Wednesday, September 15, 2010

SOBRE HOJE À NOITE (15/09/2010)



O futebol não permite descanso, ainda mais para um líder de campeonato brasileiro que, definitivamente, tem jogado com irregularidade nas últimas partidas, embora tenha perdido jogos recentes muito mais por falhas individuais do que coletivas. No entanto, nunca é demais lembrar que um time não se torna líder de qualquer campeonato por acaso, exceto nas primeiras rodadas – e hoje, o campeonato alcança a vigésima-segunda rodada. Nunca é demais lembrar que este líder é o Fluminense, talvez o time mais acostumado a vencer jogos e conquistar campeonatos sob a descrença dos amantes do futebol brasileiro – com exceção dos milhões de apaixonados torcedores das Laranjeiras, dentre os quais me encontro. E também a descrença dos homens de imprensa: alguns, por conta dos compromissos profissionais; outros, porque misturam a mesma imprensa com a paixão clubística – e aí é um problema, principalmente no Rio de Janeiro. Afinal, todos os grandes times da cidade já perderam títulos históricos para o Tricolor, ainda mais nos últimos minutos das decisões, quando já alisavam os troféus – principalmente o “time oficial da imprensa”.

Para os leigos, os que vivenciam o futebol apenas pelos jornais de cinqüenta centavos ou os que somente lêem os textos dos cronistas fraudulentos, o Fluminense é um não-favorito, um figurante, o time que joga injustamente a primeira divisão, um rebaixado – isso, como se regulamentos mirabolantes não tivessem beneficiado em algum momento todos os grandes clubes brasileiros em horas de martírio. Mas isso é somente para os leigos e os mal-intencionados: quem conhece de futebol brasileiro sabe muito bem o que ele se tornou por causa do Fluminense e o que talvez pudesse ter sido – ou melhor, NÃO ter sido sem ele. A nossa história é recheada de conquistas tidas como impossíveis apenas para os borra-botas, com seus sorrisos pascácios, alheios à realidade que reza o respeito ao fundador do futebol no Brasil – não apenas por data, já que Ponte Preta e Rio Grande nasceram um pouco antes, mas pelo mérito, pelos feitos, pela trajetória. A nossa história foi construída com o descaso de rádios, jornais e, posteriormente, televisões. Contudo, a nosso favor, uma única voz e um texto inigualável: Nelson Rodrigues – assim, tínhamos toda a imprensa nos oferecendo descaso, mas o maior cronista do futebol brasileiro em todos os tempos vestido com as nossas cores. E Nelson nos deixou mais cedo do que o justo: a literatura esportiva do Brasil merecia seus textos sobre os tricampeões dos anos oitenta, o colossal título de 1995, o terrível – mas curto – momento dos rebaixamentos, sim, junto à gloriosa volta por cima: mais uma vez, só os pascácios acreditam que não venceríamos os grupos alternativos na Copa João Havelange de 2000; basta ver a campanha. Dali em diante, o Tricolor centenário e campeão em 2002, as disputas de títulos brasileiros quando chegamos perto em 2001, 2002, 2005, 2007 e agora, mais do que nunca, em 2010. A apoteose e a tristeza na final da Libertadores, que um dia será recompensada. A inesquecível virada do ano passado, calando e humilhando a todos os que malversaram o Tricolor. As letras de Nelson seriam nosso escudo contra a empáfia e a soberba; ele pode não estar aqui fisicamente, mas é certo que seu espírito norteia qualquer Tricolor.

Enquanto Nelson bradava com sua voz rouca e seu texto maravilhoso, boa parte da mídia desdenhava o Fluminense e ganhávamos títulos, conquistávamos vitórias e respeito. Tem sido sempre assim. Procurem nos jornais de 1941: ninguém elegia o Fluminense favorito, exceto Nelson, mas fomos campeões na Gávea. Procurem por 1946: a mesma coisa. O supercampeão foi o Fluminense. Se quiserem mexer nos velhos arquivos dos jornais, o Fluminense não era favorito nos textos nem no primeiro Fla-Flu de 1912, que vencemos pelo emblemático três a dois que tantas vezes se repetiu e nos deu troféus inesquecíveis. Na era moderna, o campeão de 1951 que, no ano seguinte, venceu o Mundial de Clubes e resgatou o futebol brasileiro da tragédia de 1950, era tratado como o “timinho” de Zezé Moreira. Quanta insensatez! A máquina montada por Parreira em 1984 também não teve o menor crédito jornalístico. O que dizer de 1995, quando estávamos a nove pontos do grande campeão da imprensa, chegamos à última partida com apenas um de desvantagem e ganhamos o maior título de todos os tempos? Sempre foi assim, meus amigos, sempre! A cada nova rodada, apontam um novo campeão: primeiro, o Ceará; depois, o Corinthians; agora, Botafogo e Cruzeiro.

A partida do turno, com nosso time ainda não azeitado, foi vencida pelos corinthianos num dois a um apertado, onde pressionamos o tempo todo, perdemos vários gols e ainda fomos vítimas de uma calamitosa arbitragem.

Dezenove rodadas depois, a situação é outra. Antes de entrarmos em campo, o atual favoritíssimo Botafogo – para Juca Kfouri, time dotado de uma alma vitoriosa, naturalmente excetuando-se os vinte e um anos compreendidos entre 1968 e 1989 – poderá não ter vencido o Goiás, que luta contra o rebaixamento e tem dado sinais de melhora. O cogitadíssimo Cruzeiro também terá jogado contra o humilde – mas perigoso – Guarani. E se não vencer?

No horário nobre, mais uma daquelas batalhas que já são rotina na vida do torcedor Tricolor. Além de lutar em campo, é preciso lutar contra a campanha massiva das manchetes, narrações e comentários. É certo que não querem o Fluminense campeão. Sabemos que o Corinthians contra com toda a simpatia da CBF, afora ter um bom time, claro – e também já contar com a vitória antecipada contra o Vasco, em São Januário, na partida que lhe foi docemente adiada pelas comemorações do centenário do escrete paulista, o que me parece no mínimo uma sonora bobagem. E é certo que passamos por um mau momento: alguns sinais de lentidão em campo; o desajuste nas funções de Conca e Deco, sem interseção; Fred do lado de fora e perto de confusões; o manto sagrado de Castilho vazio debaixo das traves. Mas quem disse que o Fluminense nasceu para não lutar contra as intempéries? Já são cem anos e uma centena de títulos dessa maneira. Não há porque mudar agora. Os galhofeiros podem ficar engasgados sim.

Os nossos farão um mar de cores no Engenhão na noite de hoje. E quem tem a nossa torcida nunca é derrotado de véspera. Quem venceu títulos como nós já vencemos nunca pode ser tratado como coadjuvante. Mais uma vez, são todos contra uma centenária camisa que insiste em colocar água no chope dos jornalistas e matemáticos.

Em suma: confio numa esmagadora vitória do Tricolor hoje. E mesmo que ela não venha, nada irá abalar nossa luta por esse título. Aguardem os próximos capítulos.


Paulo-Roberto Andel

Tuesday, September 14, 2010

ATLÉTICO GO 2 X 1 FLUMINENSE (11/09/2010)


Onze de setembro (12/09/2010)

É certo que o campeonato brasileiro é muito disputado, principalmente na era dos pontos corridos. Com exceção da primeira edição em 2003, quando o Cruzeiro disparou qualitativamente falando, em todos os outros anos os campeões tiveram oscilações em algum momento. Parece que chegou a vez do Fluminense: depois do mau resultado contra o Guarani, em Campinas, e da vitória oscilante contra o Ceará, eis que o líder voltou a campo contra o Atlético Goianiense no Serra Dourada. E perdeu. Nada que justificasse a euforia da imprensa de rapina, já decretando o Botafogo como grande campeão, além do Cruzeiro: o Fluminense ainda é o líder e terá um jogo dificílimo pela frente contra o Corinthians, quarta-feira que vem, num abarrotado Engenhão. Mas o fato é que perdemos. E, mais uma vez, embora tenhamos feito um bom primeiro tempo, chutado bolas na trave, criando excelentes jogadas, perdemos em função de erros individuais: o primeiro e o segundo gols aconteceram, para variar, em falhas notórias do Perseguido – no primeiro; um gol servindo como ducha de água fria para nosso time, que dominava o jogo e teve que recomeçar do zero; no segundo, crucial por já ser nos acréscimos de tempo, impossibilitando qualquer reação. Ainda há tempo para a recuperação, sem sombra de dúvida, mas uma inevitável pergunta ecoa nos quatro cantos das Laranjeiras: será possível que sejamos campeões brasileiros sem um goleiro?

No jogo de ontem, estava claro que o Atlético não ia ser canja de galinha; luta contra o rebaixamento, tem alguns bons jogadores e um excelente treinador – o nosso René Simões. Contudo, o Fluminense fez uma primeira meia hora muito boa, com jogadas lindas de Deco e Conca, sendo que muito antes dos vinte e dois minutos, quando Washington tocou para o gol após lindo passe do argentino e o início maravilhoso de Deco, já éramos predominantes na partida – uma jogada de placa. O jogo estava a nosso favor e todos esperávamos um resultado expressivo que obrigasse os jornais a não defenestrarem o Tricolor. Éramos ataque e fazíamos blitz na defesa goianiense; porém, na primeira bola que chegou ao ataque dos mandantes, pela esquerda, o jogador William recebeu a bola e chutou sem o menor esforço para empatar, dado que a saída de gol do Perseguido em sua insistente vontade de fechar o ângulo de chute com os pés é, no mínimo, humorística. Repito: quando a defesa falha, é o caso normal do goleiro brilhar. Em nosso time, quando a defesa falha, o gol é certo porque é impossível para qualquer goleiro defender – ou rebater - um chute na diagonal estando praticamente encontrado na trave mais próxima ao chutador. O empate não esfriou o ímpeto do nosso time, mas outras barreiras apareceram à frente; além dos chutes na trave feitos por Washington (em linda cobraça de falta) e Gum, o bom goleiro Márcio fez mais uma grande partida neste campeonato. Os atleticanos podem dizer: “Nós temos um goleiro”. Nós, Tricolores, não. Quero deixar claro que minhas palavras não querem crucificar ninguém, mas somente testemunhar um fato evidente, que já se repetiu em outros anos e surge novamente agora, quando queremos brigar pelo título brasileiro. E temos outros problemas: nosso time é muito experiente, mas, por conta disso, também perde em velocidade, dado o grande número de jogadores em campo com mais de trinta anos – não há nenhum preconceito nisso, desde que jovens peças de reposição ofereçam velocidade ao Fluminense no segundo tempo. E ainda o caso das outras partidas: apesar de Conca e Deco fazerem lindas jogadas, de plástica inquestionável, ambos embolam o espaço outrora ocupado por Mariano – e ali, pela ala direita, foram criadas as principais jogadas que levaram o Fluminense à liderança do campeonato, as mais velozes, as demolidoras. É preciso ainda achar a formação ideal com os craques, os experientes, mas também sem tirar a força velocista da equipe. Com Julio César fazendo a meia, a velocidade era ainda mais escassa.

No segundo tempo, orientado por seu decano treinador, o Atlético percebeu a perda de força física do Fluminense e paulatinamente passou a protagonista do jogo: um susto, outro susto, outro susto. Ficou no lá e cá: precisávamos também dos dois pontos, ainda mais sabendo que era o momento de reconstruir a vantagem na tabela – o vice Corinthians perdia no Pacaembu para o Grêmio. E nosso time sentiu o cansaço cada vez mais, embora sem desistir da vitória. A quinze minutos do fim, um mau presságio: o zagueiro atleticano Gilson foi expulso; como todos sabem, há um estranho – e desconfortável - desencanto nas Laranjeiras que torna difíceis todas as partidas onde nossos adversários têm desvantagem numérica de jogadores. De toda forma, fomos guerreiros como sempre, tentando a vitória. Carlinhos chutou duas vezes, não conseguiu.

Com a derrota do Corinthians, nosso empate era magro, mas não tão desastroso: quatro pontos à frente de um adversário são sempre uma boa pedida. E o jogo já se encaminhava em igualdade para o fim quando, mais uma vez, a miscelânea de erros que é hospedada debaixo das traves do Fluminense deu o ar da sua graça: uma bola vadia lançada para a direita do ataque; o Perseguido finge que vai, mas não vai; o jogador do Atlético em cima da linha de fundo e com dois marcadores no cangote, consegue cruzar; a finalização de Juninho é um pouco fraca, quica, mas é o suficiente para bater o único obstáculo diante dos sete metros de gol: um braço reto, esticado para cima, cujo dono estatelado no chão me lembrou os quadrinhos do Recruta Zero, quando este apanhava do Sargento Tainha e aparecia feito uma massa disforme no chão. O Atlético, que foi valente, soube suportar a pressão e não desistiu do jogo até o fim, mereceu a vitória. Nós, que jogamos bem e perdemos gols, mas tempos nosso gol praticamente vazio, merecemos perder.

