Thursday, June 08, 2006

A Copa e o Maracanã

Hoje em dia, tudo corre com espantosa velocidade. Daí que os tempos e as gentes sofrem constantes translações. Com o futebol, também é assim.

Mais uma Copa do Mundo se aproxima. O Brasil fica estático, parado, hipnotizado pelas televisões e ondas de rádios. Tudo fica pequeno diante da suposta magnitude do evento, onde os melhores jogadores do mundo podem ou não desfilar seus melhores repertórios. Nelson, vivo fosse, enalteceria a “pátria de chuteiras” incessantemente.

E eu me sinto um completo estrangeiro neste assunto.

O futebol é meu oxigênio. Parreira, o treinador, um dos símbolos do clube que ostento na parte de dentro do peito. A Copa, o espetáculo maior. Evidentemente, gostarei da vitória, do sexto título mundial caso venha. É um momento de folga para um país tão sofrido e tão injusto para com seu povo.

Agora, quarenta dias sem Maracanã? Sem o Tricolor? A estrela, a cruz, o grande aliado?

Minha grande emoção em Copa do Mundo foi em 1986, tristeza não teve fim. Em 1982, o país chorou e eu fui com a petizada jogar bola na Lagoa. O time era tão bom que eu, ingenuamente pensei que ganharia facilmente quatro anos depois. Ledo engano. Nós, garotos, nunca temos a noção exata do nunca mais. Aquela confusão toda, os pênaltis, eu olhei para a tela e só então me veio o pensamento de quatro anos antes. Fui enganado por mim mesmo; achei que teria jeito e não teve, passou em branco para sempre. Foi a única vez que chorei por causa da nazionale. Dali em diante, resolvi que minha vida de bola focou-se para o Tricolor e seus aliados (não adversários, já que fazem parte do match). Esfriei. Encarei com naturalidade a derrota para Caniggia e Maradona; só não gargalhei porque, a meu lado, o velho Xuru rosnava sem fim. Na Copa da França, senti-me incomodado por aquele clima de certeza que os franceses tiveram na final; assisti a tudo com tranqüilidade, não me abalei.

A vitória de 2002 também não me falou ao coração. Achava o treinador um digno de pena que deu certo, foi bom pelo Ronaldo, ótimo rapaz. Não sei dizer o que acontece comigo ao certo: talvez porque os jogadores da seleção estejam longe do combalido futebol carioca; talvez em função de que esse negócio de seleção ficou muito além dos conceitos de popstar.

Em 1994, eu não tinha televisão em casa, e fui um dos únicos brasileiros a não assistir a peleja contra a Azzurra de Roberto Baggio. Pode?

É bom e desejável que a amarelinha borde sua sexta estrela. Torcerei, como milhões.

Agora, que não troco um bom clássico de Maracanã por nenhuma Copa do Mundo, é mais do que fato.

Clube é diferente de seleção. A seleção é uma circunstância, um momento. Bonito? Empolgante? Sim. Momento, de qualquer forma.

Quando, desgraçadamente, a seleção é eliminada, fica um clima de velório no Brazyl por uns dois ou três dias, o treinador é amaldiçoado, algum jogador é crucificado e, com pouca ampulheta, volta-se tudo ao normal. Seleção de novo? Só uns seis meses depois. O clube não, ele está em nossas vidas o tempo todo, todo instante. Você vai ao bar, tem o sujeito do outro time, ou você gritam ou se confraternizam. É quarta e domingo, é sábado de carnaval e até quase o Natal. Traduzindo e abusando do comportamento dos jovens, a seleção é uma “ficada”; clube é amor eterno, de casamento e vida feliz até mesmo nas derrotas.

Mais: quando a seleção vence, quem é que você buzina sacaneando na rua? Não tem o vizinho chato, o porteiro vibrante ou o padeiro quase sempre cruzmaltino. É todo mundo do mesmo lado. Vira unanimidade, celeiro de burrice definido pelo próprio e brilhante Nelson. Além do mais, somos fanáticos por futebol, mas nem um pouco nacionalistas – o espasmo do grito de gol não nos credencia suficientemente para tal comportamento.

Como última bala perdida, meu melhor estádio de futebol é o palco da pior derrota da seleção em todos os tempos.

De toda forma, boa sorte aos canarinhos, que não voem como os do tempo de Júnior.

Agora, para ver o fogo pegar circo, tem que ser futebol em Maracanã, com duas metades de cores e gritos diferentes. É disso que precisamos, é isso que a gente ama. A amarela é só um reflexo tênue desse amor.


Paulo Roberto Andel - 07/06/06







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