Monday, May 22, 2006

A cabeçada merecida

O Tricolor voltou a campo no fim da tarde de ontem.

Um outono discreto, com certo frio e céu cinzento, sobressaltado pela desclassificação de quarta-feira passada. Sim, nós, Tricolores, ainda estávamos – e estamos – com o gosto do fel por desperdiçarmos outra chance de ir às Américas, chance esta que parecia tão cristalina e que sucumbiu perante a força da Colina. Tínhamos mais do que time para lá chegar; faltou-nos, creio, maior vigor para a conquista da vaga para a final do certame.

Tudo isso tem sua carga de curiosidade e, cada vez mais, contra boa parte da mídia esportiva calhorda. Explica-se: dia desses, nosso Tricolor era basicamente o João Bafo-de-Onça do futebol brasileiro, o grande vilão, o responsável por todas as mazelas. Caímos para a terceira divisão com três derrotas, três! Quem será capaz de explicar tamanho descalabro? Por isso, nós, que ajudamos em muito a sedimentar as cinco conquistas mundiais da seleção brasileira, que estreou em nosso estádio e com nosso goleiro, passamos a sofrer todo tipo de achaque. Fomos ao inferno e voltamos. Nos últimos seis anos, nossas campanhas têm sido marcadas por quase conquistar muitos títulos, passando sempre na beira do quase; assim, a torcida do Tricolor, que exasperava-se com a possibilidade do fim do time há poucos instantes, hoje revolta-se com a não conquista de títulos. O amigo Marcos Caetano deixa sempre claro em texto: nós, tricolores, já ultrapassamos o estágio onde se precisa conquistar títulos. Certamente são desejáveis; entretanto, somos das Laranjeiras – nós criamos tudo o que de bom aí está e, dessa feita, estamos acima de troféus, dado que já os temos aos montes.

De qualquer forma, é natural que a torcida tenha seu momento de tristeza. Contávamos com a vaga e deixamos que ela pudesse escapar entre os dedos. Em virtude disso, menos de cinco mil tricolores adentraram Maracanã ontem para prestigiar o match contra o Santos, que não é mais o de Pelé e sim o de Luxemburgo, com seus ternos e gritos.

Éramos poucos e fazíamos algum barulho. Se querem saber sobre o jogo, diria que foi equilibrado e fraco, bem fraco. Nós entramos sob a égide do desânimo, do cansaço psicológico. O Fluminense pode e deve disputar todos os títulos que possam surgir pelo caminho; ao ficarmos frustrados com a derrota do meio de semana, nosso jogo ontem não foi o que espera. Talvez o Santos tenha sido melhor em maior parte do tempo, dirão os velhos idiotas da objetividade consagrados por Nelson. E daí? Nós fuzilamos o Vasco no primeiro empate, um show de bolas na trave; na segunda partida, em nosso único descuido, carregamos a cruz de Edílson. Na terceira, após um rápido empate ao voltar do intervalo, contando ainda com a trave salvadora que confirmou a cobrança de Petkovic, faltou-nos a força que sobra-nos em papel. Por que teríamos ainda que amargar mais azar depois de quarta? O que justificaria outro revés ontem, em nossa casa? Nada.

Os deuses do improvável jogaram seus aromas em nosso campo; melhor dizendo, na cabeça coroada do zagueiro Luiz Alberto, que nos proporcionou o golaço que não conseguíamos fazer há tempos. Não importa que tenhamos jogado mal, não interessa o diminuto público: nós merecemos vencer sempre e, se isso deixa de acontecer seguidamente, feito quando enfrentamos o Vasco, o adversário seguinte merece queimar no inferno da derrota – este inferno é o que saiu da cabeçada de Luiz Alberto para o ângulo direito do goleiro Fábio Costa. O mesmo Fábio que é recentemente marcado por grandes gols de cobertura a favor do Tricolor – ano retrasado, uma cabeçada certeira de Romário destroçou o então arqueiro de Parque São Jorge.

Ontem foi dia de orarmos com o terço do futebol. Graças aos credos, foi que expulsamos o fel da derrota para o inferno. Nosso destino é a glória, a conquista suprema, absoluta. Não deveríamos ter sido eliminados pelo Vasco e fomos. Não jogamos o suficiente para a vitória contra o alvinegro paulista, é certo. Contudo, foi nosso merecimento. Ou alguém acredita que, em sã consciência, a certeira cabeçada contra que nos garantiu o triunfo foi mera obra do destino?

Ledo engano.

Estava escrito, mais do que escrito, há muitos outonos gelados, desde antes do nascimento de Nelson. Desde antes do nascimento da nossa própria camisa, a cinza.

E foi em um Maracanã frio, gelado, de outono e penumbra que nós, Tricolores, começamos nossa nova caminhada, outros passos curtos para novas conquistas, pois.






O futebol é coisa séria

O futebol no Brasil é uma coisa muito séria.
Não estou falando do futebol do Brasil, do futebol praticado pela seleção brasileira, apesar de estar esperançoso e otimista com o escrete de craques confirmados pelo nosso controvertido treinador e seu fiel escudeiro tantas vezes vencedor. Tão pouco estou falando do futebol dos campeonatos disputados pelos nossos clubes de coração, das grandes agremiações espalhadas pelas diversas divisões de futebol do nosso país, que já não os acho tão sérios assim, visto os lamentáveis episódios ocorridos no brasileirão de 2005, e a situação atual que se encontram alguns dos principais e tradicionais clubes destas terras de cá.