O Corinthians perdeu no Pacaembu, mas não soubemos fazer nossa parte. Botafogo e Cruzeiro venceram seus jogos e chegaram perto do topo. Continuamos na ponta, mas nosso time está vacilante. À frente, três meses de decisões a cada três dias, a enorme simpatia da CBF pelo mais-querido de São Paulo, a imprensa galhofeira com seus neocandidatos ao título. Mais do que tudo isso, precisamos recuperar nosso bom futebol, acertar as posições dos craques, dar alforria a Mariano para que voe pela direita e, principalmente, ganhar para as Laranjeiras um título como nunca se viu antes em nossa história: uma taça imponente sem um goleiro que esteja de acordo com a centenária tradição iniciada por Marcos Carneiro de Mendonça – não por acaso o primeiro goleiro da história da seleção brasileira. É um desafio e tanto, como nunca tivemos. Alguém falará da Copa do Brasil de 2007 e eu lembrarei: também ganhamos aquele título sem goleiro; a diferença é que, sem detrimento dos participantes daquela competição, eles tinham bem menos pujança econômioca e técnica do que os atuais times deste campeonato brasileiro.

Um menino comentou na Internet para meu amigo Leo que Félix e Paulo Victor eram os Fernandos Henriques de antigamente. Prometo falar disso na próxima crônica, onde espero estar bem menos infeliz com os erros primários de nosso camisa 1.


Paulo-Roberto Andel

Friday, September 10, 2010

FLUMINENSE 3 X 1 CEARÁ (08/09/2010)



Sobre oscilações (09/09/2010)


Uma desagradável derrota. Uma vitória praticamente tranqüila. A defintiva perda do mando de campo. A fúria da imprensa golpista. Uma crise desnecessária e a demissão do médico. Meus amigos, esta foi a recente semana do Fluminense, a mais conturbada desde que começou o campeonato brasileiro. Ao fim da rodada, a constatação: somos os líderes, mais líderes do que éramos no domingo passado, mas ainda com contas a ajustar, alguns problemas e necessidade de soluções que não comprometam a equipe Tricolor.

Começamos mal. A derrota para o Guarani aconteceu de forma indigesta. Foi evidente que mostramos um mau futebol, mesmo quando abrimos o marcador com o gol de Emerson, escorando passe de cabeça dado por Washington. Marcamos cedo, mas antes disso o Guarani já ocupava nosso campo, embora sem a menor objetividade nas conclusões. A seguir, mesmo com Conca e Deco errando bastante, até mesmo Mariano sem a força que se espera dele no ataque, o Fluminense teve uma ou duas chances de aumentar a vantagem, até que houve uma falta e... bem, não quero parecer aos mais jovens como um velhote ranzinza, mas vocês, eles e todos já sabem de outras crônicas o que penso sobre uma falta perigosa contra o Fluminense: absoluto risco de gol, devido à falta de capacitação técnica do rapaz que hoje veste a camisa que já pertenceu a Marcos Carneiro de Mendonça, Batatais, Castilho, Félix, Renato, Wendel, Paulo Victor – todos estes, goleiros de seleção brasileira. O canto direito baixo é sempre uma pedida de gol, referência, mas pode ser no meio do gol ou mesmo num toque sutil por cima da barreira, sem força. É o que bastaria. Foi o que bastou. O veterano Baiano empatou a peleja e fez o Guarani crescer, embora timidamente.

Quem tem um treinador como Muricy espera sempre o melhor de um intervalo, a mudança principalmente num dia de pouca inspiração. Mas não aconteceu: o Fluminense voltou mal, muito mal. Abusava dos passes errados, da falta de velocidade, esbarrava nitidamente em si mesmo e nem de longe lembrava o líder do campeonato. Conca e Deco não mostravam o brilho de outras temporadas. Washington tratava a bola como se fosse um boxeur. O Sheik saíra contundido. Com tudo isso, nós acreditávamos na perspectiva de um empate, frustrante na campanha como um todo, mas importante diante das circunstâncias negativas daquele domingo. O Guarani quase não chutava, embora alugasse nossa intermediária. Num time que tem uma má jornada, a defesa e o meio de campo titubeiam; nessas horas, quem tem que aparecer é o goleiro. Então veio uma falta e outro veterano se apresentou: o engraçado e razoável zagueiro Fabão. Sempre é difícil para qualquer goleiro quando, numa cobrança de falta contra si, a sua barreira abre e a bola passa por ela, desde que chutada com violência, o que quase impossibilita a defesa. A bola de Fabão seguiu exatamente este roteiro, com uma exceção: não foi chutada com enorme força e ainda ficou mais minguada quando foi amortecida pelo meio da nossa barreira. Quicou e, se tivéssemos um goleiro à altura das tradições das Laranjeiras, bastaria um passo para a esquerda, o encaixe no peito e a reposição. Como não temos, a bola ganhou o canto esquerdo, mansa, o Guarani venceu o jogo e todo o Brasil assistiu aos patéticos gestos tresloucados do Perseguido, saracoteando em protesto como se a barreira fosse a grande vilã do jogo, mas na verdade praticando uma pantomina que tirasse a atenção de si. Não adiantou. Os nossos fanáticos que estavam atrás do gol, na arquibancada, souberam vaia-lo com dignidade. Assim, o Fluminense perdeu a partida, teve quebrada a sua sequência de invencibilidade no campeonato e, para delírio dos fogueteiros da imprensa, lhes forneceu amplo material para chacotas e dúvidas sobre a real capacidade do líder Tricolor. Uma verdadeira festa setembrina nos impressos. Parece que nunca aprendem a lição, feito ano passado, quando decretaram o Fluminense morto e tiveram que oferecer as gargantas a uma poderosa espinha. Até o decano Kfouri, sem esconder sua paixão corinthiana, renovou seus votos de que o Fluminense não será campeão. Coitado. Uma hora, o Inter; noutra hora, o Cruzeiro; noutra, o Corinthians. São todos bons times, mas o líder é o Fluminense. E os corinthianos estão se sentindo como se fossem a própria Gávea: já contam com os três pontos da partida adiada na semana do aniversário alvinegro, como se fosse canja de galinha derrotar o Vasco em São Januário.

Com o espírito de dúvida, voltamos a campo contra o Ceará, ontem, no Engenhão, no já folclórico horário das dezenove e trinta, que fez do bonito estádio uma consagração de seu apelido: “Vazião”. Cinco mil lordes e damas ocuparam o João Havelange e, sob certo desconforto por causa do bombadeio da imprensa, cerraram os olhos com desconfiança quando o Fluminense entrou em campo. Felizmente, um ledo engano de todos nós: foi o primeiro tempo mais fácil de todo o campeonato até agora. Três a zero que poderiam ter sido seis ou sete, tamanho o número de oportunidades que perdemos. Washington marcou dois e perdeu três. Mariano na frente da área, perdeu um gol incrível. O Ceará batia cabeça e, a quinhentos quilômetros do Engenhão – mais precisamente em São Paulo e Curitiba, os mais-queridos da CBF viviam o mal-estar: o Parque São Jorge precisaria vencer de qualquer maneira para encostar no Tricolor. Reitero: vencemos com absoluta soberania o primeiro tempo e colocamos um pé e meio nos três pontos da noite. E foi isso que prejudicou o segundo tempo: o Fluminense decaiu completamente em termos de velocidade e ofensividade. Novos rounds de Washington com a bola. A rigor, destaques firmes ficaram por conta de Mariano, sempre ele com sua raça e dedicação incessantes, o argentino Conca, com algumas maravilhosas jogadas e grande participação nos gols e lances de perigo, além da nossa defesa, mais precisamente Leandro e André. Timidamente, aos poucos o Ceará, animado com as mexidas em seu time, tentou atacar mais – melhor, tentou atacar, o que não tinha feito na primeira etapa. Perdemos um gol, dois gols, três gols e tudo num dia em que poderíamos aproveitar para ampliar o importante saldo, que pode ser decisivo no futuro. Quando a partida chegou a quinze minutos do fim, aí as coisas complicaram. O Ceará criou alguns lances e tudo levava a crer que, por saídas confusas, socos na bola mal-dados e o pé onde deveria estar a mão constituíam indícios de que não sairíamos sem sermos vazados. Uma bolinha marota, outra e outra. No contra-ataque, Marquinhos e Carlinhos montaram uma forte blitz ofensiva; mais ainda: Marquinhos salvou um gol feito do Ceará, tirando a bola em cima da linha com o goleiro evidentemente batido no lance, como reza a tradição. A torcida não perdoou e, a cada mau lance do Perseguido, gritava como se fosse um gol. Infelizmente, as suspeitas se confirmaram e, ao fim do jogo, o veterano Geraldo entrou na área e, diante de um goleiro que não sabe sair do gol, apenas tocou com fraqueza no meio da meta. Foi o suficiente para que apupos aumentassem, não pela atuação do time como um todo – afinal, o segundo tempo lento foi conseqüência da boa primeira etapa, mas sabemos que um líder precisa impor a sua força, ainda mais jogando em um novo campo como será daqui por diante. Era importante pontuar; conseguimos. O poderoso e beneficiado (mais uma vez) Corinthians não venceu no Paraná; então, continuamos mais do que líderes.

Quando ares de tranqüilidade pareciam soprar na Pinheiro Machado, a torcida do Fluminense se depara com uma entrevista de Fred, acusando o Departamento Médico do clube de prejudicá-lo, ao lhe conceder uma alta precipitada para a volta aos campos. Uma confusão típica de um clube que tem uma história e torcida lindas, que é um paradigma dos melhores momentos do futebol brasileiro, mas que hoje é dotado de uma administração confusa mesmo que mostre resultados no gramado. Doutor Simoni, o chefe do Departamento, pediu demissão e mostrou enorme contrariedade com o artilheiro. Foi dada a senha para mais achincalhe do Fluminense nos jornais. Não havia o que escrever sobre a vitória fácil de quarta, então apelaram. Kfouri, radiante, já decretou o fracasso do Fluminense e a taça para a Toca da Raposa. Ao lado da adminstração Tricolor, do goleiro Perseguido e de boa parte da imprensa esportiva, é mais um que não aprende – e vejam que o ano passado se constituiu em uma verdadeira fábrica de besteiras contra as Laranjeiras. Torço para que os problemas internos sejam mantidos em ambiente fechado.

Não estamos no melhor momento de nosso futebol. Existem problemas. Mas onde estão aqueles que escreviam “se o campeonato acabasse hoje...”? Sumiram? Pois bem, meus amigos, se o campeonato acabasse hoje, mesmo com todos os problemas, o campeão do Brasil teria o seguinte nome: Fluminense Football Club.

Ainda é muito cedo para alijarem a centenária e definitiva camisa Tricolor do pódio. Nosso paragoleiro é uma caricatura. Nosso atacante que faz gols também os perde. Nosso craque maior se destempera diante do microfone.

Mas ainda é muito cedo.

Muito cedo.

Somos o time do último minuto.

Os anos de 1976, 1983, 1995 e 2005 aí estão para respaldarem a história, não a falácia.


Paulo-Roberto Andel

Friday, September 03, 2010

FLUMINENSE 1 X 1 PALMEIRAS (01/09/2010)


O castigo (02/09/2010)

Não foram poucas vezes em que o Fluminense conquistou grandes vitórias e títulos com gols marcados no fim das partidas – no circuito carioca, por exemplo, o Tricolor já ganhou campeonatos desse jeito contra as outras três grandes equipes da cidade, como se viu em 1971, 1976 e 1983. E muito dessa história foi escrito na beleza do Maracanã imortal, que mais uma vez cerrará portas para um até-breve. Ontem nos despedimos do estádio, para o qual só voltaremos em 2013. Foi de um gosto amargo: levamos o gol de empate nos últimos segundos do jogo. O Fluminense não foi bem como em outros jogos, principalmente no segundo tempo, mas a punição foi severa demais, ainda que a culpa tenha sido nossa pelo jeito com que o time se posicionou, ainda mais no fim do jogo. Menos mal que ainda somos os primeiros do campeonato – e assim terminaremos, independentemente do que venha a acontecer domingo. Não importa que o Corinthians tenha um jogo a menos; será contra o Vasco, em São Januário e isso quer dizer sonora dificuldade. A nós, cabe fazer a nossa parte, a nossa cartilha. Não foi assim ontem, embora a ótima fase atual do Tricolor nos permita até lamentar quando empatamos contra uma grande equipe. Não fizemos o dever de casa, jogamos mal principalmente no segundo tempo, Muricy não mexeu como se esperava e, ao fim da partida, a cereja envenenada do bolo.

