repetiu a tradição contra nós: pressionar-nos quanto temos vantagem numérica em campo. O Fluminense, cansado, recuou; as substituições não fizeram muito efeito: Roni e Tartá, mais uma vez, não disseram porque vieram a campo. Era preciso segurar a vitória com todas as forças. Fred entendeu isso e, muitas vezes, virou um verdadeiro lateral-esquerdo de marcação, até ser trocado por Patrício Urrutia, no minuto final. A pressão alvinegra foi inócua, mesmo com sua única chance derradeira de gol, desperdiçada por Éder Luiz. Foi uma vitória justa, verdadeira e merecida, debaixo do temporal que depois serviu de água-benta para a nossa torcida, junto do time na beira do gramado. O Fluminense venceu. O Fluminense está vivo. O campeonato não acabou para nós.

Hoje é dia do silêncio para os idiotas da objetividade. Quando a chama do Fluminense brilha no meio da escuridão, cento e sete anos de glórias se iluminam. Nós já vencemos campeonatos estando nove pontos atrás do grande líder e campeão da imprensa. Nós já chegamos a uma semifinal de campeonato precisando vencer cinco jogos seguidos – e conseguimos. Tudo ainda é muito difícil, mas só um pascácio hoje diria que não temos chance de reverter os cinco pontos de diferença para nos salvarmos do descenso.

Domingo é uma grande decisão contra o forte Cruzeiro. Temos chances de vencer; e, se vencermos, o descenso tomará ares de página virada.

Assim seja.


Paulo-Roberto Andel, 30/10/2009

Tuesday, October 27, 2009

PARA JUCA KFOURI (27/10/2009)

Caro Juca,

Com prós e contras, entendemos que você seja uma das autoridades jornalísticas esportivas deste país. Até mais, se levarmos em conta a carreira televisiva ou a revista Playboy. Entendemos eu e os milhões de torcedores do Fluminense que existem.

Vale a pena lembrar de tua brilhante atuação nas denúncias contra os escândalos da Loteca. Um momento brilhante, dentre muitos outros. Vale a pena lembrar de teu combate aos desmandos da CBF e o estranho jogo que se desenrola nesta entidade. Brilhante. Vale a pena lembrar de muitos outros momentos oferecidos por você como profissional. Muitos.

Porém, tem um momento em que você, definitivamente, tem escorregado no quiabo – e, infelizmente, não cabe aqui outra expressão menos vulgar. Não é de hoje, não é a quinta, a décima, a qüinquagésima ou centésima vez. Trata-se de quando se refere ao Fluminense. E não vale aqui usar o encardido argumento que diz tratar-se somente de gozação, porque NÃO é. Milhares de pessoas no Brasil te lêem, te ouvem e isso forma opinião.

Que jornalistazinhos vendidos por dez mi-réis a grupos econômicos façam isso, entende-se, embora não se justifique. Mas você? Por favor, coerência e respeito. O Fluminense inventou o futebol brasileiro e, por consequência, o Corinthians. O Fluminense forjou a história da seleção brasileira pentacampeã mundial. Não falamos de Bambala ou Arimatéia. Sem o Fluminense, simplesmente o futebol brasileiro não existiria.

Comprar essa falácia tosca de que o Fluminense já está rebaixado, em tom de desdém e deboche, mesmo com todas as nuances da tabela do atual campeonato em voga? Maior ironia ainda quando vindo de um corinthiano, que já conhece bem o que é a segunda divisão e, mais ainda, a manobra da “virada de mesa”e dos “acertos” (vide a vergonha de 1996, com os resultados combinados pelos Senhores Dualibi e Petraglia, como também a incrível Taça de Prata de 1982 – competição que permitia a um time da segunda divisão jogar as semifinais da primeira, em fato mundialmente inédito... afora 2005, claro). Até aqui, apenas momentos que não condizem com o que se espera da trajetória do Juca. O Fluminense faz uma péssima campanha, está serissimamente ameaçado pelo descenso, tem uma diretoria esdrúxula – e nós, Tricolores de truz, como diria nosso brilhante companheiro Marcos Caetano, sabemos disso. Agora, quem conhece o futebol brasileiro deveria esperar para as previsões, em se tratando de Fluminense: nossa história, para grandes títulos e também em fugas de descensos, é rica quando se trata da virada quando ninguém mais espera – não a virada de mesa, tão associada covardemente ao Fluminense, mas também tão usada por grande parte dos chamados maiores times do Brasil, em condições particulares. Esqueceram de 2003, 2006 e 2008? Nós já estávamos “rebaixados” de acordo com a imprensa, e deu no que deu.