Quando o digo sério, também não falo do futebol esporte, onde resultados inesperados são esperados, são passíveis de imensa e crédula torcida, pois muitas das vezes são concretizados. E isso só ocorre com este esporte, visto que não temos por aí loterias esportivas de outras modalidades, pois os resultados são previsíveis, até os imprevisíveis, veja só, quando temos partidas de basquete ou de vôlei entre equipes que se equivalem tecnicamente, onde pode vencer tanto este como aquele clube, é isto o que realmente acaba acontecendo, ora vence um, ora vence o outro, no futebol não, você pode ter dois times em igualdades de condições dentro e fora de campo, e ocorrer de apenas um sempre vencer, é aí que começam a nascer as ditas Escritas do Futebol, como se fosse algo já traçado nos destinos destes dois personagens, e que ajuda a envolver ainda mais de misticismo este jogo tão surpreendente.

E quem já não soube de um grupo muito mais fraco, sem nome, sem tradição, até literalmente sem camisa, arrancar das pernas dos seus jogadores e dos corações que vão parar nas pontas das chuteiras um resultado surpreendente, tudo bem que às vezes contam com ajuda dos chamados Deuses do Futebol, mas isso também faz parte da magia que o envolve. Ainda assim, não é este que quero mencionar.

A seriedade que me refiro vem do futebol que é praticado até por quem não tem afinidade ou não tem intimidade com a pelota, que é praticado apenas pela necessidade de inserção do indivíduo em sua comunidade. Falo do futebol que aparece como uma das primeiras formas de manifestação de valores morais dos meninos, onde aparece a organização voluntária em prol de um objetivo, onde aparece o líder que organiza a aparente bagunça com um simples par ou ímpar, onde aparecem os justiceiros, os defensores, os democratas, e os que possivelmente apresentarão problemas de desvio de conduta. Tudo isto pode ser observado neste futebol que classifico como sério. Tão sério, que se, durante a partida, no momento que aflorar este desvio de comportamento, o menino for orientado corretamente por um pai, um educador ou um ente querido qualquer que esteja preocupado com a formação desta criança, “esta alma poderá ser salva”, e deixaríamos certamente de ter tantos escândalos políticos, econômicos e sociais nos noticiários do nosso país.

Falo também do futebol agregador, do futebol que reúne as pessoas, do futebol que desliga os programas medíocres das televisões, que desconecta as salas de bate-papo da Internet, que os meninos maiores organizam pela simples necessidade de se encontrarem uns com os outros, do futebol sagrado, daquele que a esposa permite, que já está marcado como território conquistado, daquele que a agenda é completada em sua função, que não se marcam reuniões nem festas naqueles dias, pois é o dia da pelada semanal, é o dia de falar besteira, de falar coisa séria, tudo com muita cerveja gelada, de fazer um churrasco e um pagode depois do futebol, que pode ser durante ou antes também, do futebol que às vezes pode até nem ter futebol, esse sim, meus amigos, é coisa muito séria.

Nelson Carlos Câmara Borges 22/05/06

O novo Rei Zulu


“Mar-cão! Seleção! Mar-cão! Seleção!”

Com este carinhoso grito de guerra, desde 1.999, a grande torcida tricolor presente aos jogos reverencia o jogador Marcão, no momento em que a escalação da equipe das Laranjeiras é anunciada nos alto-falantes dos Estádios em que se apresenta.

Marcão realmente lembra os grandes cabeças-de-área do passado, o xerife do time, aquele que protege os zagueiros, rouba as bolas do adversário, funga no cangote, chega a todas as bolas divididas, comete faltas providenciais, questiona os juízes, encara os jogadores mais assanhados do time oposto, mostrando o “cartão de visitas” logo no início das partidas, corre o jogo todo, vai ao ataque no desespero, joga improvisado se preciso for, até no gol se não tiver goleiro. Bate córner e corre pra cabecear!

Chegou ao tricolor de mansinho, vindo do Bangu e com sua dedicação, raça e muita disposição, além do grande nível de profissionalismo, foi conquistando no clube e principalmente no coração da torcida, o espaço deixado pelo antigo Rei Zulu, o Denílson, nosso cabeça-de-área, também por muitos anos, nas décadas de 60 e início de 70.

Nunca foi protagonista de jogadas mirabolantes, de dribles maravilhosos, mas com suas constantes demonstrações de pura raça, nos momentos de aflição, quando às vezes a situação parece perdida para o tricolor, levanta e leva a galera ao delírio, roubando bolas ou chutando pra onde der. Joga para o time, em qualquer circunstância, faça chuva ou sol; nunca está envolvido em polêmicas fora de campo e outros bochichos, em situações políticas; joga com quem chegar ao clube, é amigo de todos. Enfim, Marcão é unanimidade nas Laranjeiras! Quem já tentou barrar o cara, sentiu a ira da torcida! É o eleito representante da mística e do orgulho encarnados na camisa tricolor!

Com mais de 350 partidas pelo Tricolor das Laranjeiras, é hoje talvez, o jogador de maior longevidade em um clube brasileiro, o que o aproxima ainda mais dos jogadores de décadas passadas. Do tempo em que sabíamos escalar qualquer dos times antes mesmo do Campeonato se iniciar. No Fluminense é Marcão e mais dez!

