Thursday, July 20, 2006

A contra-virada

Amigos, é natural que nós, Tricolores com a letra inicial maiúscula justificadamente, tenhamos irritação pelo que aconteceu no jogo de hoje, contra o Grêmio.

Tivemos a vitória na mão e a perdemos por desatenção; dois gols no apagar das luzes, ambos provenientes de perdas de bola no meio de campo, ambos com os finalizadores gremistas à vontade. Fizemos quatro gols no Olímpico Monumental, façanha raríssima para qualquer time brasileiro. Tomamos outros, paciência.

A fidalguia Tricolor, tão praticada pela história e hoje em dia tão bem ressaltada pelo texto de Marcos Caetano, deve entrar em campo e contar a verdadeira história da partida.

Primeiramente, não foi um jogo espetacular como querem fazer crer alguns dos que ocupam espaços da mídia esportiva. Foi sim, um jogo corrido, disputado. Beleza artística não, apenas em certos momentos. Os seis gols no terço final do match ajudam a maquiar tudo. Sim, o gol é a redenção, a independência sem morte; ao gol, tudo é permitido, tudo fica menor diante. Houve grandes gols sim, mas falaremos disso mais à frente.

Volto ao jogo, que não foi divino, do Olimpo. Uma partida até divertida de se acompanhar pela movimentação. Os gremistas tiveram o primeiro tampo na mão; dentro da escala pouco acima da mediocridade, estiveram muito melhor do que nós. Eu não me reconhecia; o Fluminense não se reconhecia lá: era um amontoado, sem atacar, sem organizar, apenas recebendo a esquadrilha sulista de três cores tal como um boxeador em derrota, mas não por nocaute – perdendo pontos, tomando mais e mais jabs.

Quando menos se esperava, imediatamente após termos sofrido o segundo gol gremista, num contra-ataque arrebatador e que poderia ter sacramentado a derrota, eis que tivemos um resquício de reação. Na falha do goleiro gaúcho e o posterior rebote, no meio da confusão, a bola pererecou e entrou. E então, vejam vocês, o futebol é cheio de surpresas e nuances, detalhes e especificações, como se fosse uma mulher charmosa e misteriosa: tudo mudou, significativamente.

Petkovic, nosso craque, que não tem mostrado o melhor de seu talento este ano, tinha falhado clamorosamente no passe que resultou no segundo gol gremista. De repente, fez de tudo: passou, driblou e conseguiu o que almejava há tempos com a camisa sagrada das Laranjeiras – o gol olímpico. Há os que dizem ter havido carga sobre o goleiro, outros defenderam a falha entusiasticamente. Tudo, como já disse, fica muito pequeno diante da grandeza, da magnitude de um gol olímpico – assim, Petkovic foi aos céus. Recuperou-se? No mínimo, deu sinais de que tem lenha para queimar. Um gol definitivo.

Diante da reação inesperada e fantasticamente consagrada no segundo gol, o que poderíamos esperar? Uma virada tsunânica, avassaladora, típica dos cem anos Tricolores, daquelas com as quais estamos mais do que acostumados, é nossa sina. E veio, fulminante, com um peixinho do garoto Marcelo, lateral-esquerdo que passou a flanar no meio-campo durante o decorrer da partida, em conseqüência das substituições. O lateral, jogando no meio, fazendo um gol de cabeça como se fosse um artilheiro maior, um gênio da grande área.

O terço final do jogo reservou as melhores emoções, que os outros dois nem puderam rascunhar. Depois de dois golaços, veio mais um, esfuziante, do mesmo Petkovic, num chute poderoso de duzentas jardas, fazendo com que o goleiro esticasse-se todo em busca do nada, da bola já devidamente endereçada.

Em menos de meia hora, o time outrora esgarçado e esbaforido tinha feições de uma invencível armada. Numa virada fabulosa, restou aos torcedores do Grêmio - senhor do jogo na primeira etapa sem, no entanto, traduzir a superioridade técnica em resultado – a saída das arquibancadas, desistindo do dia, com sofreguidão.

Outra vez, quando menos se esperava, fomos desatentos, não detalhistas, afobados. E entregamos uma vitória que, por boa parte do jogo, não nos caberia. Contudo, já que a mesma se desenhou em nossos marejados olhos, porque não aproveitá-la, saboreá-la? Poderíamos. Deveríamos. Não fizemos, pois.

O jogo não foi tudo o que falaram, creio. Valeu mais pelo finzinho e pela intensidade de emoções.

Porém, a menor parte do tempo da partida nos serve de bom presságio.

Não tivemos nada de fenomenal em nossa atuação pelo conjunto da obra. Todavia, o pequeno solo liderado por Petkovic, em dia de inferno e céu, trouxe-nos ventos de esperança. O campeonato ainda está longe, muito longe. Há muito que fazer e construir.

O pequeno terço de jogo, contudo, nos serviu da prova de que somos capazes, de que podemos galgar posições e que, se soubermos trabalhar na construção, tijolo após tijolo, todos delicadamente cimentados, não será a maior das surpresas caso tenhamos ao final do ano uma bela casa, com uma bela sala, capaz de abrigar o desejado troféu.


Paulo Roberto Andel – 17/07/06

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