É estranho ver o Maracanã sem as tradicionais cadeiras, quase tão estranho quanto ainda é vê-lo sem a querida e folclórica geral. Passa uma impressão desconfortável, creio. Lugares vazios, dez da noite, ao menos havia a promessa de uma boa partida para se guardar na memória, até que possamos voltar ao velho estádio. Vinte mil Tricolores sonhavam com uma grande jornada na noite de ontem, e não se pode dizer que começamos mal. O Fluminense fez as vezes de mandante do jogo e se lançou ao ataque, ocupando ostensivamente a intermediária palmeirense mas sem ameaçar categoricamente o pentacampeão Marcos. Uma ou outra vez o Palmeiras também atacava, mas a finalização era deficiente e o pouco que foi ao gol teve a participação estrambótica do nosso “camisa 1”. Do nosso lado, a maravilha de se ver mais jogadas plásticas de Deco: um drible, um passe, um giro inesperado de quem tem categoria de sobra. Se cabe uma contraposição ao futebol luso-brasileiro, ela esteve mais do que visível na atuação de Washington: o Coração Valente abusou dos erros e divergências com a bola, item maior do espetáculo, além de insistir em buscar jogo para tabelar – o que tem enorme dificuldade. Até mesmo em nosso gol, o artilheiro mostrou conflito com a pelota: perdeu um gol incrível, a bola foi rebatida, Conca chutou para o gol; então, Emerson amorteceu e fuzilou Marcos, abrindo o placar e proporcionando certa calma para o difícil restante da partida. Sim, todos sabemos que Washington é um jogador brioso, que pode ter utilidade e que faz gols. Não há dúvidas a respeito. Mas também não se questiona que, quando se recuperar de contusão e voltar a campo, Fred será o titular absoluto ao lado do Sheik.

O jogo prosseguiu sem alterações no decorrer do primeiro tempo, exceto pelo fato de que o Fluminense acelerava cada vez menos e cadenciava o jogo muito precocemente; por outro lado, o Palmeiras não saía muito de sua defesa, o que dificultava contra-ataques. Um momento positivo aconteceu por conta de um revés: Diogo se machucou e Belletti entrou em campo, sob alguns apupos; em seguida, o pentacampeão fez duas boas jogadas, com dribles, mostrando que ainda pode ser muito útil ao elenco das Laranjeiras. Ao fim do primeiro tempo, Emerson ainda deu um perigoso chute rente à trave de Marcos. Um a zero foi pouco pelo perigo que esse placar representa, mas justo em relação ao tamanho do jogo. E os erros que tínhamos cometidos ali iriam ser corrigidos por Muricy; ao menos era o que se esperava.

Não deu muito certo.

Na volta, quem tomou as rédeas do ataque foi o time paulista; sem agredir nos contra-ataques, o Fluminense ficou todo recuado e levando a pressão no volume de jogo, embora os lances muito perigosos não tivessem rondado o gol do Perseguido. Valdívia chutou longe. Marcos Assunção chutou perto, mas sem sucesso. Em certo momento, não pela nossa torcida, mas pelo desempenho em campo, um desavisado na televisão poderia imaginar que o Fluminense era o time visitante, não mandante, de tanto que havia se poupado em seu próprio campo, agarrado ao placar mínimo favorável. E, de tanto ficar atrás, nosso time perdeu a vocação do gol; teve chances de fazer o segundo tento, que liquidaria o assunto, mas não conseguiu. E o tropeço de Muricy: demorou a substituir jogadores e, quando o fez, colocou de forma certa o zagueiro André Luis – apenas tirou o errado, Emerson que, mesmo cansado, ainda conseguia impor algum susto na defesa esmeraldina. O Maracanã inteiro apostou que o substituído ia ser Washington, mas não foi assim. Aí, o Fluminense abdicou de vez de alguma técnica no ataque e passou os dez minutos finais encolhido, tentando garantir a vitória. Nos acréscimos do árbitro ainda houve tempo para Leandro Euzébio ser justamente expulso.

E então, meus amigos, o time das vitórias no último minuto se viu castigado por sua própria sina. Quando ninguém mais esperava nada do jogo, o Palmeiras acertou um chute perto, dois chutes perto. Nada aconteceu. A bola derradeira foi um balão de Tinga vindo da intermediária para o lado direito da nossa defesa; alcançou o voltante Edinho que, por pouco, não vestiu nossa camisa e ele cabeceou para a diagonal – estava exatamente no local onde Euzébio cobriria se não tivesse sido expulso. Ewerthon ficou livre, dominou como quis e tocou na não-saída do Perseguido (leia-se por não-saída apenas pular na frente de outro jogador, deixando o gol livríssimo para o tento). A cereja envenenada do bolo.

O momento é de buscar calma e realinhar as coisas. Não há motivo para alarde. Somos os líderes e, aos bravateiros de plantão que nos acusam de três empates em casa, nunca é demais lembrar que foram contra três grandes equipes e, em dois destes jogos, tivemos que correr boa parte do tempo em busca de empatar um marcador – os bravateiros eram os mesmos que diziam ser Deco um enganador e que bom mesmo eram Val Baiano e Crisbó. Mas merecíamos uma despedida melhor do Maracanã. Fred vai voltar e o time melhorará. Emerson vai recuperar a forma. Deco estará mais entrosado. O problema é saber se em determinadas partidas, jogando sem centroavante e sem goleiro, conseguiremos marcar pontos que nos mantenham na posição atual. Muricy vai buscar as respostas. Uma coisa é certa: não é pecado barrar nenhum jogador que esteja em más condições técnicas. Ou que sequer as tenha.


Paulo-Roberto Andel

Tuesday, August 31, 2010

FLUMINENSE 2 X 2 S. PAULO (29/08/2010)

Entre o quase e o óbvio (31/08/2010)

Caros amigos, a vida segue e o Fluminense continua líder do campeonato brasileiro, após o empate de domingo no Maracanã. É fato que a nossa distância em pontos para o segundo colocado e os demais reduziu consideravelmente; contudo, para ser campeão numa competição de pontos corridos, às vezes nem é necessário ter ponto algum à frente do vice. Continuamos na ponta e, de toda forma, não é nenhum desastre empatar com o hexacampeão São Paulo em Mário Filho, ainda mais com a estrela de seu craque-símbolo reluzindo em campo, o inquestionável goleiro Rogério Ceni. Falando em goleiro, se pesarmos tudo o que aconteceu no domingo, podemos dizer que até ganhamos um ponto em vez de perdermos dois. Afinal, por mais que Belletti não estivesse bem em campo e até comprometesse a atuação da equipe, ou ainda que Washington tenha efetuado uma cobrança de pênalti sofrível contra o craque Ceni, a grande verdade é que o Fluminense desceu derrotado na primeira etapa por duas falhas crassas, absolutas e até patéticas do profissional que hoje ocupa a posição de arqueiro Tricolor: Fernando. Assim posto, o trabalho de recuperar o resultado contra um time forte, tricampeão brasileiro nos pontos corridos e que precisava de um bom resultado por conta da atual fase, foi triplicado. Ainda assim, quase viramos a partida, vide Washington; a vitória nos escapou num dia em que tudo deu quase errado, afora cenas óbvias já repetidas muitas e muitas vezes debaixo das nossas traves. Menos mal que, num bom momento, até as partes ruins ficam em segundo plano. O empate não foi uma tragédia, mas o desastre está nas circunstâncias em como ele aconteceu. O Fluminense está de pé, vivo e atuante, líder e senhor de si, mas é preciso muito cuidado, pois somente agora chegamos à metade do campeonato.

Foi um Maracanã de pouco público, diante da multidão que se interessa pelo Fluminense. A redução da carga de ingressos, a confusão com o fechamento das cadeiras azuis e a expectativa do posterior fechamento do Maracanã, até agora sob dúvida, contribuíram decisivamente para a não lotação do estádio, ainda que mais uma bela festa fosse vista nas arquibancadas. Mais incrível ainda foi o “planejamento” feito pelas autoridades em alocar a torcida são-paulina, com cerca de trezentas pessoas, num espaço das arquibancadas amarelas onde caberia oito vezes mais gente e, para culminar, impedindo o trânsito dos Tricolores no corredor. Não seria mais razoável e racional colocar os visitantes numa pequena parte das arquibancadas verdes à direita da tribuna do estádio? Assim, todo o resto permitiria a livre circulação dos nossos torcedores. Basta raciocinar. Ou “colar” o que se fazia nos anos 70.

O primeiro tempo não foi o nosso forte. Primeiro, sentimos as faltas de Emerson e Gum, como se já não bastasse Fred; segundo, não foi uma tarde feliz de Belletti e o time acabou tendo uma distribuição confusa em campo. Terceiro, porque a equipe paulista tem qualidade, não está numa posição na tabela condizente com seu elenco e precisava reagir. O quarto motivo fica para o final desta crônica. Ainda assim, toques geniais de Conca e Deco foram vistosos no gramado, e o luso-brasileiro marcou seu primeiro tento com a camisa Tricolor, após belo passe de Conca a linha de fundo e o cruzamento de Julio Cesar, que voltou a atuar bem. O gol logo no começo do jogo nos serviria para dar calma, até porque antes e depois dele o São Paulo foi um time de velocidade e ataque, nos pressionando severamente. Faltas surgiram com frequência na nossa intermediária e isso era uma preocupação. Ceni bateu uma com perigo e, pouco tempo depois, juntou sua perícia ao quarto motivo e empatou o jogo. Mal demos a saída, eles viraram o jogo com um verdadeiro donativo individual nosso e conseguiram a talvez até inesperada vantagem. Mais trabalho para Muricy do que o devido. O peso de ter que virar uma partida que estava à mão e foi entregue por grosseiros erros individuais.

Voltamos com Rodriguinho no ataque e a inevitável saída de Belletti. O time voltou com muita raça e inverteu os papéis: dono do ataque, contra um São Paulo recuadíssimo. Para piorar, o time do Morumbi tem um goleiro e ele se chama Rogério Ceni: com sua calma e sobriedade, sem pulos estrambóticos, cacoetes religiosos, ele fez várias defesas difíceis parecerem tranquilas (bem ao contrário do que temos sido obrigados a ver nos últimos anos nas Laranjeiras) e garantiu a paz temporária ao São Paulo, por quinze minutos. Até pode ter vacilado em nosso gol de empate, quando ameaçou dar um passo à frente e não foi para Leandro Euzébio cabecear no canto direito do goleiro; porém, o craque se redime: a seguir, com tranquilidade, pegou uma (péssima) cobrança de pênalti feita por Washington, e mostrou porque é o paradigma do goleiro brasileiro às vésperas de 40 anos de idade. Ainda houve vinte minutos para se tentar a virada, mas nosso time cansou, o São Paulo segurou firme e, no fim das contas, o empate foi justo pelo conjunto de produção das equipes.

O quarto motivo nasce nas arquibancadas amarelas à direita da tribuna, quando chega meu amigo Leo e comenta com humor: “Já tem um mês sem frangar, isso não é normal; podem se preparar para fortes emoções hoje...”. Alguns risos, a parcial contrariedade da nossa amiga Marô e veio o jogo. O comentário do Leo é que me fez escrever esta crônica somente hoje; queria não alimentar o texto com qualquer mágoa ou sentimentos ruins que não são da estirpe Tricolor. Porém, antes destas primeiras linhas, tive a oportunidade de ler nesta terça-feira as declarações de Fernando num jornal de grande circulação do Rio de Janeiro, onde disse o seguinte: “Contra fatos não há argumentos. Estou há dez anos no clube e já joguei 259 vezes. Fui o goleiro titular no título da Copa do Brasil em 2007, no vice-campeonato da Libertadores em 2008 e estou invicto desde que voltei. Essa perseguição tem que acabar”.

Eu vos pergunto: QUE PERSEGUIÇÃO?

Apesar de estar há dez anos no Fluminense e de sua propalada paixão de torcedor Tricolor, Fernando mostrou em suas declarações que conhece pouco das Laranjeiras. Primeiro, não sabe que para ser nosso ídolo de verdade, não basta torcer para o Fluminense ou apenas mostrar um grande futebol que ele mesmo não tem: é preciso ter humildade. Basta olhar o presente, com Darío Conca. Basta olhar o passado imediato, com Thiago Silva ou Marcão. Um pouco mais atrás, com Paulo Victor (a quem ele, Fernando, teve a audácia de desdenhar recentemente), Delei, o genial Romerito e o histórico Benedito de Assis. Não é preciso falar de Castilho, Altair, Denilson, Telê. Fernando também conhece pouco de estatística, embora tente usá-la a seu favor: dos dez goleiros menos vazados da história do clube, é batido na média por nove deles – só vence o craque Batatais porque este fez sua carreira entre os anos 30 e 40, quando os placares eram muitos mais elásticos do que hoje. E, se realmente quisesse usar a estatística como ferramenta para se livrar de perseguições, o resultado seria desastroso: é o goleiro que mais vezes foi vazado em partidas seguidas na história do clube. Sem contar que, destes dez anos, não foi titular em cinco deles – nos cinco restantes, em duas oportunidades, foi barrado por deficiência técnica com o time nas últimas posições dos campeonatos brasileiros de 2006 e 2009; por coincidência ou não, após a barração o time se salvou em ambas as competições. E quando voltou ao time como titular, foi por contusão do novo goleiro (como neste 2010) ou por decreto superior (como em 2007). Definitivamente, os apupos de metade do anel Tricolor das arquibancadas cheias não são à toa: quem freqüenta os estádios está acostumado o que vê, mas não resignado.