Muitas vezes não tem o devido reconhecimento da imprensa, pois mesmo quando é o melhor em campo, não passa de nota oito, mas dificilmente ganha menos de seis. Pra torcida, Marcão é sempre nota dez!

Não é o que se pode chamar de artilheiro. Faz poucos gols; porém, vem se notabilizando pela marcação de alguns, de grande importância como o da virada em cima do Volta Redonda na final do Carioca de 2005, quando o Fluminense sagrou-se Campeão Estadual. Marcou também o primeiro contra o Americano na final de 2002, abrindo caminho para a conquista do título daquele ano.

No último clássico contra o Botafogo, marcou um dos mais belos gols que presenciei no Maracanã. Digno dos grandes craques, daqueles gols que valeriam a nota máxima nas avaliações dos noticiários esportivos, se assinalados por Romários e Zicos nos bons tempos. Digno de placa! Bola alçada na área que sobra após disputa pelo alto, no limite da área pequena. A defesa adversária, estática, assiste estupefata, atônita, como que torcendo e esperando a bola entrar, consolidando a jogada de grande beleza plástica. O salto, a pedalada no ar e nosso herói de ébano acerta um chute certeiro e forte que estufa as redes alvinegras e enlouquece a torcida. Golaço! Inapelável! Lindo! Na mesma hora disparei: O ingresso já está pago! Golaço! Bicicleta! Tal como ensinou há tempos atrás o grande Leônidas da Silva, o “Diamante Negro”.

Craques de nome passaram pelo clube nos últimos anos. Momentos de euforia, de tensão, de grande tristeza, crises, também passaram. Gerações inteiras de jovens jogadores apareceram e alguns já se foram. Outras promessas surgiram e também passaram. Enfim, tudo passa, mas Marcão resiste a tudo e a todos e continua. Herói absoluto e detentor das graças da galera! O novo Rei Zulu!

Mar-cão! Seleção!
Jocemar de Souza Barros

Salve o América!

Trinta e oito do segundo tempo, um a zero América, que levava o jogo sem maiores problemas para uma vitória bonita e justa.

A torcida cantava: “Dá-lhe, dá-lhe, dá-lhe sangue! Seremos campeões!”

De repente, o juiz marca um pênalti duvidoso, ou pelo menos rigoroso (coisas que acontecem e sempre aconteceram ao longo da vida do América). Quarenta minutos e o adversário empata.

Sufoco! A torcida se entreolha.

Morreremos na praia novamente?

O que estarão tramando os deuses do futebol agora?

Jogo terminado, um a um, começa a dolorosa e interminável disputa de pênaltis.

Por instantes parece que a baliza escolhida para as cobranças é a do lado oposto à torcida rubra. Engano. Parece que os deuses deram uma mãozinha.

A torcida não parece desanimada e acredita, incentiva e seca, grita o tempo todo!

Como não poderia deixar de ser, a disputa é nervosíssima e segue empatada até o final da série. Na última cobrança o adversário erra. Bola na trave!

Na euforia, cheguei mesmo a gritar: É Campeão!

Estava sacramentada a vitória do Mequinha, do Mecão, do América! Saaannngueee!

Os deuses e provavelmente mais um monte de americanos, presentes e ausentes, vivos e mortos, soprando a redonda para fora do gol, ajudaram e desviaram o último chute, que caprichosamente beijou a parte interior da trave e correndo perigosamente entre o goleiro e a linha do gol, decretava a vitória (e haja Isordil).

Como diria o grande cronista tricolor Nelson Rodrigues: “Estava escrito há três milhões de anos” América na final da Taça Guanabara após vinte e três anos de espera.

Taça Guanabara! Ah! Guanabara! Que saudades da Guanabara!

Saudades da Guanabara! Da baía de águas claras... Como diria o poeta na música feita em louvor ao antigo estado.

Que saudade do velho Campeonato Carioca!

Do América de Edu, Alex, Badeco, (quem não lembra?), ou do time: Rogério, Orlando, Alex , Geraldo e Álvaro, Ivo, Bráulio e Edu, Flecha, Luizinho e Gilson Nunes; do Bangu de Aladim e Paulo Borges; do Madureira; do São Cristóvão; do Campo Grande, etc, etc... e sem os Caixas D’Água, sem os empresários gulosos, sem os cartolas inescrupulosos.

Quem não se lembra das rodadas duplas entre grandes e pequenos, da geral, dos troca-trocas?

Torcida vibrando como há muito tempo não vibrava, nem lembrava.

Que emoção! Dia típico da Guanabara. Noite quente e céu estrelado! Lindo!

Maracanã de gramado impecável, majestoso tapete verde para coroar o espetáculo!

Foi de arrepiar qualquer ser humano com um pingo de sensibilidade e principalmente sendo amante do futebol, particularmente do futebol carioca.

Fiquei emocionado e porque não dizer, com inveja do torcedor americano (sou tricolor). Não por vencer uma partida ou chegar a uma final de torneio, mas por manter tão viva e forte essa paixão, esse amor por seu clube, por um clube afastado da mídia, tão combalido, muitas vezes alvo de piadas, de brincadeiras, por um clube que pouco jogou ou sobreviveu nas competições de que participou nos últimos vinte anos, por um clube dura e injustamente castigado e perseguido pelas próprias instituições que deveriam tê-lo ajudado a manter-se vivo, à altura de suas tradições, vitórias, glórias do passado e representatividade indiscutível conquistada dentro do cenário esportivo brasileiro e carioca.

