Tuesday, March 27, 2007

O jogo Centenário

As atuais circunstâncias do campeonato do Rio de Janeiro causam curiosidade, uma vez que qualquer partida no chamado “torneio de tiro curto” é de importância vital para os times na competição. Assim foi ontem.

Returno, primeiro clássico, Tricolor e Alvinegro frente a frente. O jogo centenário.

Botafogo e Fluminense ajudaram a estabelecer os paradigmas do futebol brasileiro em seus primórdios, e já podemos trazer a corda para o lado de Laranjeiras – o Fluminense, já com dois anos de vida quando o Botafogo nasceu. Houve um século, e tudo mudou nesta terra, muitas coisas e muitas gentes passaram, menos aquelas camisas, que têm duelado uma bela esgrima futebolística desde muito antes dos tempos do Onça. Dessa forma, qualquer encontro entre os dois tem algo de centenário, de tradicional e definitivo. Não à toa, apelidam o confronto de “clássico vovô”, o mais antigo do melhor futebol do mundo.

Com os resultados da rodada anterior, poderia haver um favoritismo botafoguense: vinham de uma goleada antológica sobre o Friburguense, ao passo em que os Tricolores andaram rateando contra o time de Cabo Frio. Entretanto, no gramado, o primeiro tempo foi de grande equilíbrio. As oportunidades surgiram para os dois ataques, que mostraram fraqueza nas finalizações. Nisso, o Tricolor foi pior: afinal, aos trinta minutos, teve a seu favor um pênalti, cometido em cima do esforçado atacante Soares. Para cobrar, o craque, Carlos Alberto. Aconteceu o fracasso: embora a cobrança tivesse sido feita com firmeza, o jovem goleiro Júlio César foi preciso e espalmou a bola vinda no canto direito, salvando a meta alvinegra. Carlos Aberto é ótimo jogador, mas não é Assis, Delei, Paulo César. Outras chances, não tão evidentes como um pênalti, aconteceram antes: o próprio Botafogo, no início do jogo, perdeu quase duas jogadas de área seguidas com o brilhante Dodô.

Apesar do baque que qualquer pênalti perdido gera, o Tricolor manteve-se no ataque, sem ameaçar drasticamente o Botafogo. E terminou a primeira etapa.

O segundo tempo foi tomado por ares frenéticos. Cada um dos times perdeu o que se chama de gol feito, e seguidamente. O Botafogo, aos cinco minutos, num chute de Jorge Henrique e defesa do goleiro Fernando; o Fluminense, no minuto seguinte, com Soares chutando por cima do travessão.

A velocidade passou a imperar na partida, com espaços em ambas as defesas. Embora passasse a falsa impressão de certo domínio do Fluminense, o que ocorreu na verdade foi a inteligência alvinegra em perceber que o adversário subia com generosos espaços na retaguarda, e passou a explorar isso, causando temores aos de Laranjeiras.

Aos quinze minutos, novamente Soares perdeu um gol pronto, driblando a defesa botafoguense e, mais uma vez, chutando por cima do travessão. Mau presságio, pensaram os homens da arquibancada colorida. Estavam certos. Agouro a caminho.

Diguinho, jogador querido de General Severiano, mas de escassos recursos, resolveu experimentar um chute da intermediária, longa distância. Acertou o canto esquerdo de Fernando, num lance que para mitos pode ter sido um “frango’, dada a distância. Não havia um Castilho, um Paulo Victor, um herói capaz de evitar o drama debaixo das traves. E aconteceu o gol botafoguense, o gol do martírio Tricolor. As arquibancadas alvinegras tremeram de emoção, embora não cheias de torcedores, conforme seria justo e necessário.

Nos vinte minutos restantes, o Botafogo soube jogar com astúcia, esperando o desesperado Fluminense e mantendo sua política de contra-ataques, cozinhando o jogo e saindo velozmente quando preciso. A rigor, a única ameaça Tricolor aconteceu a poucos minutos do fim, quando Alex Dias, experiente, mas com atuações alternadas desde que chegou a Laranjeiras, chutou rasteiro, para nova defesa de Julio César.

Os botafoguenses vibraram com razão. Os seis pontos nas duas rodadas credenciam a briga para uma vaga nas semifinais e a tão sonhada decisão do campeonato. O Tricolor chora, lamuria. Não teve o que se pode chamar de má atuação, mas pecou no ataque e não reuniu forças para reagir a um gol que, pela natureza do lance, especificamente, foi inesperado na ocasião.

Não cabe buscar culpados pela derrota, e nem é o caso. Contudo, se Fernando e Carlos tivessem buscado inspiração em seus antecessores do manto Tricolor, talvez a situação tivesse sido outra.

A verdade é que o Botafogo segue firme. O Fluminense, com os pés no cadafalso.

Paulo Roberto Andel, 19/03/2007

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