Agora, o que é inaceitável, bizarro e parece vindo de um amador das arquibancadas, não um profissional da imprensa do futebol, com renome e garbo, é sugerir que a torcida do Fluminense vai ser menor do que a do Atlético Mineiro no jogo da próxima quinta-feira. Basta dizer que na rodada do dia 18 de outubro, colocamos 30.000 pessoas contra o Internacional, maior público da série A do campeonato brasileiro naquele dia. E isso porque o Fluminense é o último colocado. Cheguei até a duvidar que logo você tivesse assinado uma tolice dessas.

Caro Juca, você chegou a dizer que a torcida do Fluminense fez a festa mais bonita que você presenciou em sua vida nos gramados, na final da Copa Libertadores de 2008. Não se deixe trair por falácias ou bairrismos rasos, ultrapassados. Como leitores, gostaríamos que você respeitasse o Fluminense, a história do Fluminense, a grandeza do Fluminense. Graças ao Fluminense, você pôde ter uma brilhante carreira no jornalismo esportivo brasileiro: sem ele, não haveria a popularidade do futebol, e você dependeria do basquete, há muito depauperado em nossa terra. Sinceramente, ironizar o tamanho da torcida do Fluminense nos estádios é dar um tiro no próprio pé, suicidando teu crédito jornalístico.

Se tiver de cair, o Fluminense cairá de pé e voltará como o gigante que sempre foi, é e será, queira ou não a “imprensa especializada”. Mas isso ainda depende da tabela de classificação, não das Mães Dinahs do futebol, sempre ávidas por “acertar previsões” que nunca se concretizam. Não é uma ciência exata e muitas águas ainda podem rolar; até mesmo matemáticos de plantão mostram-se cautelosos, porque sabem que esse jogo pode virar, por mais difícil que seja.

Leio você desde 1980. Na sua fortuna pessoal, lá está o meu dinheirinho como mísero contribuinte do montante. Não mereço deboche nem descaso. Nem eu, nem os milhões de Tricolores em todo o Brasil e o mundo.

O Fluminense não estar na primeira divisão, assim como o Vasco não esteve – lamentavelmente – este ano, bem como outros grandes times brasileiros em outras circunstâncias, é uma derrota para o maior de nossos esportes.

Fazer pouco caso do Fluminense rebaixa você para a segunda divisão do jornalismo esportivo brasileiro, coisa que nunca poderíamos esperar ou querer.

Por favor, não caia. Não seja rebaixado; ou melhor, não se rebaixe.

Olhe para o passado e não o negue.

Reflita.

Obrigado pela atenção.

“Se quiseres antever o futuro do Fluminense, olhai para o seu passado”
(Nelson Rodrigues)


Paulo-Roberto Andel

Friday, October 23, 2009

FLUMINENSE 2 X 2 UNIVERSIDAD DE CHILE


De mãos beijadas (23/10/2009)

Meus amigos, definitivamente a sorte não está do lado do Fluminense. Claro que soaria como verdadeira patetice creditar a nossa atual situação aos desígnios da sorte; mais ainda, seria ridículo. Entretanto, por mais competência que tivéssemos hoje, seria muito difícil estar em outro patamar que não este sem a fundamental sorte. E o empate de ontem com o Universidad do Chile em dois a dois nos colocou em situação dramática para tentar chegar às semifinais da Copa Sulamericana.

Por mais que os meios de imprensa nos boicotem, por mais que nossa situação matemática na tabela seja de derrota fragorosa, os que veem futebol com sobriedade podem atestar que, aos poucos, o Fluminense de Cuca apresenta progressos – basta citar os últimos cinco ou seis jogos da equipe. Domingo, jogávamos uma boa partida após o empate em um gol contra o Inter; então, eles marcaram o segundo tento e nos descontrolamos completamente, quando poderíamos ter ido bem mais longe apenas com um pouco de calma. Curiosamente, nosso gol de empate contra os gaúchos veio de uma jogada bastante serena e produtiva de Gum, driblando como um atacante portentoso e fuzilando o gol dos colorados – o mesmo Gum que falhara nos dois gols que havíamos sofrido. Ontem, ainda foi pior: no começo do segundo tempo, Fred sacudiu as redes dos chilenos e fizemos dois a zero. O jogo era nosso. E, num verdadeiro caos, em menos de dez minutos tomamos dois gols que beiram à infância, os chilenos empataram e a desgraça se consolidou. Chegou-se ao cúmulo de se “trabalhar” o nome do Sr. Joel Santana, figura non grata em Álvaro Chaves, para substituir Cuca. Sinceramente, na falta de opções, é menos pior ser rebaixado com Cuca no comando. Aliás, houvesse entre os dirigentes do Fluminense um mínimo de dignidade e respeito ao clube, o nome daquele senhor nunca mais seria cogitado para integrar nosso corpo de profissionais. Para os que desconhecem os fatos ou se esqueceram, recordo apenas dois: o primeiro, relativo aos nebulosos dias de quinta e domingo entras as partidas da nossa semifinal do campeonato brasileiro de 1995, contra o Santos, onde valeu TUDO em termos de ausência ética por parte do então futuro treinador da Gávea em 1996; o segundo, quando o Sr. Santana, em partida decisiva no campeonato brasileiro de 1996, resolveu escalar o time de reservas da Gávea contra o Bahia, onde perdeu por dois a um e contribuiu decisivamente – e, mais uma vez, de forma desprovida de ética – para o descenso do Fluminense naquele ano. Perguntado a respeito do excêntrico ato, limitou-se a dizer “Não tenho nada com isso; é problema deles”.

