Thursday, November 05, 2009

CRUZEIRO 2 X 3 FLUMINENSE (01/11/2009)


Monumental! (02/11/2009)

Sete e meia da noite de ontem, os milhões de Tricolores espalhados por todo o Brasil sentiam o gosto do féretro no ventre. Parecia tudo perdido: os resultados da rodada no campeonato brasileiro eram amplamente prejudiciais à nossa campanha e, depois da aguerrida partida contra o Atlético Mineiro, a impressão era a de que a casa tinha ido pelos ares. Terminado o primeiro tempo do jogo no Mineirão, contra o Cruzeiro, candidato a uma vaga para a Copa Libertadores e até mesmo ao título do certame nacional, éramos um arremedo de time. Fomos atropelados pelos celestes, e dois a zero para eles foi muito pouco nos quarenta e cinco minutos. Não tínhamos meio de campo, nosso ataque não funcionava e tínhamos entrado em campo sem goleiro – para contemporizar, direi que entramos sem nosso goleiro titular, Rafael, que tem sido um dos principais lutadores contra nosso descenso. Conca não estava bem, Equi González errava tudo o que tentava, Maicon também. O Fluminense, que ameaçara grandes momentos contra Corinthians, Santo André, Goiás e o Galo, era um borrão, um rascunho malfeito de time. Podíamos ter sido goleados. Mas não aconteceu. E, para o desespero dos idiotas da objetividade, a irritação de pascácios como Kfouri e a raiva de boa parte das editorias esportivas dos jornais, que já tinham em mente a manchete com o descenso do Fluminense, o que era uma derrota fragorosa se transformou em uma das maiores vitórias da história das Laranjeiras. Uma vitória para jamais ser esquecida, até mesmo se nossa luta contra o descenso tiver sido em vão – hipótese na qual, sinceramente, não acredito.

Foi uma vitória de garra, de luta, de sangue Tricolor nas veias, capaz de tremer céus e infernos.

Lembro que escutei no rádio depoimentos que levavam a crer no fim do Tricolor. Houve uma exceção: Luiz Mendes, um dos maiores homens de rádio de nossa história. O decano do rádio comentou que, em sua vida, já tinha visto viradas fantásticas e que, por mais que parecesse impossível, o Fluminense poderia mudar sua postura desastrosa de então para segundo tempo, de modo a conseguir o único resultado que lhe servia – a vitória. Nas arquibancadas, cinqüenta mil cruzeirenses a gritar: ali, naquele momento, eles eram a maior torcida do Brasil. Todas as grandes torcidas são maiores do Brasil em algum dia, exceto pelo direcionamento canhestro da imprensa. E também escutei os risos do debochado equatoriano Guerrón, ao ser perguntado sobre ser novamente o carrasco do Fluminense, depois da tragédia na Libertadores de 2008. Riu como uma hiena e riu de sua própria ignorância. Guerrón não conhece bem o ofício de ser um carrasco. Ele não é Benedito de Assis. E, ingenuamente, desceu as escadas do vestiário com o sorriso alvar do bobo alegre, mal imaginando o que lhe sucederia em pouco tempo.

Contudo, o que mais restaria? Esperar por um milagre. Uma mudança de atitude. Um gol no início da segunda etapa talvez arrefecesse os ânimos do Cruzeiro e poderíamos tentar algo. E então Cuca: bronqueou, esperneou e mexeu com os brios da equipe, cheia de jovens promessas; jogadores limitados, mas raçudos, e um craque chamado Fred.

Veio o segundo tempo. Quem espera, sempre alcança.

E o que era um jogo perdido, virou um de nossos grandes triunfos. Em vinte minutos, pode-se dizer que o jogo era nosso. Empatamos um jogo perdido e o torcedor, que não é bobo, percebeu que a virada era inevitável. Primeiro, com Gum, que fez às vezes de atacante, do jeito dele, um tanto atabalhoado, fazendo o primeiro gol em chute na diagonal que morreu no canto direito baixo do goleiro Fábio. Menos de dez minutos, demos as cartas.

Não houve tempo do Cruzeiro respirar. Foi um potente gancho de direita, seguido de outro. Em três minutos, Fred recebeu livre e tocou no canto direito baixo de Fábio. O mesmo canto, um outro gol; a bola ainda bateu no zagueiro cruzeirense Gil antes de repousar nas redes. O silêncio que habitou o Mineirão foi o mesmo que percorreu o Brasil: afinal, o Fluminense não estava morto? Não havia chegado o fim? Não, de forma nenhuma! Estávamos muito vivos. Era o empate, e quem empata nestas circunstâncias merece vencer. Desta vez, se fez justiça no futebol.

Mais cinco minutos de silêncio no gigante de concreto das Gerais. Maicon tem uma dividida na linha de fundo, perto da área. Busca um espaço inesperado, consegue invadir o território. Fred vem na corrida. A bola é tocada para trás. Nem era preciso ver para saber o que aconteceria: canto direito baixo, bola no fundo das redes. Tal como tinha feito no segundo gol, Fred não comemorou contra o seu time de coração; entretanto, era muito fácil saber que estava muito feliz, como jogador e atleta: sabia ser ali o protagonista de uma das maiores vitórias do Tricolor em todos os tempos. Uma vitória como reza a nossa história, conseguida quando menos se espera e quando não apostam um centavo moído em nós. Uma virada com o emblemático placar de três a dois, marcado a ferro na pele da Gávea.

Atônito com o nocaute, o Cruzeiro ainda tentou duas chances a gol, bem-defendidas por nosso goleiro reserva. Mas foi pouco. Os celestes, que tinham rido muito dos rivais atleticanos na quinta-feira passada, sentiram o peso do cajado Tricolor. O debochado Guerrón, que vivera seus quinze minutos de celebridade com muito mau gosto, já tinha sido substituído; assim, viu do banco de reservas uma aula do que é o Fluminense – e, certamente, seu riso de deboche feneceu à míngua. Não somos um timeco de segunda categoria, como se vende nos medíocres textos e falas de homens da imprensa. Não somos sequer o time que, neste campeonato, teve um desempenho claudicante e se tornou o último colocado. O verdadeiro Fluminense é este, com invencibilidade e atuações dignas. Luta, raça e uma camisa secular que merece respeito. Não é a boca torta de Kfouri que derrubará o Fluminense, porque esta mesma boca torpe não foi capaz de salvar seu Corinthians; não são as piadas misóginas de Renato Prado que derrubarão o Fluminense. E que não se iludam: o time que foi capaz destes triunfos recentes é capaz, sim, de vencer o líder Palmeiras, no Maracanã abarrotado de domingo. E de vencer muitos jogos mais. Nossa luta continua dependendo somente de nós mesmos.

Quatro vitórias por um a zero.

Revivamos o time campeão de 1951, tratado ironicamente pela imprensa de “timinho” por que ganhava seus adversários pelo escore mínimo, e que, um ano depois, se tornou campeão mundial. Nossa Copa do Mundo, desta vez, não tem a glória de um título, mas sim a de resgatar a dignidade do Fluminense.

Na quinta-feira, há uma batalha difícil pela Sulamericana, contra o Universidad de Chile. Mas nossos corações estão mais do que empenhados na batalha contra o Palmeiras. Estamos de pé. Escapar ainda é possível e todos nós temos fé.

Paulo-Roberto Andel, 02/11/2009

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