Monday, March 21, 2011

FLUMINENSE 0 X 2 BOAVISTA (19/03/2011)


Um desastre pontual (21/03/2011)

Nesta tarde de segunda-feira, após sete dias ininterruptos de crise, o Fluminense anunciou o nome de Gilson Kleina para o cargo de técnico interino até se que finalize a novela Abel. É difícil dizer o que esperar num momento como esse, até porque estamos a dois dias de uma batalha decisiva na história das Laranjeiras: o jogo contra os mexicanos do América no Engenhão, onde não há alternativa que não seja a vitória, seja como for. Hoje, somos mais do mesmo: vamos para um jogo complicadíssimo depois de uma das piores atuações do Fluminense em anos, que foi a de sábado na derrota para o Boavista por dois gols a zero, talvez só comparável aos momentos terríveis de 2008 e 2009, felizmente superados. E é justamente por conta desta derrota que trago comigo a esperança previsível a qualquer torcedor Tricolor: não temos condições de jogar tão mal duas partidas seguidas. Só podemos melhorar, mesmo que sob confusão.

Derrotas acontecem. Derrotas são parte componente do pacote de emoções chamado futebol. O problema é como determinadas derrotas acontecem. Depois de uma semana de baixarias nos noticiários, apimentadas pelos pontapés verbais de Muricy (muitas vezes acertando apenas o vento) e a confusão que reina na dirigência das Laranjeiras, era possível esperar por uma atuação de garra do grupo Tricolor numa partida que não significa muito do ponto de vista da colocação, mas muito em termos psicológicos: já tínhamos sete pontos, uma vitória magra nos daria ao menos a co-liderança de nossa chave no Rio e, se alguma derrota viesse a acontecer – o que se confirmou – não haveria um 11 de setembro em Álvaro Chaves por conta do campeonato estadual, mas o prejuízo ficaria todo para a decisão contra os mexicanos. Repito: a derrota acontece muitas vezes, algumas até injustamente (longe de ser o caso de anteontem), mas o que se torna inadmissível num jogo de futebol é a falta de comprometimento com a partida, o que me pareceu evidente em alguns (poucos) jogadores que atuaram contra o Boavista.

Os sete mil maníacos não falharam e emprestaram sua voz ao time, durante boa parte do jogo e principalmente no primeiro tempo, onde nosso único lance maior foi a linda matada no peito de Rafael Moura e a conclusão de primeira para a defesa do goleiro Thiago. O time do Fluminense não vinha tão mal no decorrer da primeira etapa, mas é certo que deveria ter modificações para a segunda – estávamos carentes de melhor finalização e a bola não parava em nosso ataque: ora Rafael tentava, mas sem êxito, ora Emerson era desarmado. Conca jogava regularmente, mas sem o grande brilho esperado. Mariano e Carlinhos erravam tudo o que era possível. Ruim com eles, pior sem um deles: o lateral-esquerdo saiu contundido e deu seu lugar a Julio César, o que garantiu a total ausência de velocidade e jogadas de linha de fundo. Antes disso, Euzébio também se machucou e deu lugar a Digão, que entrou com a disposição e a eficiência de sempre, sem nenhuma culpa pelo desastre que se verificaria a seguir. Marquinho também errava, mas com muita garra tentava atenuar o problema. E Berna, cada vez melhor, evitou ao menos dois gols do Boavista no primeiro tempo, o que não foi suficiente para evitar nossa derrota parcial tendo em vista a excelente cobrança de falta feita por Gustavo, acertando o ângulo esquerdo do nosso gol. No estádio, talvez irritado pela modorra Tricolor, cheguei a achar que Berna poderia ter feito a defesa; vendo com calma na televisão, descartei qualquer possibilidade de falha e ainda tive motivos para gargalhar, mesmo depois da tristeza pela derrota: o comentarista Ronaldo Castro afirmou que o excelente goleiro não fez a defesa porque tem baixa estatura. Berna tem quase um metro e noventa, mais precisamente um metro e oitenta e oito, apenas um centímetro a menos do que o goleiro preferido do comentarista – o Perseguido.