A torcida, por incrível que pareça, ainda se renova. Talvez com menor velocidade e força que em tempos passados, tal o longo período de vitórias escassas.

Que emocionante ouvir o grito que vinha da arquibancada: “Ah! O Maraca é nosso!”

Há quanto tempo essa torcida queria e merecia soltar esse grito!

É, e o Maraca era mesmo do América! Afinal, o Maraca é tanto do América, quanto dos outros, que vivem gritando a cada jogo. Depois sair às ruas em gloriosa caravana de carros a buzinar e sacudir as bandeiras e camisas rubras.

Parar nos bares ao redor do Maraca e bebemorar. Tirar uma onda com os outros torcedores, ultimamente tão acostumados a encarnar no torcedor americano. Saaannngueee!!!

Vi crianças, adolescentes, jovens adultos e logicamente, os idosos, representantes máximos e pilares da legião de americanos, que certamente não cabe em meia dúzia de Kombis, como costumam dizer por aí.

Vença a final ou não, já valeu (mas acho que os deuses vão ajudar).

Fica a certeza de que o América está cada vez mais vivo. (Estou arrepiado escrevendo estas linhas).

Que fique gravada a grande lição de amor e paixão da Torcida do América. Lição de amor e paixão por um clube e pelo futebol!

América vovô! América centenário!
América, primeiro time de muitos e segundo time de todo o resto!
América, que inspirou tantos outros Américas pelo Brasil afora!
América, que é parte importante e confunde-se com a história dessa Cidade Maravilhosa!
América, que traz no hino a introdução do Hino da Cidade (Lalaiá, Lalaiá, Lalaiá, Lalaiá, Lalalaiá, Laiá, Cidade Maravilhosa, Cheia de encantos mil...).

Senti que hoje o Rio acordou mais feliz, a Guanabara mais feliz, o futebol mais feliz com a volta por cima do América!

Torcedores rubros saindo de casa com o peito estufado exibindo a camisa, tanto tempo guardada!

Torcedores de ontem e de hoje, que pouco se manifestavam e que muitas vezes desconhecíamos o verdadeiro clube de coração!

Já ia me esquecendo: O América é grande sim! Sempre foi e sempre será!

Deus abençoe o América!

Final da Taça Guanabara

Botafogo x América! Estrela Solitária x Diabo!

Jogo clássico! Como nos velhos tempos!

Maracanã cheio. É certo que nem tanto como nos tempos de cem mil torcedores, visto que a capacidade atual foi reduzida por questões de segurança e nova distribuição dos espaços foi feita para maior conforto do torcedor.

De um lado, a grande e fanática torcida do Botafogo, ocupando em preto e branco, três quartos do espaço na arquibancada. Do outro lado, a não tão grande, mas não menos fanática torcida do América, das camisas e bandeiras rubras, ocupando um espaço menor.

Uma festa e tanto, colorida, alegre e o mais importante, sem violência. Duas torcidas apaixonadas, respeitando-se e incentivando seus times, que é o que se deve esperar fora do campo de jogo.

Assisti ao jogo junto à torcida do América, meu segundo clube, pois sou tricolor de coração, mas tenho ligações afetivas com o clube rubro por herança familiar. Eu e outros torcedores de outros clubes, que também guardam uma grande simpatia pelo Mequinha, formando a chamada “torcida arco-íris”, pudemos presenciar uma bela demonstração de paixão antes, durante e ao final da partida, que definiu o Glorioso de General Severiano como Campeão da Taça Guanabara. A torcida do América, pequena de certo, proporcionou momentos de pura emoção, acreditando o tempo todo, cantando, chorando de alegria no único gol de seu time, e chorando de tristeza e decepção ao apito final do juiz.

No fundo, as duas torcidas trazem em comum, certa carga de sofrimento contraída nos últimos anos em função de seguidas situações de insucesso.

Os hinos apresentam pontos parecidos, com boa dose de nostalgia nas letras: “Botafogo! Botafogo! Campeão desde 1.910...”; e... “Campeão de 13, 16 e 22... Lalaiá”, trechos que ressaltam as glórias passadas, os primeiros títulos, lembranças de um tempo muito bom para os dois clubes.

O América, mesmo sem poder ser comparado aos grandes times do passado, teve lampejos de grande futebol, chegando a dar a impressão de que venceria o jogo e conquistaria o título tão sonhado. Na primeira etapa, a torcida em êxtase, parecia não acreditar no que via e entoava o hino seguidas vezes e provocava os adversários com as costumeiras encarnações, além das buzinas em coro, estridentes e ensurdecedoras.

A Estrela Solitária, por outro lado, também não brilhava como nos tempos de Mané, Paulo César e Jairzinho, é verdade. Porém, encheu de orgulho sua torcida, com a espetacular virada na etapa final.

Ao final, a vitória do Botafogo e a explosão da torcida alvinegra! Fogão Campeão!