Aos fãs do paragoleiro, deixo claro que nada de pessoal tenho contra sua figura e inclusive reconheço que teve alguns bons momentos no gol do Fluminense - infelizmente todos foram entrecortados com falhas grosseiras e barração. Tenho simpatia pelo fato de que ele seja um Tricolor declarado e vibrante, mas isso não significa que, como torcedor e cronista, eu precise fazer papel de cego para não ver as evidências. Estes fãs é que talvez não entendam que eu e muitos outros Tricolores criticamos a questão TÉCNICA de Fernando, tão-somente - afora uma ou outra bobagem, como questionar a trajetória vitoriosa de Paulo Victor no arco Tricolor.

Fernando se sente perseguido porque convive com vaias há muitos anos: contudo, todas foram originadas de falhas capitais suas. Algumas foram até esquecidas pela torcida, como a cometida contra o Boca Juniors em nossa antológica vitória por três a um em 2008, ou o incrível gol contra feito com as mãos contra o São Caetano em 2006. Fernando se sente perseguido porque uma considerável parte da torcida do Fluminense não o vê como ídolo e sequer como merecedor de ser titular de uma camisa que já foi vestida por Marcos Carneiro de Mendonça, Batatais, Castilho, Félix, Wendel, Paulo Victor. O mais incrível é que seus defensores muitas vezes o isentam de culpa em falhas e derrotas simplesmente por “ser Tricolor”. Eu vos pergunto: Emerson, nosso Sheik, é um declarado rubron-negro; por “não ser Tricolor”, deveria ser preterido do time? O mesmo vale para Fred, Conca e Deco. Ora, bolas, o que importa é o respeito profissional à camisa e, principalmente, a preparação durante os treinos para que os desastres não aconteçam nos jogos – e o senhor Fernando, com suas repetidas trapalhadas já conhecidas de boa parte da lucidez Tricolor, evidentemente tem deficiências de fundamentos na posição de goleiro: note-se as equivocadas saídas de gol que costuma cometer, afora a enorme dificuldade em se posicionar e defender qualquer cobrança de falta adversária que vá na direção do nosso gol. A partida contra o São Paulo foi apenas o mais do mesmo, a velha repetição dos mesmos erros. Em suma, o óbvio.

A função do goleiro é atuar justamente quando o time sofre dificuldades; o meio de campo não está bem e, por isso, não neutraliza os ataques adversários; a defesa não colabora, enfim, vários outros motivos.

O que se espera de Fernando com a camisa do Fluminense não tem a ver com berros apaixonados, deslumbramentos, frases vazias de baixo impacto ou a miopia diante de seus próprios – e inúmeros – erros. Basta que mostre dentro de campo o que ainda não fez em metade de sua carreira: alta qualidade técnica. Humildade para reconhecer que Paulo Victor, Félix e Castilho, afora outros tantos, não se tornaram herois da meta Tricolor à toa – fizeram e muito por merecer; não eram apenas torcedores no gol, mas sim craques do maior quilate.

Acima, muito acima, de Fernando, está o Fluminense. E ele volta a campo para uma duríssima batalha contra o Palmeiras de Scolari amanhã, no que pode ser a última jornada no Maracanã por um longo tempo. Nas condições atuais, mesmo na frente, a vitória é fundamental para nossas pretensões. Vencer ou vencer, com ou sem um bom batedor de pênaltis, com ou sem um goleiro à altura das tradições do clube - que fala demais e joga bem menos do que pensa. Quem espera sempre alcança - mas com humildade e trabalho.

Paulo-Roberto Andel

Friday, August 27, 2010

GOIÁS 0 X 3 FLUMINENSE (25/08/2010)



Mais um algoz à lona (26/08/2010)

Quando um grande time encontra-se em grande fase, todos os percalços normalmente lembrados no mundo do futebol ficam por terra: jogadores que estão no banco conseguem suprir a ausência dos titulares, torcedores pés-frios que povoam as arquibancadas não conseguem exercer nenhuma carga negativa; o adversário pode ser forte e agressivo que, num estalo, tudo dá certo e vem um grande triunfo. Este último exemplo foi o caso de ontem, na grandiosa vitória do Fluminense sobre o Goiás em pleno Serra Dourada, por três a zero. Primeiro porque, tal como no jogo anterior contra São Januário, o esmeraldino das centrais é uma carne-de-pescoço para o Tricolor em qualquer situação; segundo, porque precisava desesperadamente da vitória e jogava em casa, onde costuma apresentar boas performances; terceiro, porque a essa altura da competição, são todos contra a nossa camisa, de modo que cada jogo é um desafio ainda maior em se manter no topo da tabela. Mas tudo deu certo: mesmo numa partida em que o time não foi permanentemente brilhante, os bons momentos foram muito mais numerosos do que os maus agouros. O talento do craque reluziu com vigor. Pouco resta aos famigerados editores de esportes para esconder o óbvio ululante à vista menos apurada que seja: o Fluminense é um dos reais candidatos ao título de campeão brasileiro e, se mantiver a pegada atual, é o grande favorito. Reitero: ninguém resiste ao talento de um craque!

Não me venham com bravatas de que o Fluminense não é mais o mesmo, que perdeu velocidade e que não é tão ameaçador quanto em outras partidas. Hoje escalado com jogadores experientes, o que se vê é um time preparado para dar o bote mortífero quando é o momento certo. Foi o que aconteceu. Ainda assim, buscamos o gol logo de saída, lembrando que, independentemente da fase em que se encontra hoje, o Goiás é sempre um adversário temível em seus domínios, afora o fato de contar com experimentados ex-Tricolores como Wellington Monteiro (carinhosamente apelidado por nossa amiga Marô de “Gordinho 5” nos tempo em que era nosso defensor), o quase folclórico Rafael “He-Man” Moura e o veloz Everton Santos, mais jogadores conhecidos como Jonilson, Júnior e Amaral. Começamos bem, mas, aos poucos, era normal que o time da casa buscasse resultado. O Goiás fez isso sem o sucesso esperado, felizmente. E não pecamos pela passividade: um dos lances mais perigosos ao fim da primeira etapa foi justamente nosso, com a cabeçada à queima-roupa de Diogo e a grande intervenção do veterano goleiro Harley. E o outro, com Gum perdendo o gol, chutando livre em cima de Tolói. Não foi uma primeira etapa de moleza, mas sim um jogo equilibrado, com alternativas e muito corrido debaixo da baixíssima umidade goiana. Foi bom para o Fluminense o empate neste tempo, como poderia ter sido em todo o jogo. Felizmente, excelentes surpresas estavam reservadas para os nossos corações, valentes como o de Washington.

Na volta ao campo, nem o “tranqüilo” Muricy (bem-humorada força de expressão) nem o tenso Leão mexeram em suas equipes, e o que se viu nos primeiros minutos foi uma retomada do que havia sido jogado antes: os times estudando o melhor momento para o grande golpe, os goleiros sem nenhuma intervenção relevante e o tempo correndo. Talvez alguém tivesse pensado que o jogo terminaria num empate sem gols, razoável para o Fluminense e péssimo para o Goiás. Talvez. A realidade desfraldou outros fatos.

Falei noutras linhas desta crônica e não cansarei de repetir: ninguém resiste ao talento de um craque. O craque rompe barreiras, desafia paradigmas, cria soluções geniais onde os olhos da obviedade não alcançam o horizonte. Se um desavisado soubesse do placar no intervalo, ficasse ausente e só o pesquisasse ao final do jogo, o que lhe viria primeiramente à cabeça para imaginar que o zero a zero se tornou um três a zero retumbante? Simples: o craque.

Deco não vinha de um bom ano: rendeu pouco nos últimos momentos com o poderoso Chelsea e pouco jogou na Copa da África do Sul. Se tivesse vindo para outro time, mais querido aos olhos da imprensa, certamente seria recebido como um mito: craque em Portugal, Espanha e Inglaterra; dotado de fundamentos como chute, passe e drible precisos, cairia como uma luva em novas manchetes. Mas a imprensa não gosta do Fluminense líder, menos ainda de que o Tricolor fosse capaz de trazer um reforço internacional, um craque além-mar e além-fronteiras. Diziam que era uma enganação, jogador de passagem. Como seria possível? Só os rancorosos e ressentidos com as glórias das Laranjeiras, isentos de esportividade, acreditariam em tal bobagem. O luso-brasileiro jogou seus vinte minutos contra o Vasco e mostrou seu talento em três ou quatro lances de fazer o Maracanã tremer. Ontem não foi diferente. Na tabela com o também craque – cracaço – Conca, Deco chega la lateral da área. Os desavisados pensariam se tratar de um cruzamento para o Coração Valente. Não foi o caso: era um passe, um passe precioso, digno, belo em sua trajetória de curva que tirou toda a defesa verde do lance. Washington pode não ser do trato com a pelota, mas sabe reconhecer um lindo passe a ponto de convertê-lo em gol. E foi mais um dos lindos gols do Fluminense nessa maravilhosa trajetória recente: chute forte, fuzilando Harley, um a zero. O Goiás acusou o golpe. O tento cheirava a mais uma vitória, a quinta fora de casa. O jogo estaria decidido? Quase.

Não se desafia o craque. Deco ainda queria mais. O toque de primeira para nosso cão de guarda, Mariano. O toque para Emerson, livre, marcar o segundo gol. Com dois a zero, aí sim os goianos reconheceram a derrota. Não é fácil virar um jogo contra o líder do campeonato em tais circunstâncias.

Ainda haveria o golpe final, com a entrada de Marquinho. O meia-lateral, muitas vezes contestado, mas bastante útil em outras, recebeu um primoroso passe do jovem Bob (que prima pela regularidade quando é chamado a jogo). Livre, diante de Harley, tocou rasteiro no canto esquerdo e, nos acréscimos, sacramentou o resultado final. Mais um de nossos algozes tradicionais ao nocaute.

Trinta e seis pontos a três jogos do fim do primeiro turno. Uma coisa é certa: entre muitos soluços e engasgos, o Fluminense cada vez mais mostra a sua força neste ano.


Paulo-Roberto Andel

Wednesday, August 25, 2010

VASCO 2 X 2 FLUMINENSE (22/08/2010)



Para deixar saudades (23/08/2010)

Eram cinco minutos do segundo tempo da partida de ontem, e a imensa massa vascaína explodia como nunca: a Colina acabara de fazer, mais uma vez, o papel de algoz contra o nosso time. Uma virada estrondosa. Pensei nos velhos e novos tempos: o Vasco está sempre no nosso caminho. O adversário mais difícil de ser batido por nós. E pensei: ainda é cedo. Afinal, começamos o jogo dando as cartas com o emocionante gol do zagueiro Gum; depois, eles empataram com Éder Luis em falha da nossa defesa esquerda. Eles viraram, mas ainda era cedo, cedo como foram muitas outras emoções. E com o time do ai-jesus, o time do último minuto, o atual líder do campeonato brasileiro, não se pode brincar. Dez minutos depois da virada vascaína, tudo ficaria igual de novo, e assim seria até o apito derradeiro, mesmo com grandes oportunidades para ambos os lados. Um dos melhores clássicos dos últimos anos, disputado a cada fio de cabelo, que terminou justamente empatado. Uma digna despedida das apoteóticas - e lotadíssimas - cadeiras azuis do Maracanã em seu último jogo, já que serão extintas para a nova configuração dos assentos do estádio. E deixarão saudade, muita saudade, como um dia já deixou a eterna geral.

Quem esteve ontem no Maracanã viu uma festa linda. Um espetáculo de cores e alegria nas arquibancadas e por todo o estádio. A beleza do mosaico Tricolor feito com balões de gás dava um contraste ao preto-e-branco vascaíno. Melhor ainda que os times tenham entrado em campo com seus uniformes clássicos, tradicionais. Em campo, nós lutávamos pela consolidação da liderança e o Vasco pela proximidade ao G4. Eram oitenta mil pessoas, mas meus olhos fatigados viam cento e dez mil, como nos meus tempos de criança. E uma coisa é certa: de lá para cá, o Vasco sempre foi carne-de-pescoço. Mesmo quando fomos superiores e vencemos títulos contra eles, nada foi fácil. E de vinte anos para cá, São Januário é uma espinha atravessada na garganta das Laranjeiras, sem descer com litros d’água. Mesmo em muitas partidas mais recentes, quando pareciam em situações desfavoráveis, ao menos nos impuseram o empate – isso quando não venceram, como no desespero do fim de 2008. É deles que nos vem o verdadeiro ai-jesus.