No segundo tempo, era esperada uma reação com garra, com vontade, ao menos para compensar a deficiência técnica do time. Não aconteceu. Fred entrou em campo no lugar de Rafael Moura (erradamente e talvez por decisão própria), mas nitidamente estava fora de forma, o que comprometeu sua atuação inclusive na perda de um gol feito, chutando por cima do travessão uma bola recebida quase na pequena área. Na defesa, Digão fazia o que podia, Diogo e Diguinho lutavam, mas o time não trocava três passes certos, não conseguia agredir o Boavista com convicção e dava todo espaço para contra-ataques, o que foi irritando parte da torcida presente que, com todo o direito, reclamou e vaiou. Entendo que o momento é de união e que vaias põem atrapalhar, mas não posso depor contra meu passado: vi times com craques como Ricardo e Edinho, Delei e Robertinho, Paulinho e Assis; todos esses em algum momento jogaram num time vaiado, mas souberam escrever as páginas da eternidade Tricolor em campo. Eles puderam receber as vaias, qualquer um também pode. O jogador que não estiver preparado para pressão e cobranças não pode jogar em clubes de massa como o Fluminense. Ao que me lembre, de todos os que foram pontualmente vaiados, só discordaria do nome de Marquinho que, se não conseguiu produzir quase nada com qualidade, ao menos lutou muito se comparado com a lentidão e a mediocridade de outros. Outra parte da torcida também exerceu o seu direito de gritar e, ao seu entendimento, incentivar o time, o que me pareceu inócuo diante da péssima performance em campo que parte do time mostrava sem conseguir uma tabela sequer. Emerson, que não acertou três passes durante a partida, levantou os braços para pedir gritos. Entendo e respeito, só que sou de um tempo onde o jogador não precisava pedir apoio à torcida: com garra e técnica em campo, ela responde à altura. Em tempo: se não tivéssemos vaiado as más performances de Cavalieri, ele teria continuado como titular e, talvez, o Fluminense só tivesse um único ponto na Libertadores, estando eliminado previamente. O hoje goleiro reserva tem qualidades, só que vinha de longa reserva e não deveria ter estreado naquele momento; hoje, chega a ser até inacreditável alguém contestar a titularidade de Berna. Reitero, Tricolores, a hora é de união e apoio, mas o time precisa dar em campo a sua contrapartida muito superior à apresentada neste jogo contra o Boavista, que deu números finais à noite com uma jogada curiosa, que começou com um corta-luz do árbitro... até a bola chegar a Tony, livre, que fuzilou o canto esquerdo de Berna, com a bola ainda roçando a trave antes de entrar. Os sete mil maníacos emudeceram; em seguida, alguns vociferaram e outros incentivaram. É preciso respeitar as diferenças. Não havia como reagir em campo sem acertar três passes. No mais, cabe o agradecimento a Ronaldo Torres por não ter se furtado a ajudar em momento tão delicado, mesmo que fora da sua função profissional específica. No fim, ainda poderia ser pior: levamos uma bola na trave direita.

Depois de manhã o Fluminense tem a reprise de mais um dos milhares de capítulos em sua centenária história: precisa desesperadamente vencer um rival e lutar contra as próprias limitações. Com uma dirigência vacilante, interesses extra-campo que afetam o futebol, ainda sem o técnico definitivo (Kleina é um paliativo), desfalcado de três titulares (Euzébio, Carlinhos e Diogo, este por não ter sido inscrito na Libertadores) e com o desânimo de parte de sua imensa torcida, o Fluminense parte para mais um confronto épico. Eu sempre acredito e, por isso, já testemunhei momentos incríveis desta legendária camisa que prima por jamais desistir antes do último minuto. O momento é de união nas arquibancadas e de contrapartida dos jogadores em campo: quem puder, ofereça jogadas geniais e gols; quem não puder, traga raça e disposição. Os ratos abandonaram o navio Tricolor, mas este segue firme em sua permanente sede de conquistas. Limpemos o convés.


Paulo-Roberto Andel

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