Finalmente, na saída pelo corredor de acesso às arquibancadas, a última demonstração de paixão da torcida derrotada, como um último suspiro após o golpe derradeiro. Os torcedores briosos e emocionados, alguns ainda exibindo lágrimas nos olhos, com o peito cheio de orgulho, entoavam mais uma vez o hino do clube! Hei de torcer, torcer... Lindo! Emocionante! Ficou em mim e acredito que em todos os presentes, uma gostosa sensação de retorno aos bons tempos do nosso futebol!

Tempo em que as torcidas podiam conviver em harmonia e sair lado a lado pelas rampas da arquibancada. Brincando e sofrendo, mas principalmente se respeitando.

Felizmente, o grande vencedor foi o Futebol Carioca!

Parabéns ao América e ao Botafogo! Viva o futebol!

RJ, 17/02/2006. Jocemar de Souza Barros.

A volta do Campeonato Carioca


Final da Taça GB, América X Botafogo! Bem que poderia ser o prenúncio da volta do velho, charmoso e empolgante Campeonato Carioca e não o às vezes chato e sem graça Campeonato Fluminense da fórmula atual, com dois turnos pequenos, clubes divididos em grupos, com dois “grandes” (mas nem tanto) de cada lado, curtinho, que nem campeonato de peladas.

Digo “Campeonato Fluminense”, sem qualquer intenção pejorativa em relação ao nosso Estado do Rio de Janeiro, ao pseudônimo “fluminense”, utilizado antes da fusão dos antigos estados da Guanabara e o Estado do RJ. Também nada contra os clubes como Americano, Volta Redonda, Cabofriense e outros tantos; porém, entendo que poderiam ter seu espaço e reconhecimento, mas não em detrimento dos antigos pequenos e cariocas como, Campo Grande, São Cristóvão, o próprio América e o Bangu, considerados grandes nos bons tempos, além de outros.

Por que a total falta de apoio a estes clubes, a ponto de não se ter mais notícias? Clubes que outrora, revelavam grandes jogadores, que na maioria das vezes eram contratados pelos grandes para as próximas temporadas e despontavam pelo Brasil afora.

Quem não se lembra do Olaria com Miguel, Afonsinho e companhia; do Madureira de Roberto Pinto (sobrinho do Jair da Rosa Pinto), Paúra, Osni e Russo (aquele do gol do Corinthians contra o Fluminense no Brasileiro de 76 – o jogo da invasão corinthiana); do Bonsuça de Abel, do Bangu de Aladim, do São CriCri, que chegou a ter o Fio Maravilha e de onde saiu o Ronaldinho Fenômeno.

Consideremos, é claro, a evolução que o tempo nos impõe, às vezes de forma um tanto cruel. Não sejamos tão saudosistas!

Mas alguma coisa está estranha, ou não?

Todo mundo que conheço fala a mesma coisa, até os de menor idade, que só viveram o finalzinho dessa época. Por que os grandes do Rio não chegam a lugar nenhum nas disputas de alcance nacional, nem nos torneios de juniores como a tradicional Taça São Paulo? Bem, isso é papo pra especialista e eu sou apenas torcedor!

Sei que é difícil querer a volta de algumas coisas, que como já disse, a evolução trata de transformar em lembrança, memória, passado. Mas ainda acho que no futebol profissional dos laptops a beira do gramado, da alta tecnologia fora dos campos, que nos permite ver os jogos a cores e ao vivo, as jogadas por vários ângulos, conferir nos tira-teimas os lances polêmicos e duvidosos, ainda cabe um pouco de amadorismo no bom sentido da palavra, no sentido de amor ao esporte e não só ao dinheiro. Dá pra resgatar ou manter alguns valores ainda vivos.

Afinal, como disse um tio meu, torcedor do América, a bola ainda continua redonda, com vinte e dois homens a persegui-la dentro do campo e a torcida ainda apaixonada por seus clubes e pelo futebol.

Será que o menino de hoje não sente a mesma emoção que sentia o menino de trinta anos atrás, ao entrar pelo corredor apertado de acesso à arquibancada e se deparar com o tapete verde do campo do Maracanã e o anel repleto de pessoas a gritar e cantar num tremular frenético de bandeiras? É inesquecível! Trago essa imagem e emoção até hoje guardada na memória, e ainda me emociono quando entro no estádio.

Lembro-me de sair de casa cedo para assistir à preliminar de juniores aos domingos, pegar o trem cheio em Madureira, com a galera já aquecendo e batucando nas portas e no teto do vagão, de buscar no radinho de pilha as notícias fresquinhas do meu time (Fulano joga? Era dúvida até ontem...), descer na maior gritaria na Estação do Derby Club.

E o Campeonato de Aspirantes? E o Torneio Início, disputado em um dia? E as rodadas duplas no meio de semana? E a geral? E aquele cachorro quente da Geneal, e o Mate Leão que o vendedor despejava com pressão no copo de papel e a gente pedia pra completar o espaço deixado pela espuma? E o amendoim torrado, e o biscoito de vento (isso ainda tem...)? E os torcedores símbolos, como o “Careca” na torcida do Fluminense, enrolado o jogo todo na bandeira, a jogar pó de arroz nos “felizardos”? E a página do “Globo” no dia após a rodada do final de semana com o Diploma de Sofredor e o Placar Moral das partidas? E Nelson Rodrigues? E Otelo “O Caçador”? E a violência que não havia; mas isso tem outras explicações mais complexas, que também não cabe aqui discutirmos, embora saibamos que alguns dirigentes tenham uma boa parcela de culpa na questão do acirramento entre algumas torcidas.