Fizemos um ótimo primeiro tempo, ainda mais se levarmos em conta que perdemos uma de nossas forças, que é o garoto Alan, nos primeiros minutos da partida. Adeílson, com seus arranques duvidosos e a já conhecida dificuldade no trato com a pelota, veio a campo. Não produziu, mas também não comprometeu. Fred mostrou a habitual categoria de sempre, e nos colocou em vantagem logo aos quinze minutos, em jogada em que a bola pouco passou da linhas, mas tranqüilamente confirmada pela arbitragem; além disso, obrigava os chilenos a cercarem-no com dois ou três jogadores, abrindo espaço para os avanços de Conca. E, para surpresa de eventuais Tricolores desatentos, o melhor jogador em campo no primeiro tempo foi Diguinho, que fez até então sua melhor partida pelo Fluminense: desarmava sem faltas, coordenava ataques e chegava até para chutar a gol. Outro jogador com boa trajetória e muita velocidade foi Mariano que, apesar das deficiências já conhecidas, superava tudo com muita raça e criava várias jogadas pela direita. Quem realmente não acertava, apesar da velocidade, era Maicon: parecia bastante abatido após a perda do título mundial de juniores, semana passada. A defesa estava tranqüila (com exceção do sempre fraco João Paulo), o meio-campo parecia seguro e tudo indicava que prevaleceríamos sobre um tímido Universidad, que em nada nos ameaçava e até parecia tranqüilo com a derrota mínima. De toda forma, o primeiro tempo terminou com o placar mínimo a nosso favor e, mais uma vez, ele poderia ter sido mais elástico se não tivéssemos gasto tanto tempo mais recuados após a vantagem inicial. Ainda assim, foi o suficiente para o time descer ao vestiário saudado e aplaudido. Podia ainda melhorar, contudo.

Mal deu tempo de pensar. Veio o segundo tempo e o grande matador não vacila duas vezes: Fred errou numa conclusão, mas a bola ficou de frente para ele e o goleiro chileno foi bombardeado. Dois a zero. Festa dos nossos oito mil companheiros. Em uma situação normal, seria o suficiente para liquidar o jogo; jogar com inteligência, marcar bem, atrair o Universidad para nosso campo e criar contra-ataques que pudessem até mesmo gerar uma goleada a nosso favor. Mas não foi assim.

Um branco abateu sobre a equipe e, três minutos depois, aconteceu o que congela o Fluminense: um gol adversário, mesmo que estejamos em vantagem. Montillo, tão livre que para os distraídos parecia até impedido, entrou na área pela esquerda do ataque e fuzilou Rafael sem piedade. O silêncio no Maracanã era mau agouro notório. Porém, com a atuação que tivemos até ali, seria possível buscar o terceiro com naturalidade. Seria, pois somos órfãos da sorte. Minutos depois, uma inacreditável jogada bisonha do nosso melhor homem em campo, Diguinho, perdendo uma bola infantil dentro da área para Vyllalobos, que tinha acabado de substituir o algoz Montillo. O lance sobrou para Olivera, com o gol escancarado, e aconteceu o empate. A partir de então, o Fluminense de tornou um time em frangalhos; entregou de mão beijada uma vitória até fácil. Dominou amplamente o primeiro tempo e merecia uma vantagem até maior do que dois gols. De repente, tudo ruiu por terra. Difícil entender como uma partida tão boa se torna um punhado de cinzas; somente a instabilidade emocional da equipe, em função da pavorosa situação no campeonato brasileiro, pode justificar isso. E, quando mais precisamos, a sorte nos abandona: lances que, para outros times, seriam gols certos, para nós têm morrido nas pontas das luvas dos goleiros, no ferro das traves, no roçar de um cocoruto.