Quero falar do começo do jogo. O Fluminense entrou com a verdadeira obsessão pela vitória e quase marcou no primeiro – e lindo – chute do argentino Conca, perto do ângulo direito de Prass. Logo depois, o gol no escanteio pela direita do ataque, a cobrança curvada de Conca, o rebote e o chute de Gum, fazendo explodir a multidão Tricolor. O líder começou jogando como líder. O Vasco sentiu o golpe por alguns minutos, mas, time grande que é, a seguir voltou com o implacável senso de marcação e uma correria alucinante. A partida parecia uma corrida de Fórmula 1. Os ataques tinham alguma supremacia sobre as defesas, mas as finalizações não alcançavam o objetivo. Aos poucos, surgiu um problema para nós: recuamos o time mais do que o devido, o que fez com que o Vasco se sentisse mais à vontade para agredir. Entretanto, o gol saiu justamente em outra situação, num contra-ataque; Carlos Alberto, o melhor homem em campo e jogando com exagerada liberdade, fez ótimo passe para a direita do ataque. Apesar de nossos três zagueiros, a defesa estava desguarnecida. Éder Luis entrou livre e deslocou Fernando. Tudo igual no placar, mas o vazio entre nossa defesa e ataque era preocupante, afora a esforçada – mas inócua – tentativa de Washington voltar ao meio de campo para brigar com a bola (acabava brigando com a bola). O Vasco cresceu ainda mais nos instantes finais, mas não o suficiente para a virada. O segundo tempo prometia, ainda mais com Deco no banco de reservas, pronto para jogar.

Nossa expectativa era a de Muricy acertar o time, baqueado após o gol sofrido. Contudo, mal começou o segundo tempo, o velho Carlos Alberto, com seu velho corte e passe de pé direito, dividiu uma bola com Diguinho de pé-murcho – o pior momento da partida, antes de sair contundido -, ganhou e encontrou o lateral Fagner livre outra vez; o trio de zaga estava desatento mais uma vez e o Vasco comemorou a virada com ânsia. Seria mais um dos castigos que o Vasco imporia a nós? Não, definitivamente não. O Fluminense deste semestre é o time de Muricy, é o time que não se entrega e faz do gol seu próprio oxigênio. Era preciso mudar, e todos esperavam Deco em campo; além do inegável talento, sua entrada contribuiria para diminuir o ímpeto ofensivo dos vascaínos. Antes disso, o pecado capital: não se pode dormir num clássico. Diguinho fez isso e fomos punidos com a virada. Houve uma bola na direita do ataque e Felipe sairia jogando; ele se distraiu e perdeu para Emerson. O Sheik rapidamente cruzou para a área. Zé Roberto, em vez de despachar a bola, quis dominá-la; perdeu o tempo, Julio César a tomou com surpreendente velocidade, frente à pequena área, e fuzilou Prass. Era o empate. Nada estava perdido, ainda que a vitória tão desejada não viesse.

Os quinze minutos do fim de jogo reservaram fortes emoções. Finalizações perigosíssimas para ambos os ataques e, a nosso favor, a entrada triunfal de Deco. O luso-brasileiro não está em plena forma, mas rapidamente mostrou seu arsenal de jogadas: passes perfeitos, uma jogada em que deixou dois marcadores no chão e a chegada avassaladora como atacante, num chutaço pelo alto que, se tivesse pegado o rumo certo, Prass nem teria se mexido. Para fechar o jogo, como se fosse um castigo a ser repetido, novamente Carlos Alberto pela direita, novamente a defesa perdida e um chute perigoso que saiu rente à trave direita do nosso goleiro. A justiça foi feita. No belo espetáculo de ontem ninguém merecia perder. Para as estatísticas, mais uma pedrinha vascaína em nosso sapato. Desta vez, leve.

Falta pouco para terminar o primeiro turno. Precisamos manter o ritmo incessante. Agora, começa a seqüência de partidas quarta e domingo. Não há tempo para respirar. O empate fez com que nossa vantagem sobre o segundo colocado caísse para dois pontos, fazendo o delírio das aratacas de plantão. Se conseguirmos manter essa vantagem durante todo o difícil segundo turno, seremos campeões. É o que importa, é o imperativo: manter a vantagem. E mesmo que não seja assim e que, em alguma rodada, sejamos superados por outro time, não há por que se desesperar. O importante é estar brigando nas últimas rodadas. É sempre bom lembrar que este time ainda sente a falta de Fred. Quando o matador voltar e tabelar com Deco e Conca, será bem difícil manter a calma de qualquer defesa adversária.

Pela frente, dois times bastante difíceis, independentemente da colocação: Goiás, no Serra Dourada, e São Paulo no apertado Maracanã. Nossa prova de fogo. É uma semana de afirmação. Enquanto isso, lembro das cadeiras e da geral. A saudade é inevitável.

Paulo-Roberto Andel

Wednesday, August 18, 2010

FLUMINENSE 3 X 0 INTERNACIONAL (15/08/2010)


Mais alegria (16/08/2010)

Por volta de duas e meia da tarde de ontem, eu me preparava para sair de casa rumo ao Maracanã monumental. O telefone tocou:

- Cara, é derrota certa, o Bruno super pé-frio vai ao jogo com o pai.

Agradeci a ligação. Era o amigo Zé Freire, o pé-frio mais temido por toda a Gávea. Ali se fez a senha para uma grande vitória. Nada pode ser mais confortante para um Tricolor do que a tentativa de mau-agouro promovida por um flamenguista.

O entorno de Mário Filho lembrava o de uma grande decisão de campeonato. Talvez fosse; em competições de pontos corridos, todo jogo tem importância. Carros e mais carros a perder de vista no viaduto Oduvaldo Cozzi e na avenida Radial Oeste. Homens, mulheres e crianças com a obsessão de ver o Fluminense em campo, o líder do Brasil defendendo a cabeça da tabela. A beleza estampada nas cores, nas faces e nos tecidos. Não há como contestar: o Tricolor voltou e, tal como reza a tradição, com trajes de gala. Sessenta mil apaixonados e mais um lindo mosaico em branco da paz, celebrando os maravilhosos títulos brasileiros de 1970 e 1984. É importante também falar da presença de Deco: o craque luso-brasileiro, que seria por demais decantado caso viesse da Europa para outro time, foi um amuleto prévio em campo, já desfilando com nosso manto. Sim, amigos: o Fluminense de ontem e hoje, mais líder do que nunca, sofre o desfalque de ninguém menos do que Fred, mais a recuperação de Belletti e a preparação de Deco. É fácil perceber que temos um de nossos elencos mais fortes dos últimos tempos; o que se espera agora é o equilíbrio e o bom-senso entre o clube, o patrocinador e as outras forças componentes do Fluminense para que sejamos bem-sucedidos. Disputar uma vaga na Libertadores é uma realidade. O título é um sonho ainda distante, que precisa ser concretizado a cada passo, com total segurança. Distante, porém possível.

Um ano passa rápido, num estalar de dedos. Não há como esquecer 2009. O jogo daquele dia teve um sabor amargo. Éramos o desespero em três cores centenárias: a vitória era vital para a sobrevivência na primeira divisão, onde éramos mais do que os últimos – primordialmente, o alvo das chacotas. Na tarde de calor infernal, abrimos o placar com Gum, eles viraram e, no fim, um outro gol salvador de Gum, jogando feito artilheiro, nos deu um mísero ponto que foi a nossa redenção ao fim daquele certame. Eram trinta mil pessoas apaixonadas acreditando na virada; a partir dali, viraram quarenta, cinqüenta, sessenta mil e, um ano depois, a nossa luta não é mais para escapar do abominável descenso, mas sim de manter vivo o sonho de um título tão esperado. Somos os primeiros; a grande vitória de ontem ratificou esta posição.

Não me venham com a falácia mofada de que o Internacional entrou em campo com um time de reservas. Renan, Sorondo, Fabiano Eller, Tinga, Andrezinho e Rafael Sobis são meio time de um dos melhores elencos do país – o virtual campeão brasileiro na visão sempre certeira (sic) de Kfouri. Foram a campo com seriedade, mesmo com o time já com a cabeça na final da Libertadores e no esquema 3-6-1, que dificulta qualquer time mandante. O jogo foi muito equilibrado, ao menos em seu começo. Quando podia, o Inter atacava e preocupava. Mas o Fluminense de hoje é mortífero, não se pode bobear. Dois ataques em torno dos vinte minutos e dois gols. O primeiro, feito a meu ver pelo jogador mais importante em campo, Mariano. Conca é o craque, é quem a bola procura, é quem dá as cartas e combate com absoluta garra Argentina; contudo, o símbolo do Fluminense de hoje está nas arrancadas de Mariano pela lateral-direita – ora cruza com maestria, ora dá um corte para dentro e chuta. Não podia haver união maior: o lateral invadiu pela direita, executou o corte e chutou. A bola acabou sendo interceptada e amortecida por Conca, que estava no caminho, só que tomou o canto direito e bateu Renan. No segundo, o escanteio fornecido pelo nosso Fabiano Eller, campeão de 2005. Na direita do ataque, a cobrança perfeita do argentino - craque da partida, sem dúvida – e a cabeçada de Washington no ângulo esquerdo de Renan. Reitero: Conca enche os olhos de qualquer um com seu majestoso futebol, mas é nas arrancadas de Mariano que se vê a vontade de um time que pode ser campeão. Nos minutos restantes, metade da primeira etapa, o Fluminense continuou a pressionar o Inter, quase marcando mais um gol pelo menos; do nosso lado, uma defesa mais circense do goleiro do que propriamente difícil, e o Fluminense desceu tranqüilo para o vestiário.

No segundo tempo, o mesmo panorama do primeiro: absoluto equilíbrio de forças até que o Inter vacilou, Emerson entrou com o vigor tradicional pela direita e fuzilou Renan por entre as pernas, fazendo o terceiro gol do Fluminense e a completa alegria dos nossos sessenta mil torcedores. A partir de então, com os gaúchos conformados e os Tricolores satisfeitíssimos, o jogo passou a ser de toque de bola sem grandes ameaças aos goleiros, uma ou outra no máximo. Vibração ensurdecedora nas arquibancadas foi a que anunciou os gols do Avaí, que batia o Corinthians e nos permitia aumentar a vantagem na tabela para quatro pontos de vantagem. Nova vibração ao fim da partida: os milhares se abraçando ao comemorar a volta do Tricolor, mais líder do que nunca. Definitivamente, 2010 é bem diferente de seu antecessor.

Muitas e muitas vezes, nós vimos projeções dos matemáticos e estatísticos a respeito dos times e suas chances de rebaixamento. Ninguém tocou um pio sobre a liderança do Fluminense, até porque ainda é muito cedo para qualquer definição. Mas eu lembro que começamos o campeonato sob clima de total descrédito e hoje somos os maiores pontuadores. Ainda temos muitos jogos pela frente. As próximas rodadas permitirão dizer o que vem pela frente: Palmeiras, São Paulo, Vasco, Guarani. Uma coisa é certa: ninguém nos tira do grupo de favoritos ao certame deste ano, queiram ou não. Nesta semana, muito trabalho para enfrentar um dos mais temíveis adversários: a Colina. O Maracanã será pequeno, os corações estarão acelerados. Porém, só de saber que temos a opção de reaproveitar o talento de Fred ou estrear o de Deco, os ventos que sopram nas Laranjeiras não podem ser outros que não os de otimismo. Ainda falta muita coisa, mas ser campeão brasileiro de 2010 é, inegavelmente, um pouco menos difícil do que impedir o descenso em 2009. Nós conseguimos. O céu é o limite. No próximo domingo, mais um passo importante.

No fim da noite de ontem, refestelado no conforto de meu lar, eis que o telefone tocou. Era Ursula, depois era o amigo Bolinha. O camarada Zé não telefonou outra vez. A Gávea está silenciosa.


Paulo-Roberto Andel

Friday, August 13, 2010

GRÊMIO 1 X 2 FLUMINENSE (08/08/2010)


A alegria continua (09/08/2010)

Se comemorações antecipadas, títulos pré-datados e manchetes caudalosas nos diários esportivos não fazem parte da rotina de um cidadão Tricolor – o que é fato -, a cada dia que passa os milhões de apaixonados pelo orgulho das Laranjeiras têm mais motivos para comemorar. Vejamos: após um começo de campeonato tíbio, pouco depois da eliminação na Copa do Brasil pelo Grêmio, nestes últimos três meses o Fluminense tem sido uma máquina de ganhar. Chegamos a um terço do campeonato e, no rol de vitórias que nos firmam na liderança, já estavam marcados os triunfos contra o Santos na Vila Belmiro, o Atlético Mineiro no Mineirão e o Avaí na Ressacada; independentemente de suas condições na tabela atual, times que dificilmente são batidos em casa. Agora, o Tricolor fez mais uma vítima: o mesmo Grêmio que nos ceifou em maio. Vencemos com autoridade, competência e mantivemos a ponta.