E os ingressos nas bilheterias para todos e não pra cambistas, além das contagens de público pagante e presente mais coerentes com o real?

Tudo bem. Sabemos que o tempo passa, as coisas mudam e algumas não podem mais voltar. Nós mesmos não voltamos dos quarenta aos vinte anos de idade, mas nossa paixão continua a mesma, não envelhece.

Em nome dessa paixão de todos nós brasileiros e cariocas em especial, dessa paixão que provoca insônia na noite anterior ao grande jogo, frio na barriga minutos antes da pelota rolar, da paixão que não nos deixava chegar atrasado à seção de cinema, para ver e vibrar com as belas imagens do Canal 100 (aliás, será que não dava pra reeditar ou fazer alguma coisa nova na mesma linha?); por tudo isso é que sonhamos com a volta do Campeonato Carioca; ou com a volta, pelo menos de parte de um tempo mágico do nosso futebol, do tempo em que sabíamos a escalação completa dos principais times, decorando-as por anos seguidos; tempo em que os garotos tinham batizados os nomes dos jogadores em seus times de botões - tempo em que beijar o escudo, a camisa de um clube, não soava tão falso como hoje em dia.

RJ, 16/02/2006. Jocemar de Souza Barros.

Friday, May 19, 2006

O tiro de meta

Fiquei observando a televisão de forma ocasional.
Era um jogo de bola, desses de garotos pelos quais ninguém dá nada ainda e, quando ninguém espera, oferece jogadores para ainda manter viva a chama do nosso futebol, tão combalido nos dias atuais.
Jogo num estádio do interior, transmitido pela rede pública, reprisado numa madrugada, João tocando e a partida correndo enquanto paralelamente eu lia jornais. Interrompi a leitura por instantes, fitei a tela e me deparei com um tiro de meta. Não era uma jogada qualquer, era um tiro de meta. No instante, o único ser vivo na tela focada a grande distância era o goleiro, um solitário goleiro com a responsabilidade de reconduzir o jogo carente de torcedores, repórteres e outros participantes - imagem que permaneceu por muitos segundos, dado um bloqueio momentâneo na transmissão. Eis que a televisão me pareceu como um grande quadro, uma monumental aquarela, com aquele solitário menino estático a observar a bola e pensar em como iria chutá-la, para onde e com que força, tudo cercado pelo silêncio que só a voz de João é capaz de fazer ecoar. Mais segundos, mais silêncio, mais solidão do goleiro na tela como se ninguém mais estivesse no estádio a apreciar sua intenção, exceto eu. Quando se pensa em futebol, é certo que muitos imaginam o grande gol, a jogada mirabolante, o passe apurado, o domínio com categoria, o drama do pênalti.
O tiro de meta, meus amigos, é um importante momento marginalizado: difícil a sua consecução terminar em algum dos lance anteriormente descritos. Entretanto, não sei se pelas substâncias e solidão a mais ou alegria de menos, pus-me a contemplar aquela imagem congelada como um princípio de esperança - era um tiro de meta, amigos. Naquele tiro, naquela cobrança é possível identificar até um cotidiano de nossas vidas: é do tiro de meta, após um interrupção, que o jogo recomeça.
Mais substâncias, tracei em minha confusa memória uma relação com minha própria vida, machucada por revezes que deveriam sair por uma imaginária linha de fundo, representados por uma bola. A vida, amigos, ávida por si própria, voltaria após breve intervalo a ser vivida tão logo fosse trocada a bola por outra e a devida reposição pelo tiro de meta seria um recobrar de ânimo, um renascer das cinzas, um poente a abafar a tempestade - talvez seja este o significado da expressão popular "bola pra frente", não vinda de um lançamento primoroso mas sim do desprezado e esquecido tiro de meta. Talvez daí seja a razão do futebol ser tão apaixonante e cobiçado por gente de todo o mundo; no jogo, podemos encontrar relações diretas com nosso viver através da vida e morte do jogo: a derrota pelo gol sofrido e a alegria pelo tento marcado; a beleza da jogada articulada e a besteira da bola perdida; a pressão que não derrota através do chute que vai pela linha de fundo e o recomeçar por, somente por ele, pelo especial tiro de meta.
É preciso entender a força, o vigor e a esperança que um tiro de meta é capaz de mostrar.
É preciso notar a perspectiva que um tiro de meta pode trazer a um jogo do bola, tão preciso quanto um recomeçar na vida depois de uma derrota circunstancial.
Quando a imagem voltou, o goleiro continuou solitário; desferiu o chute e a bola foi para o meio de campo, com vários jovens a disputá-la numa outra imagem.
O estádio continuava vazio e é possível que eu fosse um dos poucos telespectadores.
Depois do revés, o jogo recomeçou tal qual minha vida faz e fará após um desânimo marcante porém passageiro, efêmero feito uma nova bola num canto de linhas de cal.

Paulo Roberto Ândel - 19/05/06

Dos quatro fantásticos e o último grande herói

Amigos, como disse Nelson, nosso pai eterno das letras do futebol, o Tricolor nasceu quarenta minutos antes do nada. E ali, a minutos do fim do nada, coube ao Tricolor arquitetar uma de suas missões: dar camisa aos quatro fantásticos para que, no goal, esculpissem cada um a seu jeito a história do futebol brasileiro na meta. Eu estou aqui para falar destes quatro fantásticos e mais um quinto.