Ainda houve tempo para um chutaço de Marquinho, que tinha entrado no lugar de João Paulo, batendo no travessão. Ainda houve tempo para um outro chutaço, lindo, de Fred, num voleio que o goleiro Miguel Pinto sequer viu – a bola bateu nele e foi para escanteio. Conca já estava muito cansado, assim como Fred. E o retrato real veio quando demos a última cartada, com a entrada de Roni em lugar do nulo Adeílson; em certo momento, num cruzamento, Roni tentou matar a bola no peito quase fora da área, mas o efeito “pombo” fez com que a pelota simplesmente chegasse às mãos de Miguel. Alguns achavam, quase romanticamente, que o veterano centroavante pouco afeito às boas finalizações tinha tentado fazer um gol de peito. Meus amigos Raul Sussekind, Leonardo Prazeres e Álvaro Doria, de frente para o lance nas cadeiras azuis, vaticinaram sem perdão: a tentativa, torpe, na realidade foi a de matar a bola no peito. Era o golpe final. E o empate teve um sabor amargo de derrota. Contudo, nunca é demais lembrar: numa jornada de melhor sorte e equivalente aplicação em campo, não será nenhuma surpresa derrotar o Universidad em casa. É muito difícil, mas há dois anos, revertemos quatro vantagens de mandos de campo consecutivas e vencemos a Copa do Brasil, na única vez em que um time conseguiu isso nesta competição. E vale o exemplo.

Que a reticente boa sorte nos sorria domingo, no Serra Dourada. Precisamos muito.

Somente ela pode nos redimir.


Paulo-Roberto Andel, 23/10/2009

Friday, October 16, 2009

SANTO ANDRÉ 1 X 2 FLUMINENSE (10/10/2009)



Fred venceu (13/10/2009)

Meus caros amigos das Laranjeiras, esta crônica demorou um pouco mais do que o habitual por conta do fracionamento de jogos no campeonato brasileiro. Por conta da partida da seleção brasileira pelas eliminatórias da Copa do Mundo, contra a Bolívia, parte dos jogos ocorreu no sábado e parte ontem. Assim, poderíamos ver melhor o que nos espera. Não foi bom para nós que o Náutico vencesse o líder Palmeiras de forma estrondosa, ou o Sport ter conseguido o empate no Serra Dourada contra o Goiás. De toda forma, dentro da missão muito difícil – mas não impossível – de escapar do rebaixamento neste ano, o Fluminense cumpriu de forma brilhante seu jogo contra o Santo André. Não foi brilhante porque jogou um futebol de altíssimo nível todo o tempo, mas porque soube aliar eficiência e raça, dois pontos fundamentais no atual momento que passamos. E, para aqueles que dizem ser impossível uma seqüência de vitórias, eu lembro que nas partidas mais recentes, conseguimos uma vitória de virada contra o bom time do Avaí – o mesmo que empatou ontem em dois contra o Botafogo, num Engenhão abarrotado pelos alvinegros -, uma goleada contra o peruano Alianza, um empate contra o Corinthians e a vitória deste sábado, a primeira fora de casa pelo campeonato brasileiro. A derrota para o Flamengo foi um resultado normal. Por mais que a situação seja drástica em termos matemáticos, nossa campanha recente é de time de briga. E, se tudo correr bem, passamos a contar com um reforço especial de alto nível: Fred.

A semana passada foi marcada por suspeitas de que o artilheiro mineiro, jogador do porte de seleção brasileira, estivesse de “corpo mole” tendo em vista sua dificuldade em retornar aos gramados, após contusão seríssima. Mais ainda: teria sido visto em aulas de surfe, colocando o Fluminense em segundo plano. Seja lá o que tenha acontecido, uma coisa é clara: Fred, em campo, acertando ou não, é dotado de disposição e raça absolutas. Jamais vestiu a camisa Tricolor para jogar de forma apática, desinteressado. E mostrou isso mais uma vez, contra o Santo André. Contra tudo o que se esperava, Fred entrou em campo, jogou praticamente a partida inteira e fez a diferença.

Quando o jogo começou, cedo se via que era um outro Fluminense em campo, bem diferente do que os números da última colocação no campeonato apresentam: um time vibrante, veloz, com forte marcação e boa saída para o ataque. Na defesa, o esquema com três zagueiros funcionou muito bem. Ainda assim, enfrentar um jogador do talento de Marcelinho, mesmo veterano, é sempre complicado; o craque chutou e cruzou várias vezes para o gol de Rafael que, de forma eficiente, nos tranqüilizou com defesas seguríssimas e uma, fantástica, ao evitar gol feito no canto esquerdo. Por mais que precisássemos desesperadamente da vitória, era possível ver que as coisas caminhavam bem; havia uma postura correta em campo de nossa parte. Ali não era um reles time de lanterna e rebaixado.