As leituras para o jogo de ontem podem oscilar conforme a visão de cada um; certo mesmo é que se não jogamos de forma tão maravilhosa a ponto de convencer os críticos, inegavelmente merecemos os três pontos por mais que o Grêmio tenha tentado uma reação. Primeiro, porque o Fluminense foi avassalador entre os dez e os vinte minutos do primeiro tempo, fazendo dois a zero e não dando tempo aos gaúchos de respirarem; segundo, porque no segundo tempo soube agüentar bem a pressão gremista com um homem a menos em campo, de forma que quando tomou o gol, as favas estavam contadas. Ainda falta muito para qualquer comemoração, mas o principal diferencial a favor do Fluminense é sabermos que, se este ritmo for mantido com sucesso nos próximos quatro meses, não sairemos do cobiçado G-4 e teremos fortes possibilidades de recuperar um título que não vencemos há vinte e seis anos, mas que já esteve muito próximo de nossas mãos várias vezes. Claro, os homens de imprensa suam frio ao pensar nisso; preferem falar do champagne, dos descensos, do que pode ser feito para tripudiar do Fluminense em vão. Eu vos digo: ainda é muito cedo, mas hoje ninguém merece mais este título do que o Fluminense. Ficamos a um triz das semifinais de 1986, com os São Paulo nos vencendo a vinte minutos do fim do jogo; em 1988, ficamos aí sim nas semifinais contra o Bahia; em 1991, contra o Bragantino; em 1995, contra o Santos. Depois do pesadelo e da ressurreição, as semifinais de 2001, 2002, o quinto lugar de 2005, o quarto lugar de 2007. Em vinte e cinco anos, por oito vezes estivemos à porta da esperança, uma excelente média de boa colocação a cada três anos. Como então o Fluminense pode ser tido como um azarão, um timinho? Só os alucinados acreditariam que não somos capazes. Os mesmos bocós que previram a nossa queda ano passado; depois do vexame, alguns ficaram dias sem sequer saírem de casa.

O Fluminense de Muricy é vigoroso, é valente. Sabe administrar a posse de bola e ser mortífero quando preciso. Não importa a situação: quem abre dois a zero no Grêmio em vinte minutos no Olímpico e segura a vantagem até quase o fim do jogo, com um jogador a menos em campo? Falemos da realidade: os jornais não escalam supercraques fictícios em nosso time titular o elenco, mas esta é uma grande fase. E tal como terminamos o ano passado, depois daquela que foi a maior virada do futebol brasileiro em campo, em todos os tempos, neste ano de 2010 o Fluminense tem pontuação de campeão: vinte e nove pontos em treze jogos. Mantendo a performance, chegará ao fim do campeonato com quase noventa. Oxalá!

O momento atual é tão glorioso que até nosso goleiro, acostumado a lances exóticos, tem se portado bem. Fez duas grandes defesas no primeiro tempo, cruciais: com o gol, o Grêmio, que viria com toda a força na segunda etapa, cresceria e nos faria até correr risco de derrota. Mas não foi o que aconteceu: antes dos perigos, o Deus Mariano da Raça já tinha marcado seu tento, em cobrança de falta pela esquerda no canto esquerdo do arqueiro Marcelo. E Emerson é implacável: o arranque, a passada e o chute: quase sem ângulo, driblou Marcelo e rolou para o gol vazio. Descemos para o vestiário com grande vantagem e total confiança.

Que não sejam só mesquinhos aqueles que só viram o Grêmio como poderoso no segundo tempo. Eles atacaram, e o que poderia se esperar? Um dos maiores clubes do mundo, com altíssimo aproveitamento de pontos em casa, perdendo de dois a zero e precisando reagir para superar um mau momento. Evidentemente, buscariam o ataque. Foi o que fizeram nos primeiros quinze minutos do segundo tempo. Mas o Fluminense não tinha mais seus jogadores em pele, osso e músculos, mas sim de brita: uma barreira intransponível. Nem mesmo quando perdemos o ótimo menino Bob, expulso num lance onde Souza deveria ter sido também advertido, a situação mudou. O Fluminense tomou gosto pela vitória e a quis com todas as forças. E quando o time está bem, até jogadores que pareciam apagados surgem em campo e mantêm a pegada: por exemplo, como o outrora inseguro Williams, no lugar do argentino Conca. Emerson machucou o pé, Rodriguinho entrou, mas ficou pouco tempo, por conta da perda de Bob; veio o Marquinho velho de guerra e equilibrou as ações.

O Grêmio, forte e merecedor, fez seu gol ao final. Era tarde. Não havia como virar. O Fluminense era senhor do tempo e dos louros. O pouco que restava na ampulheta serviu para mais uma última emoção, quando Washington chutou a bola na trave ao fim da partida e poderia ter aumentado o placar.

O que dizer do Fluminense hoje, meus amigos?

É o líder, é o maiorial. Está vencendo sem o craque Fred. Está vencendo sem o craque Deco.

A hora é de controlar os nervos e a ansiedade. Ser líder pesa, exige responsabilidade e cobranças. Hora de empunhar a humildade que sempre tivemos, mas sabendo que o Fluminense não é mais uma promessa de time, e sim uma realidade.

Mais uma semana e nova decisão: o fortíssimo Internacional, no Maracanã. Desimporta que esteja lutando pelo título da Libertadores e, com isso, venha com seu time mesclado ou mesmo reserva. O banco do Colorado é mais forte do que muitas linhas titulares no Brasil. Degrau a degrau, passo a passo, é mais um grande desafio. Resta-nos lotar o Maracanã, gritar, vibrar, torcer e o nosso time fazer o que tem feito.

Não há espaço para a imprensa ridicularizar o Fluminense em suas páginas. No máximo, como sempre, torcer contra. Este não é um time pré-rebaixado por decreto, mas sim um sincero líder que sonha, bem mais à frente, com um dezembro espetacular.


Paulo-Roberto Andel

Friday, August 06, 2010

FLUMINENSE 3 X 1 ATLÉTICO-PR (31/07/2010)


(Mais: Botafogo 1 x 1 Fluminense - 25/07/2010)


O primeiro da lista (01/08/2010)

Quem te viu, quem te vê... mais duas rodadas se passaram e, ao lado da competência, a sorte se alinhou; assim, o Fluminense é novamente o líder do campeonato brasileiro, queiram ou não os marrons, os mais-queridos e outros menos votados no cenário. Temos duas alegrias: a de ver o time no topo da tabela e a de testemunhar os velhos “seca-pé-de-pimenteira” prevendo nossa efêmera liderança, assim como fizeram com os “cálculos” do rebaixamento ano passado. É um autêntico "faz-me rir".

Primeiro, o clássico contra o Botafogo, disputado no Engenhão, com um certo gosto de despedida do Maracanã. Gosto do campo alvinegro, mas ainda preciso sentir um que é um jogo entre os grandes times com lotação máxima por lá. A nossa torcida não se fez de rogada, compareceu em maior número e pareceu animada com o desfecho da dramática possível saída de Muricy: o treinador ficou conosco, ainda que dissessem que contra a vontade. Duvido: nenhum jogador ou treinador fica em clube nenhum no futebol de hoje por obrigação. A verdade é que Muricy quis ficar no Fluminense e o Fluminense queria ficar com Muricy. Estranhíssima também a postura do presidente da confederação, chamando primeiramente o treinador para um café sem qualquer consulta ao clube. Drama à parte, Muricy foi compulsivamente saudado quando da entrada em campo. Havia outras tensões também presentes por conta da colocação na tabela: o Tricolor brigando pela ponta e o Botafogo lutando contra a zona de rebaixamento. Desimporta a pontuação de cada time: era um clássico, e no clássico os times se igualam.

O primeiro tempo foi bastante movimentado e equilibrado, com ligeiríssima superioridade para General Severiano, apenas porque seus finalizadores arriscavam mais. Do nosso lado, Fred e Conca não pareciam bem – o artilheiro, inclusive, saiu machucado em lance sozinho na segunda etapa. A compensar, as estréias de Emerson e Beletti. O primeiro mostrou a garra e velocidade costumeiras dos tempos da Gávea, embora ainda precise de certo ritmo natural para quem não vinha jogando. O segundo, se não fez uma partida brilhante e mostrou também problemas físicos, atuou regularmente e salvou um gol certo do Botafogo no primeiro tempo, quando apareceu como quarto-zagueiro. Mais tarde, por conta do cansaço e de um cartão amarelo, saiu para a entrada de Thiaguinho, que esteve com um pé do Cruzeiro, mas ficou na última hora. Alguns chutes a gol, algumas boas defesas dos dois lados, mas nada que mostrasse a absoluta supremacia de um time sobre o outro - meio ponto a mais para o Botafogo, e só. Nosso maior risco foi numa jogada de Diogo que, ao final do primeiro tempo, quase fez um gol contra, evitado pela providencial defesa de Fernando. A seguir, as coisas mudariam.

Segundo tempo iniciado, de cara Fred deu dois bons passes para Emerson marcar. No primeiro ele perdeu, mas no segundo foi demolidor: driblou Jefferson, que tinha iniciado a jogada com uma reposição de bola errada, e tocou para o fundo das redes, abrindo o placar. A partir de então, uma partida mais nervosa e dividida, até que o Botafogo, desesperado, veio para cima e empatou o jogo a quinze minutos do fim, num cruzamento de Renato Cajá que quicou, não alcançou Edno, mas foi suficiente para superar o pé de Fernando, ganhando o filó. Equilíbrio no jogo, igualdade no placar. Depois disso, o Botafogo quase virou, em cabeçada do nosso velho Antônio Carlos no travessão. E nós também quase ganhamos, em bola que bateu no poste direito de Jefferson depois do cruzamento de Darío Conca. Um placar justo, mas que nos pareceu amargo, já que a vitória corinthiana nos tomara a liderança. Mas o campeonato é disputado palmo a palmo, centímetro após centímetro; portanto, ainda vão rolar os dados. Só que não entendeu isso foram os papagaios da imprensa, que repetiram mil vezes: “O Fluminense é fogo-de-palha; isso já, já, acaba.”. Enquanto isso, Washington, de forma surpreendente, retornou às Laranjeiras. Havia cheiro de gol.

O Maracanã com ótimo público num sábado à tarde, de quarenta mil presentes. O Fluminense, sedento pela vitória e torcendo pela reconquista da liderança. Do outro lado, o time que entregou um jogo vergonhosamente para nos derrubar em 1996, mais o debochado e folclórico Guerrón. O time que é uma espinha na nossa garganta, ainda a ser devidamente digerida. Ingredientes de uma partida para pegar fogo. E foi o que se viu. O Atlético perder um gol feito com o mesmo Guerrón, logo no começo; era um time veloz que não parecia disposto a se retrancar: pelo contrário, queria mandar no Maracanã. Foram vinte minutos de equilíbrio, até que o velho ditado de Muricy prevaleceu: a bola pune. E o algoz é o craque. Bola na lateral-esquerda, Bruno Costa titubeou e perdeu para Darío Conca. O argentino executou cruzamento mortífero para o meio da área. Quando as coisas estão escritas cinco mil vezes, não há como questionar: em condições normais, dada a precária técnica, Washington dificilmente acertaria o chute. Mas estava escrita, ele pegou de primeira e fez um golaço, estufou a rede e carimbou a vitória do Fluminense. Não me tenham como arrogante ou prepotente, essa não é minha marca. O bom Tricolor tem a estampa da humildade. Apenas falo da verdade: depois do gol, o Fluminense foi senhor absoluto da partida, o que não quer dizer que o Atlético não tenha tentado o empate. Nossos onze estiveram bem em campo, sem dúvida: Cássio fez sua partida mais veloz com a camisa Tricolor e, aliando isso à sua considerável técnica, foi um gigante na defesa; Julio César, outrora indeciso, jogava firme. Nem parecia que estávamos sem Fred em campo. Washington, matador quando foi preciso. E o primeiro tempo acabou com o Atlético tentando reagir, mas fornecendo espaços e, a cada vez que o Fluminense arrancava impiedosamente para o ataque, uma voz do além dizia: “São favas-contadas. O Fluminense vencerá. O Fluminense é melhor”. A descida para o vestiário foi confiante: ainda havia o que mostrar no segundo tempo.

Se alguém ainda tinha dúvidas sobre o que seria o Fluminense em seus domínios, não gastou dez minutos para perdê-las. Outra jogada sensacional e surpreendente de Washington, em ótimo passe; a arrancada estonteante de Emerson; o chute impiedoso, inquestionável, veloz e fortíssimo, no alto: em poucos segundos, nova explosão da massa Tricolor em seu campo maior. Os rubro-negros sentiram o golpe: ali, o Fluminense não perderia nunca mais. E os jovens predominaram, para colocar mais velocidade na partida: Alan, bem como sempre, no lugar de Emerson; Fernando, o Bob, substituindo muito bem a Belletti desde o intervalo.