O brasileiro passou a entender o significado da palavra goalkeeper quando Marcos Carneiro de Mendonça, todo de branco e com vistosa fita roxa na cintura, desesperando os adversários e fazendo palpitar os corações femininos. Marcos foi o nosso primeiro herói, com suas defesas elegantes, de pouca movimentação e extraordinário senso de colocação. Marcos, o tricampeão de 17 a 19. Quando a seleção brasileira ganhou o primeiro título de sua história, era Marcos o seu goleiro, fantástico goleiro, o pioneiro – e em muito deve ter inspirado o acidentalmente rubro-negro Pixinguinha em sua clássica “1 x 0”. Depois de imensa e definitiva carreira de louros nos gramados, ainda foi nosso campeão como presidente do club.

Nos tempos de nosso primeiro fantástico como presidente, veio Batatais, batizado Algisto Lorenzato. Cinco vezes campeão em seis anos. Dez anos de titularidade. A Copa do Mundo era francesa, parisiense, e nós, devotos do Tricolor, emprestamos classe e categoria ao goal da Seleção Brasileira novamente. Era Batatais, o próprio, e mais um pouquinho de Marcos Carneiro de Mendonça, como se a camisa número 1 do time nacional fosse nossa como que por decreto e fé, uma fé inabalável de que o goal poderia até ser por nós sofrido, mas que seria sempre muito difícil. E assim foi. Sempre.

Marcos partiu, Batatais também. O conjunto de traves manteve-se seguro, perene. Era Castilho. Carlos José Castilho. Goleiro de quatro Copas, duas vencidas, gigantescas, também campeão do mundo pelo Fluminense. Dezenove anos vestindo o manto sagrado que herdou dos antepassados, talvez nos anos 40, provavelmente na preleção feita previamente aos quarenta minutos antes do nada que geraram o Fluminense. Castilho, nossa sorte, a “Leiteria” dos adversários, o nosso santo da baliza. Castilho, que deu seu dedo pelo Tricolor. Era nosso craque da meta, que a tudo via de diferente por conta de seu daltonismo – e que, por isso mesmo, tinha uma visão privilegiada, peculiar, especial, em seu mundo de cores que confundiam um vermelho e um verde que, adicionados ao branco, só poderiam resultar no Tricolor. Não bastassem tantas qualidades, Castilho ainda foi o maior guardião de nossa camisa: ninguém a vestiu em campo mais vezes do que ele.

Quando Castilho foi embora, para quem deveria ser passado o bastão, o cajado que abençoa todo goleiro das Laranjeiras? Veio Félix. Félix Mielli Venerando. Mais cinco títulos em sete anos no Rio, mais um campeão brasileiro em vert, blanc & rouge. Mais uma vez, o Brasil ganhava o mundo com um goleiro do Tricolor em seu elenco. Chegou sob desconfianças, ganhou fãs e cansou de dar voltas olímpicas no Maracanã. Ao sair, parecia ter deixado seu trono vago, o mesmo trono que um dia foi de Marcos Carneiro de Mendonça, Batatais, Castilho e dele, Félix.

Nada disso. Não havia um quinto? Sim.

Era Paulo Victor Barbosa de Carvalho. Veio do Espírito Santo e isso poderia ser claramente um sinal de amém. São Paulo Victor, das defesas quase impossíveis e que sofria apenas os goals impossíveis de serem defendidos. Foi Paulo quem viu lá de longe, do outro lado do campo, a serenidade de Assis ao bater Raul no último minuto, como se fosse nosso Telê, nosso fio de esperança, ao buscar um campeonato até ali improvável. E foi Paulo que novamente viu Assis de novo, no mesmo outro lado, cabeceando enquanto Fillol procurava uma inútil paisagem. Persistente que é, Paulo ainda teve tempo de se ajoelhar e vibrar em campo quando Paulinho deu números finais ao tricampeonato de 1985. Pouco antes, Paulo teve o Brasil a seus pés, era 1984, como campeão de céu e mar. Foi a uma nova Copa da França e repetiu seu antepassado Batatais; não venceu, mas nem precisava. Era nosso último grande herói.

Nosso goal continua impávido, sereno, bem defendido. Se falta-nos um Marcos, um Batatais, um Castilho, um Félix ou um Paulo Victor, é questão apenas de corpo. Na alma, estão todos ali por trás da meta, soprando bolas inacreditavelmente para que deixem de ser goals certos. Ou ainda mexendo invisivelmente as traves para que as bolas chutadas ou cabeceadas não tenham a direção devida contra nós. Se Nelson vivo fosse de corpo, pois de alma sempre será, diria que a camisa do goleiro tricolor, imbatível, implacável, jogaria sozinha – e o goal, eternamente fechado estaria, de tão santificado, abençoado e protegido das intempéries quanto possível fosse.

Por Abnésio Fonseca 19/05/06

Fogo!

Dos tempos do veterano Electro Club, idéia da petizada do Largo dos Leões, tempos idos, 1904, até hoje, já se foi um século embora, com velocidade espantosa. E nós, brasileiros, que mal nos acostumamos a ter lembranças de coisas feitas há duas semanas atrás, não temos muita imaginação para pensar coisas de cem anos passados.