Nos primeiros vinte minutos, já tínhamos dado alguns tímidos sinais de ameaça ao goleiro Neneca. Foi o tempo que bastou. O jovem Alan, o melhor chutador dos garotos recém-formados nas divisões de base, tomou uma bola na intermediária dos paulistas, limpou e chutou, como costuma fazer. Um golaço. Um grande golaço, com bola no ângulo esquerdo, indefensável. E o golaço redime: um time que o marca pode tomar as rédeas de uma partida e até mesmo inverter uma situação francamente desfavorável. Era o gol que o Fluminense precisava para marcar posição na partida e, finalmente, tentar a primeira vitória fora de casa na competição. O golaço redime, e foi o que sucedeu: o Fluminense passou a dar as cartas na partida. Nossa principal preocupação era a de não sofrer o empate, fato que tem se repetido muitas vezes na competição e que, por conta disso, tem feito com que nos encolhamos absurdamente. Dessa vez, tinha de ser diferente. E foi: numa jogada velocíssima de Dieguinho pela esquerda do ataque, aconteceu um pênalti a nosso favor, cometido pelo também veterano Gustavo Nery, ressentido com nossa casa. Fred deu a paradinha, colocou no canto esquerdo e, pela primeira vez em meses, o Fluminense desceu realmente tranqüilo para o vestiário num intervalo. O golaço de Alan, a segurança de Rafael e Digão, a fúria ofensiva de Dieguinho, a experiência e o talento de Fred não deixam mentir: era outro Fluminense.

No segundo tempo, cometemos o engano tradicional do recuo excessivo, quando poderíamos muito bem ter ganhado espaço à frente para o definitivo gol da vitória. Isso deu força ao Santo André que, também desesperado, veio para a frente em busca da reação. O talento de Marcelinho imperava em campo, obrigando Rafael a intervenções sucessivas. Recuamos demais, além da conta e eles marcaram um gol de cabeça aos quinze minutos do segundo tempo, com o jogador Camilo. Imaginem se estivéssemos apenas com um gol no placar: seria o terror. Contudo, a vantagem ainda era nossa e, na meia hora seguinte, coadjuvado por boas atuações de vários jogadores nossos, Fred mostrou a que veio, embora ainda longe da forma ideal. Pedia a bola para si, cavava faltas a todo instante, valorizava a posse de bola no ataque – algo que o Fluminense tinha muita dificuldade em fazer nas vitórias que deixou escapar recentemente. Dessa forma, tomamos o gol, mas não perdemos as rédeas da partida. O Santo André, cansado, tendo em vista a alta média de idade de seu elenco, fraquejou, enquanto mantivemos a pegada até o fim do jogo. Pouco antes disso, Fred deixou o campo em boa condição, para a entrada de Adeílson. Antes, Marquinho tinha entrado no lugar de Alan, para melhorar o poder de marcação.

E o Fluminense venceu. Fora de casa. E Fred venceu. Mostrou que está de volta, com muita vontade e sendo capaz de decidir a nosso favor.

Na verdade, a situação ainda é muitíssimo grave. Entretanto, a atuação do time numa difícil partida o credencia a buscar novas vitórias. Dentro das expectativas atuais do futebol brasileiro, fizemos um bom jogo. Conquistamos mais três pontos fundamentais.

Ainda é muito cedo, mas desconfio que, se conseguirmos fazer três partidas do mesmo nível seguidamente nas próximas rodadas, com três vitórias simples, o cenário muda de figura: faltariam seis jogos e o Fluminense precisaria de onze pontos. Seria muito; porém, haveria a nossa ascensão. E quando ascendemos, o que cabe aos adversários é sair da frente, mesmo que esteja em jogo uma virada muito difícil como a de agora.

Muito difícil. Muitíssimo. Mas não impossível.

Não podemos mais falhar.

E, de forma muito tênue, se pode enxergar uma melhora. Com mais esta semana de treinos, vem à frente o poderoso Internacional, que empatou com o mediano Atlético Paranaense ontem.

Jogando como sábado, com raça e aplicação, não é impossível vencermos.