O terceiro gol do Fluminense foi de Washington, após ótimo passe do argentino. Foi a apoteose das três cores, mas poderia ter sido muito mais: antes do passe final, Conca praticamente driblou toda a defesa paranaense; seguro, preferiu servir ao Coração Valente, que não perdoou e empurrou a bola rasteira no canto esquerdo do goleiro Neto. E quando sofremos o primeiro tento, o jogo estava mais do que liquidado, tanto que não naasceu a partir de então nenhuma pressão atleticana.

O Fluminense dormiu no sábado como líder do campeonato e assim continuou, com o empate do Corinthians contra o Palmeiras. Somos os primeiros. Ainda é muito cedo para qualquer comemoração, mas gostaria de lembrar artigos do passado; quando éramos a galinha-morta do campeonato, noutras temporadas, o que diziam é que em doze jogos, se um time estivesse na zona de rebaixamento, já seria bem complicado de se recuperar nos próximos meses. Passou um terço do campeonato. Estamos em agosto. Quatro meses para se saber quem pisará no pantheon do futebol brasileiro. O título do campeonato, depois de vinte e seis anos – e muitas tentativas que ficaram bem próximas da taça – ainda é um sonho. A diferença de hoje para maio, julho e julho, é que hoje este sonho é real.

Para a alegria da enorme massa Tricolor, hoje somos os primeiros. Uma coisa é certa: brigaremos por essa taça, milímetro a milímetro, gota a gota, respiração a respiração. Este ano, nossa meta é cercar e dominar o topo. Nenhum gigantismo, nenhuma falácia insolente: não temos rádios, jornais e tevês para fazer do nosso time um sonho dos mitômanos. Temos trabalho. Um Tricolor me disse no metrô, depois do jogo: “Agora temos um time e um treinador”. Foi o que houve de mais sóbrio ontem. Estamos no páreo e que ninguém se surpreenda com nosso eventual triunfo. Agora é esperar que nada nos atrapalhe dentro do clube e fora das quatro linhas; dentro delas, tudo corre bem sob a batuta de Muricy.

No mais, resta perguntar a quem possa responder: que fim levou Guerrón?


Paulo-Roberto Andel

Friday, July 23, 2010

FLUMINENSE 1 X 0 CRUZEIRO (22/07/2010)


Topo! (23/07/2010)

Era a celebração do centésimo-oitavo aniversário. Era o Maracanã tomado de pó-de-arroz à esquerda da tribuna. Eram trinta mil torcedores dispostos a ver a última pá-de-cal em tudo o que foi mal-escrito contra nosso time no ano passado. Foi um placar magro, o velho um a zero dos tempos pré-campeonato mundial de 1952, quando Telê era o Fio de Esperança em campo e Zezé Moreira escrevia seu nome na história Tricolor. Um a zero. Ponto. O Fluminense venceu e, ao menos momentaneamente, se tornou o líder do campeonato brasileiro de 2010. Quem seria capaz de pensar isso em setembro do ano passado, quando os grandes cientistas e filósofos do futebol tinham decretado a morte do Fluminense? Pois é, a vingança é um prato que se come frio – e no momento certo.

Nada de maus sentimentos. Vamos falar de festa. Que beleza foi a nossa torcida saudando Cuca! A façanha de 2009 está eternizada na história do futebol brasileiro. O Fluminense está morto, era o que se dizia e escrevia incessantemente. Aconteceu uma virada monumental, oceânica – e Cuca teve grande participação neste processo, não à toa sendo imensamente saudado ontem por toda a nossa torcida. E se Cuca teve festa, Muricy também teve a sua: não queremos de forma alguma que, neste momento, o excelente treinador paulista deixe as Laranjeiras, por conta da vigorosa proposta que deverá emanar da CBF.

Foi uma grande noite, mas é importante deixar claro que foi um jogo duro e que não tivemos grandes momentos de gala. O Cruzeiro, bem-armado por Cuca, veio num esquema que parecia até ser bastante defensivo, tendo geralmente oito jogadores na marcação e defesa – no entanto, o perigo estava no bote da Raposa, em contra-ataques velocíssimos felizmente impedidos pela nossa defesa, ainda que Gum estivesse cumprindo uma jornada bastante insegura – chegou a errar quatro jogadas seguidas, talvez ainda confuso pela adaptação ao sistema com três zagueiros. Diguinho, por sua vez, voltou a repetir o velho erro de ter a bola dominada e ser roubado sem perceber, mesmo com milhares de torcedores gritando “Ladrão!”.O veterano Gilberto era o principal coordenador das jogadas do time celeste, que não permitia as nossas investidas de ataque. Outro bom jogador em campo pelo time do Cruzeiro era nosso Everton, vendido tão rapidamente e com tanto a dar pela nossa camisa. E também deve ser registrada a boa atuação do sempre perigoso atacante Thiago. Do nosso lado, com a raça de sempre, Mariano voava em campo – é outro jogador quando comparado com o meio do ano passado. E, se o Cruzeiro estava fechadíssimo, quem seria nossa dupla capaz de desmantelar a sólida defesa azul? Fred e Conca, naturalmente. Entretanto, ambos estiveram abaixo do rendimento normal: Conca, muito marcado, pouco produziu; o craque do nosso ataque parecia lento e com dificuldades físicas até. Aproveito para não agir injustamente com o nosso atual goleiro: quando foi exigido, mostrou-se bem, embora eu discorde da opinião da crítica especializada de que foi o melhor do nosso time ontem. Fez o que cabe a um goleiro que veste a camisa do Fluminense. E, justamente também, conseguiu uma façanha pessoal rara: conseguiu terminar dois jogos seguidos no campeonato brasileiro sem ser vazado, o que talvez possa ser visto como um bom presságio.

Pouco antes do fim do primeiro tempo, um acontecimento foi decisivo para a mudança dos ventos e a construção da nossa vitória: a contusão de Gilberto, que sensivelmente diminuiu o ímpeto cruzeirense, para quem um empate seria ótimo resultado. E ainda houve tempo para a segunda melhor jogada de Conca na partida: um lindo lançamento para Carlinhos, que chutou para a defesa de Fábio.

Na volta para o segundo tempo, Muricy fez a alteração tradicional: pôs Alan no lugar do atrapalhado Rodriguinho, o que deu mais mobilidade na frente para nosso time, já que Fred não estava num de seus melhores dias. Mesmo sem Gilberto em campo, o Cruzeiro continuou a buscar o ataque e quase fez um gol com Thiago. No contra-ataque, houve um escanteio; Conca, que não vinha numa noite excepcional, sendo craque, compensou: cobrou com maestria na cabeça de Leandro Euzébio que, com muita força, acertou ótima cabeçada no canto direito de Fábio e abriu o placar que viria a ser definitivo. Num jogo difícil como estava sendo, era uma promessa de conquistar a importante vitória. Logo em seguida, Alan perdeu outro gol e, a partir de então, Fluminense e Cruzeiro revezaram-se nos ataques, embora o time mineiro tenha sido mais insistente, até porque estava em desvantagem no marcador. Aí, entrou o velho Gum de sempre, não o do primeiro tempo, tirando tudo da nossa área. E o jogo seguiu equilibrado até seu final, embora as equipes estivessem naturalmente desgastadas pela enorme força física aplicada. Terminamos o jogo segurando um excelente resultado: o Cruzeiro partiu para o jogo aéreo, mas a defesa do Fluminense estava imbatível – até o goleiro saiu da meta para defender, fato também raro.

O apito final do árbitro Sampaio significou muito mais do que uma simples vitória. Significou a reconquista do topo, o lugar onde o Fluminense sempre deve estar, no mínimo, bem perto. A torcida das Laranjeiras pode fazer festa sim; nada está ganho, ainda falta muita coisa para um campeonato que está no meio de julho e só terminará em dezembro. Contudo, uma coisa é certa: se os ventos não forem contrariados, o time que promoveu a maior virada em campo da história do futebol brasileiro é candidatíssimo a brigar por, ao menos, uma vaga na Libertadores de 2010. O título é um sonho. Mas real. É hora de sedimentar esse longo - e maravilhoso – caminho.


Paulo-Roberto Andel

Wednesday, July 21, 2010

PARABÉNS, FLUMINENSE


Cento e oito (21/07/2010)

No mundo atual, onde tudo é efêmero, qualquer coisa que dure dez ou vinte anos já merece todas as saudações.

E cinqüenta? E oitenta? E cem anos?

Mais ainda: e cem anos de futebol? E quase cento e dez anos de futebol?

E se essa data coincidisse com a verdadeira gênese do futebol mais vitorioso do mundo?

Sim, amigos, isto é o Fluminense, nascido com a elegância inglesa de Football Club em seu nome, típica de 1902, mas de uma brasilidade indestrutível.

O Fluminense não é o primeiro clube de futebol fundado no Brasil, mas certamente é o que determinou os alicerces do futebol brasileiro, além de pertencer à vanguarda das formações esportivas generalizadas – não à toa, conquistou a Taça Olímpica em 1949, tida como o “Prêmio Nobel” do esporte e, três anos depois, se tornou o segundo time de futebol no Brasil a ser campeão mundial; reparem que estas duas façanhas “cercam” o ano de 1950, tido como o mais trágico da história do futebol brasileiro. Mas nada abala o Fluminense. Absolutamente, nada. Desconfio de que, se um dia, o mundo realmente vier a acabar, a sede da rua Álvaro Chaves, intacta, será um marco da reconstrução do planeta.

Para minhas estatísticas oficiais, comecei a seguir o Fluminense em 1978 – ali, eu já sabia os nomes dos jogadores, que números de camisas ostentavam e tinha ouvido falar de uma certa Máquina (de jogar futebol), que também cheguei a ver mas poucas vezes, carregado pela mão por meu pai e servindo de alegria para torcedores – já contei aqui, mais de uma vez, que num determinado jogo contra um time de camisa diferente, o pessoal da arquibancada me jogava para cima a todo instante e isso impedia que eu comesse meu cachorro-quente Geneal com tranqüilidade: décadas depois, descobri que se tratava de uma goleada da Máquina contra o Vasco. E lá se vão trinta e dois anos, quase trinta por cento da história do clube acompanhada à vista. De tudo o que vi e vi neste tempo, um dia fará nascer um livro. Craques, jogadores medianos, pernas-de-pau, títulos heróicos, derrotas terríveis, grandes treinadores, péssimos treinadores; o saldo positivo é imenso, mas temos os reveses que só engrandecem a história deste amor centenário. Não, meus amigos, o Fluminense não é um time de lendas e mumunhas, um time inventado onde só se vence e se conquista; definitivamente, não! Nossa história é a história que pode ser encarnada em uma pessoa: a pessoa humana, com seus defeitos e inúmeras virtudes. E talvez isso é que incomode a tantos no Brasil: reconhecemos nossos erros e seguimos em frente. O Fluminense não é uma fantasia midiática, mas uma realidade incontestável. Como bem escreveu Marcos Caetano um dia, não fosse o Tricolor das Laranjeiras, talvez a seleção brasileira não ostentasse cinco estrelas no peito. Como escreveu nosso maior patrimônio, Nelson Rodrigues, tudo passará, exceto o Fluminense. Ao lado de Marcos e Nelson, nossos milhões de torcedores contam com a presença nas nossas fileiras de um Tom Jobim, uma Maria Bethânia, um Sérgio Brito, um Chico Buarque e mais um batalhão de famosos e anônimos que, ao seu jeito, ajudaram a construir a mais bonita e charmosa torcida do país – admirada por sua beleza até em momentos terríveis como a perda da Libertadores de 2008: o Fluminense não foi campeão por um triz, mas quem viu a beleza das nossas cores jamais se esquecerá. Até mesmo os jornalistas que costumeiramente tratam o Fluminense com desdém foram obrigados a se curvar: um deles apontou aquela festa no Maracanã como a mais bela que viu no futebol em toda a sua vida. E ai daquele insistir com a mesma velha chacota de que o Fluminense é um time cuja torcida é de “elite”. Elite sim, mas de personalidade; elite intelectual. Os nossos irmãos menos abonados são tão educados quanto os mais ricos, de grandes sobrenomes. A camisa do Fluminense está nas ruas, nos bairros nobres, mas também nos trens e nas vielas; é uma camisa da favela e do asfalto. É uma camisa de pobres e ricos, pretos e brancos, gordos e magros, mas principalmente de gente que lê e escuta. E não podemos ser perseguidos porque as mulheres da nossa torcida são as mais bonitas do mundo: que culpa temos da estonteante genética Tricolor?