Sábia foi Dona Chiquitota, que repreendeu a turba com a tal história de Electro.

“- Meu Deus, que falta de imaginação! Ora, morando onde vocês moram, o clube só pode se chamar Botafogo!”

Pronto! Estava fincado um dos alicerces da história do garboso football por todo o mundo, hoje visto da janelinha pelo astronauta Pontes, embora a garotada nem pudesse imaginar. Eram Carvalho Leite, Oswaldo Baliza, Octávio de Moraes, Zezé Moreira, Heleno de Freitas, Nilton dos Santos, Didi, Zagallo, Amarildo e, claro, Garrincha.

No meio do caminho, Heleno ousou tentar briga com Paulo Amaral, levou uma bolada e viu o céu estrelado mais de perto. Depois também brigou com Nilton, era um homem belicamente movido. Tempos depois, Amarildo também imaginou que seria possível desafiar Paulo Amaral; prudente, desistiu a tempo. João Saldanha também brigou. Nilton, já treinador, certa vez esmurrou o afloradíssimo árbitro Armando Marques, no que foi muito bem sucedido.

Não era para botar fogo? Time de briga, pois.

Ressalte-se que uma briga não houve: a para fazer alguns dos maiores craques desta arte que alguns insistem em limitar como mero esporte, o tal futebol.

Houve um tempo em que o Botafogo insistiu em não ser campeão, coisa dos anos setenta, chegou quase aos noventa. Era época em que eu debutava sozinho no Maracanã, sem a mão do pai, e ia a muitos jogos, uns sozinho, outros com a rapaziada; muitos do meu Flu, outros do Botafogo – me cativava aquela coisa do time dos meus amigos não ser campeão, que o Francis Hime colocou posteriormente numa bela canção. Uma vez testemunhei um 4 x 1 contra o Vasco, 1982: Geraldo fez um gol de placa, Alemão estreava, Abel ainda era o zagueiro e, ao final, fitei vários torcedores ajoelhados, chorando, abraçados. O Botafogo era e é assim: uma vitória, por qualquer que seja, tem a força de impulsionar um foguete para o Sistema Solar, facto admirável de poesia.

Sete anos mais, Mazolinha cruzou, Maurício subiu com astúcia e acabou a greve. Todos, sem exceções, fomos felizes para sempre: não faltaram tricolores e cruzmaltinos em interrupção temporária de suas paixões originais, só para um brinde ao gol de cabeça, contra o inimigo da Gávea. Zico, previdente, deixou o campo antes.

Tentaram, um dia, acabar com o Botafogo, assim como tentaram também contra o Fluminense, o Vasco e até mesmo o beneficiado Flamengo. Ainda tentam. Não há segundas divisões capazes de apequená-los, por mais que isto seja o desejo de boa parte da platéia da Paulicéia.

O futebol carioca iria acabar em 2002, com a conquista do Americano; o Flu não deixou. Acabaria ano passado, com o Volta Redonda, Tricolor brecou de novo. Agora? Madureira seria o símbolo da decadência? Será? Claro que não.

Eis o Botafogo campeão, vigoroso e merecido que não nos deixa mentir.

Faltando no pôster a sensacional meia cinza, que tomem providências futuras.

O grito do nome de time que melhor ecoa no Mário Filho, pela sonoridade, é o de Vaaaaaaacccccô; quando o jogo pega fogo, no estádio cheio, é a torcida do Flamengo que faz incendiar. Beleza de cores e mulheres lindas, grito mais vibrante, é Fluminense. Agora, ninguém canta o hino de forma mais bonita e incessante do que a turba do Electro, aquela dos tempos da Dona Chiquitota.

É uma procissão estática, só de vozes. Um retrato em branco e preto.

No campo, Carlos Roberto, que foi cracão no gramado e agora bisa títulos como treinador. Eu o vi no final da carreira, vestiu o mando tricolor. Cracão? Sim. E porque não foi da seleção? Simples. Outrora, o que não faltava nas pelejas eram cracões, muita gente para apenas vinte vagas.

Garrincha, Didi e Gerson, não há mais. Amarildo? Não. Mendonça deixando Júnior sentado? Perivaldo acertando o cruzamento no ângulo? Paulo César Caju? Nada disso.

Contudo, senhores, o Botafogo aí está vivíssimo.

A cidade cobre-se com as cores da saudável e moderna nostalgia.

O alvinegro é o que há!

Parabéns devidos, pois.
Paulo Roberto Andel - 10/04/2006

Caros amigos,

Esta é uma nova eletrotribuna para a manifestação literária do futebol carioca.

Pretendemos reviver Nelson Rodrigues e saudar Marcos Caetano, aplaudir Achilles Chirol, bradar por João Saldanha, muito mais. O Tricolor, o alvinegro, o scretch da Gávea, o esquadrão de São Januário, mais os mulatinhos rosados, os rubros, todos!

Os cronistas que desejarem postar seus textos aqui devem enviá-los para os seguintes e-mails: jocemar@ceg.com.br ou pauloandel@sinduscon-rio.com.br

Participem conosco

Obrigado pela colaboração e pela visita

Paulo Roberto Ândel
Jocemar de Souza Barros