Paulo-Roberto Andel, 13/10/2009

Friday, October 09, 2009

FLUMINENSE 1 X 1 CORINTHIANS (07/10/2009)



Extrema-unção (08/10/2009)


Talvez seja a hora de reconhecer a derrota aviltante neste ano. Na verdade, uma derrota que começou muito antes, lá atrás, no ano passado, quando a América escapou por entre nossos dedos. Um ano e quatro meses. Desde então, em instâncias diferentes, restou-nos agonia. E, ontem, por força do empate contra o Corinthians, a única coisa que pode salvar a salvação do Fluminense, traduzida na manutenção do time na primeira divisão do futebol brasileiro, é a nossa história. Sim, nela, escrevemos inúmeros capítulos a sangue-frio de histórias fantásticas, histórias com desfecho inesperado a nosso favor a segundos ou minutos do fim de uma grande decisão ou um grande título. Não foram poucas as vezes que grandes torcidas adversárias comemoravam nossa derrota e revertemos o quadro de maneira estupenda. Agora, porém, não se trata de um título, mas sim o tentar escapar de uma grande derrota, que já nos afligiu no passado, ainda que por formatos estranhos.

Com o mau resultado no Fla-Flu de domingo, o Fluminense não poderia mesmo contar com parte de sua enorme torcida, que já abandonou o time. Então, houve quase dez mil pessoas no Maracanã – boa parte delas, da torcida corinthiana. Do nosso lado, a velha equipe que não falha, sol e chuva, alegria ou luto. Horas antes, desapareceu a chance de voltarmos a ver Fred no ataque Tricolor, o que seria garantia de reação – o craque ainda sentiu a indisposição causada ainda pela terrível contusão que teve, e não conseguiu estar pronto para a peleja.

Parecia que, dessa vez, as coisas funcionariam. Mal começou o jogo e marcamos um gol, em jogada de raça e perspicácia do menino Alan, já recuperado do acidente de domingo, quando teve um violento choque de cabeça e saiu do estádio direto para exames hospitalares. Um a zero e um Fluminense inflamado foram o panorama dos primeiros vinte minutos da partida: um time solto, pressionando, com vocação para o ataque e muito, muito próximo de aumentar a vantagem no marcador, principalmente na linda cobrança de falta de Darío Conca, acertando o poste esquerdo do goleiro alvinegro Felipe.

Ledo engano.

Na primeira jogada clara de ataque do Corinthians, pela direita, Mariano e Gum praticamente bateram cabeça e o atacante Dentinho tocou de cabeça indefensavelmente para Rafael. E aconteceu o mesmo desastre de jornadas anteriores: o time do Fluminense teve um apagão que simplesmente durou até o fim da partida. Nem foi o caso de dizer que foi uma atuação péssima, nem o caso de falta de raça. O problema é se deparar com toda a situação de hoje, com a proximidade do fim, com um panorama onde nada dá certo, de modo que, se resolvesse terminar a crônica por aqui, eu pouco ou nada teria a acrescentar ao jogo, exceto pelo fim da partida, quando Roni perdeu mais um de seus gols chutando para muito acima do travessão uma boa chance de gol. Não quero aqui acusar o veterano atacante, pois não tem culpa de ter voltado a envergar nossa camisa. Trata-se de um bom sujeito, trabalhador, como outros de nossa casa. O que não podemos é nos iludir: trata-se de um jogador bastante limitado; logo, quando surge um momento crucial, não é com ele que podemos contar com absoluta certeza. E não é de hoje. Roni finaliza mal desde sua aparição, há dez anos, mas também não é o culpado exclusivo, claro. A crise do Fluminense hoje é grande demais para se limitar a uma só pessoa.

Volto ao gol de empate. Ele não teve a fúria do primeiro gol de Adriano, domingo passado, mas parecia uma punhalada do mesmo jeito. Nossa turma se deixou esmaecer pelo silêncio sepulcral, exceto os jovens das organizadas – eles não desistem nunca. E o mal-estar tomou conta do Mário Filho como há muito não se via em nossos assentos. A impressão que me dá que quando levamos um gol, o mundo explode numa hecatombe. A parte psicológica está muito afetada por conta da ultima colocação, de modo que um simples tapa se torna um nocaute. E então, mais sessenta minutos de futebol onde deixamos de ser um time aguerrido em busca do gol para, lentamente, nos apequenarmos. A lentidão e o torpor nos tomam de assalto a ponto de qualquer troca de três passes oferecer sério risco contra nós. Por outro lado, falar da péssima fase de muitos jogadores chegaria a ser redundante: alguns não acertam um passe há meses. E o resultado aí está. Os ótimos resultados contra o Avaí, na emocionante virada, mais a boa goleada sobre o peruano Alianza não foram suficientes para nos fazer deslanchar uma boa fase e, mesmo que com muita dificuldade, tentar escapar do descenso. Como explicar?

Por mais que tudo pareça perdido, não se pode desistir. Por mais que estejamos nos últimos grãos de areia da ampulheta, não se pode desistir. A nove pontos de disputar a saída da zona de rebaixamento, faltando dez jogos, em tese a salvação do Fluminense é praticamente impossível. E, se eu não conhecesse o Fluminense e sua história, não apostaria nele nem meia-pataca. Evidentemente que se tratava de outro tempo, mas recordo que, em 1991, tínhamos talvez uns três por cento de chances de chegar às semifinais do campeonato brasileiro: para a façanha, seria preciso vencer os cinco últimos jogos da competição em sua fase classificatória. E conseguimos. Não valeu de muito, pois todos se lembram da derrota para o Bragantino, nas semifinais, com o gol de Franklin, nossa cria, a minutos do fim do jogo – éramos setenta e cinco mil pessoas no Mário Filho. Mas a façanha de se classificar jamais será esquecida pelos mais atentos. E lembrar disso é uma espécie de anestésico para a situação atual.

Está praticamente perdido. É quase impossível. Mas não é totalmente. Trata-se do Fluminense e, com tudo o que aí está em cento e sete anos, o que eu diria para os mais jovens no futuro se o time vencesse oito jogos e não caísse de divisão? Simples: seria apenas mais um fato fantástico da nossa grande história, onde ninguém acreditava em nós, nem nossa outrora apaixonada massa de torcedores, mas superamos muito. Para alguns, ou muitos, logicamente é um devaneio e beira à loucura; compreendo. É quase impossível de acontecer no panorama de hoje, mas, se acontecer, eu não terei duvidado. É um momento de extrema-unção; contudo, sem saber de onde, eu ainda tenho alguma esperança e busco algum sentido.


Paulo-Roberto Andel, 08/10/2009

Tuesday, October 06, 2009

FLAMENGO 2 X 0 FLUMINENSE (04/10/2009)



À beira do fim (05/10/2009)


Quando o primeiro tempo do Fla-Flu de ontem se encerrou, o Maracanã ofereceu uma reação de absoluta surpresa. Ao contrário do que se poderia supor, tendo em vista a posição dos times na tabela, quem deu as cartas na partida foi o time do Fluminense. Mesmo limitado tecnicamente, mesmo com a última posição da tabela nas mãos, mesmo com os desfavoráveis resultados dos outros times contra quem lutamos na zona do rebaixamento, tudo era pequeno diante da atuação na primeira etapa – até mesmo a incrível ausência de nossa torcida, que comentarei mais tarde, foi reduzida pela boa atuação até ali. Nós, os poucos Tricolores presentes ao estádio, tínhamos algum alívio e certo alento: o jovem zagueiro Digão era um dos melhores em campo, anulando o ataque da Gávea; Dieguinho realizava ótima partida; Conca buscava espaços e Alan perdeu um gol incrível, dos que não costuma. Em nossa meta, Rafael muito bem. Então, o Fluminense era um time que vinha de uma grande e suada vitória sobre o bom time catarinense do Avaí, e também o time que atropelou o peruano Alianza Atlético na quinta-feira. Tudo indicava que, depois de meses de enorme sofrimento, era o momento de nossa ascensão. Ledo engano. Duas enormes desatenções com falhas individuais selaram a nossa sorte e, muito provavelmente, a nossa ausência na primeira divisão do ano que vem.

Logo que cheguei ao Maracanã, havia um enorme público, com a natural predominância da Gávea, mas os nossos pareciam estar em bom número, a julgar pelo movimento na rampa do Metrô – se preferirem, a da minha amada UERJ. Foi um engodo. Quando subi as rampas com minha amiga Marô, veio-me uma sensação de choque: o Fluminense, mesmo depois de duas vitórias com um futebol razoável, foi completamente abandonado pelo grosso de sua torcida. Mal conseguia ocupar metade dos assentos da área verde, enquanto que a amarela era um absoluto deserto. Do outro lado, os flamengos se apinhavam em cachos, lotes e dúzias como se ali fosse a maior decisão de todos os tempos. E, por mais que eles tenham merecido a vitória em campo, principalmente pelo segundo tempo, não tenho dúvidas de que o Fla-Flu se decidiu nas arquibancadas. Não que o nosso time não fosse valente; contudo, quando Adriano fez o primeiro gol, após duas falhas sucessivas de Fabinho, chutando no meio do gol de Rafael, a Gávea explodiu de tal forma que, ali, o jogo se decidiu. Ressalto que nossos presentes - com especial saudação para os rapazes das torcidas organizadas que, diferentemente de todo o caos que reina hoje nas Laranjeiras, uniram-se pela nossa verdadeira causa comum, que é o Fluminense – foram heróicos: gritaram e incentivaram o time o tempo todo. Nós, que estamos no concreto das arquibancadas, iremos até o fim. Uma pena que a grande maioria de nossa torcida não tenha entendido isso e, por conta do que aconteceu, ela acabou sendo rebaixada antes mesmo do Fluminense encerrar suas possibilidades matemáticas no atual campeonato. Melhor dizendo, se rebaixou voluntariamente. Entendo o problema dos cambistas, infelizmente alimentado pelos clubes. Entendo os tempos de hoje, com os temores da violência. Entendo a má campanha, a péssima trajetória do Fluminense no campeonato. Mas seria certo, justamente num momento crucial e num jogo contra o nosso maior rival, a nossa torcida simplesmente dar de ombros para o time que se agarra à beira do abismo com as pontas dos dedos?

Jamais um Fla-Flu será fácil. Jamais será uma canja de galinha. A Gávea sabe disso, tanto que apupou seu time na descida para o intervalo. E todos sabíamos que, se o jogo continuasse daquele jeito, o risco da vitória Tricolor seria enorme. Mas as coisas mudam num estalo dentro deste jogo mágico e secular.

Amparado por sua imensa torcida, o Flamengo voltou para o segundo tempo buscando o ataque e a vitória. De cara, Rafael fez uma defesa sensacional, mais difícil do que um pênalti, num chutaço de Adriano. Em seguida, Fabinho, jogador esforçado de muita raça, mas de horizontes técnicos quase desérticos, falhou duas vezes no mesmo lance: perdeu a bola na intermediária, em seguida, permitiu a finalização de Adriano. O gol estava marcado e a nossa derrota, assegurada. A quem me perguntar por que acho isso, me parece muito simples: não bastasse a enorme pressão psicológica que é jogar no Fluminense de hoje, imaginem o sujeito pegar a bola para dar a saída, olhar para a frente e não ver sua torcida, com exceção de bolinhos honrosos, vibrantes, mas numericamente esdrúxulos se levarmos em conta o que é o Fluminense na história do futebol brasileiro. E mundial. Ali, com todos os nossos pulmões prestes a explodir, éramos uma meia-pataca, uma meia-bomba perto da enorme massa deles, que nos sufocava como num sopro. Fôssemos mais numerosos, gritaríamos tudo e eles se lembrariam de Benedito de Assis, do gol centenário de Portaluppi, do Fla-Flu da Lagoa em 1941 e o velho trauma seria um grande bônus a nosso favor. O fato é que, do gol em diante, o Flamengo foi absolutamente superior e venceu com tranqüilidade, orquestrado por sua arquibancada. Não havia espaço para mais nada. Fizeram outro gol com enorme facilidade e só não golearam porque os deuses da justiça se lembraram do primeiro tempo estóico que cumprimos.

Um time sem torcida é um time sem alma. É um cadáver insepulto. Ontem, o Fluminense infelizmente deu um passo para trás em nossa história. Estou certo de que, após o gol de Adriano, se tivéssemos nossa verdadeira massa de torcedores, haveria chance de se reverter a história deste Fla-Flu. Jogamos um bom futebol no primeiro tempo e o barulho do nosso lado da arquibancada faria equilibrar o jogo. Nenhum time vive somente da audiência de seus aficcionados pela televisão, rádio ou computador. Um time de futebol é um reino, e precisa ter o povo ao seu lado, ainda mais nos momentos de crise e dificuldade. Quando o time vence e está em disputa de títulos, todos os sazonais comparecem em massa. Cambistas, preços, horário: nada atrapalha. O problema é só na má fase?

De forma alguma, a situação atual do Fluminense é exclusivamente por culpa de sua enorme, linda e apaixonada torcida, ainda que ausente e alheia à gravidade deste momento. O que penso é que vivemos uma situação de enfermidade absoluta, de UTI, e não se pode esperar: era a hora de apoiar e, depois, conforme necessário, fazer as mudanças devidas. Nós somos o time dos grandes títulos no último segundo, quando ninguém mais espera, exceto a nossa irmandade e, justamente agora, ela é a primeira a desistir? Ontem era a hora da união e não do descaso.

Quarta-feira, talvez seja a última cartada, contra o Corinthians, num Maracanã completamente vazio. A última jogada de dados. O último jogo na mesa.

Seja para testemunhar o óbito, seja para testemunhar uma virada quase impossível, mas que faz parte da nossa tradição histórica, eu estarei lá.

Mesmo com frio, vento e chuva, mesmo com o silêncio que lambe o chão cinza, eu estarei lá.

Está tudo quase perdido, mas ainda resta um fio de esperança – e isso remete a Telê Santana, remete a um bom sentimento.


Paulo-Roberto Andel, 05/10/2009