Relembro novamente Nelson Rodrigues e, por um instante, na condição de Tricolor, deixo a humildade de lado. Quem venceu trinta títulos estaduais no Rio de Janeiro merece todas as loas. Quem foi o primeiro time campeão do mundo, resgatando o Maracanã para sempre, depois da desgraça de 1950, merece todas as loas. Quem forjou a história da seleção brasileira, dando-lhe casa e Marcos Carneiro de Mendonça como seu primeiro grande goleiro campeão, merece todas as loas. Quem semeou tudo o que aí está em termos da grandeza do futebol brasileiro merece todas as loas. E o que dizer dos grandes campeões de 1941, no Fla-Flu da Lagoa? Ou dos de 1969? E a Máquina? E os tricampeões dos anos oitenta, testemunhas dos fantásticos gols de Assis? Meus amigos, quem esteve do lado direito das arquibancadas no dia 25 de junho de 1995 está condenado à eternidade. Quem saiu do Maracanã naquele 30 de maio de 2007 convicto da grande vitória, quando empatamos um jogo perdido e vencemos a Copa do Brasil na semana seguinte, está condenado à eternidade.

Mais uma vez Marcos Caetano. O cronista, noutro aniversário nosso, escreveu sobre as duas vezes em que, ferido de morte, o Fluminense reagiu como um touro feroz e rasgou as convenções da mediocridade vigente: em 1912, quando venceu a Gávea pelo emblemático placar de três a dois, enfrentando o outrora time Tricolor que para lá migrou, fazendo nascer uma das mais fantásticas rivalidades do futebol mundial. E outra, quando na terceira divisão, vencemos o Náutico numa chuva torrencial com um Maracanã sem arquibancadas e os torcedores quase se afogando na antiga geral. Nestas duas oportunidades, o time que era ridicularizado pela imprensa mostrou ser o maior dos gigantes. Modestamente, eu acrescentaria aqui outro momento, dividido em duas temporadas. Nos anos de 2008 e 2009, o Fluminense era tido como o João-Bobo do futebol brasileiro, massacrado por rádios, jornais e canais de televisões. Era o rebaixado, o aniquilado, o borra-botas. O resultado todos sabem: duas reações fantásticas - especialmente a do ano passado, que considero a maior virada da história do futebol brasileiro em campo e que serve de silenciador para aqueles que nos acusam por erros do passado. O time que soube passar por aquela tempestade está preparado para vencer. Muitas vezes, também fui ridicularizado por escrever obsessivamente: “O Fluminense não cairá”. Não me cabe nenhuma vidência ou sorte, nenhuma superioridade intelectual, absolutamente nada. Apenas sou Tricolor e, neste terço de vida do clube, testemunhei muitas vezes o que esta centenária camisa e essa maravilhosa torcida são capazes de fazer. Estava na cara que o Fluminense não cairia. A junção de nossa camisa com um time de garra jamais falhou neste cento e oito anos; em dezenas de vezes, o adversário era tido como o favorito e saímos campeões. Essa é a nossa sina: desafiar paradigmas.

Sete meses depois dos seguidos atestados de óbito que a imprensa falaciosa nos impôs, o Fluminense entrará no sagrado Maracanã amanhã para jogar contra o Cruzeiro e, em caso de triunfo mais alguma sorte, se tornar o líder do campeonato brasileiro. Quem sabe vem por aí mais um título? Digo mais um porque a entrada de uma taça em nossa sala de troféus equivale a um passageiro pegar um transporte coletivo na hora do rush carioca.

Então o Fluminense pode ser tornar o líder do Brasil? Sim!

Quem espera sempre alcança.

Emudecidos estão aqueles que tentaram vilipendiar nosso hino.

Todos os parabéns ao nosso Fluminense e aos nossos dez milhões de amigos, com quem dividimos essa paixão. São cento e oito anos. Serão cem mil um dia.


Paulo-Roberto Andel

Monday, July 19, 2010

SANTOS 0 X 1 FLUMINENSE (18/07/2010)



Firme no topo (19/07/2010)

A dois dias de seu centésimo-oitavo aniversário, o Fluminense parece finalmente ter reencontrado o caminho das boas campanhas. Na próxima quinta-feira, nosso time entrará no gramado do Maracanã para enfrentar o Cruzeiro, na condição de vice-líder do campeonato brasileiro – à nossa frente, está o Corinthians, que nos venceu em um jogo onde tivemos tudo para, no mínimo, empatar a partida.

Não foi nada fácil o retorno ao campeonato. Quinta passada, o time deixou a torcida insatisfeita após o inesperado empate com o Prudente em casa. A torcida fez sua parte: iluminou a esquerda da Tribuna de Honra do sagrado estádio com isqueiros e colocou o time para cima. Fizemos um primeiro tempo de bela apresentação, com o gol de cabeça de Fred e perdemos outras chances. O que se viu em campo nos quarenta e cinco minutos iniciais foi um Fluminense senhor do jogo, com criação e arremates, ainda que Conca não estivesse numa noite de gala. No segundo tempo, o time minguou, ainda atacou, mas perdeu a força, o ímpeto e foi castigado com o gol de empate a dez minutos do fim, no primeiro chute real do Prudente em toda a partida. Veio o desespero e uma virada poderia significar forte abalo no time de Muricy, o que felizmente não aconteceu. Mas o empate deixou um gosto passado de derrota. O triunfo nos colocaria na liderança da competição, mas não deu certo. Pior: recuperar os pontos perdidos em casa contra o próximo adversário significava ter que vencer o poderoso Santos, dono da mais talentosa linha de ataque do Brasil, dentro de seus domínios. E, contrariando até mesmo os mais otimistas Tricolores, aí sim deu certo. O Fluminense venceu um dos mais difíceis adversários neste ano, numa partida em que suou muito. Em quatro dias, fomos da decepção à completa alegria.

Curioso o futebol. Contra o Prudente, com exceção dos dez minutos finais, quando entramos em choque com o empate, o Fluminense dominou o jogo amplamente, mesmo oscilando bons momentos com alguns de lentidão e dispersão. Ao cair de produção e não agredir mais na segunda etapa, o time vendia a idéia de que o jogo estava liquidado e isso se mostrou um ledo engano. De toda forma, o time foi superior em campo - ainda que isso seja discutível, pois muitos defendem que a superioridade se comprova pelos números e, de fato, fomos vacilantes nas conclusões. O jogo contra o Santos foi diferente. O Fluminense entrou ardiloso, matreiro e disposto a enfrentar a verdadeira avalanche que foi o ataque do Santos em praticamente toda a partida. A surpresa que Muricy preparou, entrando com três zagueiros, de certa forma controlou o ótimo ataque santista. Não foi o Fluminense da quinta, atacando obsessivamente, mas sim um Fluminense controlado, defensivo sim, buscando as brechas para poder contra-atacar. Tudo poderia ser mais tranqüilo, não fosse a insistência do atual goleiro Tricolor em chutar todas as bolas para frente e para o alto, recurso que se mostrou inútil porque só municiava ainda mais a ligação do Santos entre meio de campo e ataque, afora inúmeras bolas na lateral gratuitas, o que aumentou nossa pressão arterial consideravelmente. Porém, a qualidade da nossa marcação prevaleceu, e mesmo levando um verdadeiro sufoco, conseguimos o empate sem gols na primeira etapa. Uma preocupação era Diguinho, já punido com cartão amarelo e fazendo sucessivas faltas. Encaixamos alguns contra-ataques e até poderíamos ter marcado, mas ficou clara a total supremacia do Santos em termos de volume de jogo. Conseguir um ponto na Vila de Pelé contra um time que certamente disputará as primeiras colocações – e, por isso, vai tirar muitos pontos dos outros concorrentes – já seria um excelente negócio. E o segundo tempo nos prometia ainda mais, pela disposição do nosso time em campo, bem distante das merecidas vaias contra o Prudente. Uma diferença na escalação iria nos proporcionar o grande momento do jogo de ontem: na quinta, Alan começou e Rodriguinho entrou na segunda etapa; dessa vez, foi o contrário. E que presságio!

Voltamos mais dinâmicos, mais ofensivos, sem descuidos na marcação, que foi adiantada. O Santos se manteve perto da nossa área e criou novas chances, mas nós também atacávamos, mais do que no primeiro tempo, e isso trouxe um maior equilíbrio ao jogo. E Alan entrou no lugar de Rodriguinho, a substituição inversa do jogo anterior. Ganhamos em condução de bola, movimentação na frente e, principalmente, finalização – Alan é, sem sombra de dúvidas, o melhor finalizador revelado nas Laranjeiras nos últimos tempos. Assim, um olho no peixe e outro no gato. O Santos sentiu que não seria fácil conquistar a vitória, mas não poderia se contentar com o empate em casa, o que lhe fez atacar ainda mais e, diferentemente do outro tempo, deixar espaços vazios na defesa, que é o ponto menos luminoso da equipe. Conca fez uma linda jogada de calcanhar, Carlinhos chutou forte e o goleiro Rafael mandou para escanteio. O Fluminense virou tocha: pegou fogo e mostrou ser um time temível fora do Maracanã. A vitória poderia vir para qualquer um dos dois. A Vila Belmiro veio abaixo quando nosso travessão tremeu e quase tudo ficou perdido.

Mas o Fluminense tem Mariano, o Rei Zulu da nossa lateral, que vinha jogando com muita raça e tentando vários passes de qualidade. Ele driblou ninguém menos que o cotadíssimo Paulo Henrique “Ganso”, chegou perto da linha de meio-campo e acertou um lançamento primoroso para a direita do ataque, vazia. Quem ali estava era Alan, que entrou na área e não perdoou: chute rasteiro na diagonal, canto direito do goleiro Rafael, que nada pôde fazer. E abrimos o placar a dez minutos do fim, contra o time que tem o melhor ataque do Brasil, repito. Nossa defesa não fica atrás: a segunda menos vazada do certame. Nessa disputa, vencemos.

Ainda houve tempo para o Santos perder um gol incrível, com Robinho praticamente embaixo do travessão. Ao contrário de quinta-feira, onde tudo parecia festa e terminou com gosto de decepção, ontem era o nosso dia e tudo deu certo. Um campeão precisa de muitas qualidades e, dentre elas, a sorte – que é imprescindível. Não foi uma mera vitória de sorte, contudo: vencemos porque temos um técnico diferenciado, que soube surpreender o adversário; vencemos porque fizemos uma boa exibição; vencemos, porque soubemos desta vez matar a partida no momento certo; e também vencemos porque, nos momentos cruciais contra um adversário dos mais fortes, as boas luzes nos sorriram – dentre elas, a da sorte.

Agora é outra quinta-feira. O Fluminense busca consolidar sua posição de postulante ao título ou à vaga na Copa Libertadores de 2011. De certo, teremos a empolgação de milhares de torcedores e um time de guerreiros em campo? A outra quinta já passou. Quem espera sempre alcança.


Paulo-Roberto Andel

Monday, July 05, 2010

QUINZE ANOS DEPOIS (26/06/2010)












Devia ser perto de quinze para as sete da noite. À minha esquerda, silenciosos como se estivessem cabisbaixos – o que não era possível na situação que descreverei – Dória e Gomão aparentavam tranqüilidade. O concreto do assento gelava como nunca. Perto de nós, poucos milhares de correligionários tomavam coragem para levantar e descer o acesso das arquibancadas, numa verdadeira procissão da derrota. Do outro lado do anel cinza, cinqüenta mil rubro-negros ou setenta, ou noventa mil, berravam pelo barulho de uma multidão no reveillon de Copacabana, comemorando com dez minutos de antecedência o que consideravam o título mais certo de toda a sua história – o centenário da Gávea, no campeonato carioca de 1995. Essa era a fotografia que pude tirar da memória, a última antes de um contra-ataque iniciado por uma defesa de nosso goleiro Wellerson, com os pés – a seguir, a bola na ponta-direita, dois cortes secos de Ailton (que, de longe, eu confundi com Ronald) e o chute no canto direito do goleiro Roger, aquele que se dizia perfeito. E o momento mais feliz que tive no futebol em toda a minha vida. O ápice que jamais será superado. O Fluminense é eterno e gigantesco; por isso, terá títulos e títulos a granel nas próximas décadas. Voltará à América e bisará o título mundial de 1952. Contudo, igual àquele ano incrível, com desfecho mais incrível ainda, quem viu, viu; quem não viu, pode tentar sentir um fiapo de cabelo do que foi aquilo revendo vídeos ou partilhando experiências com amigos mais velhos.

E como se deu aquela apoteose?

No segundo turno da fase final do campeonato carioca, estivemos nove pontos atrás; reduzimos a diferença no jogo final para apenas um. Tudo para o último jogo, conta o favorito campeão da imprensa, tendo o empate a seu favor. O primeiro tempo foi um massacre Tricolor como nunca se viu na história: dois a zero deveriam ter sido pelo menos seis, debaixo de chuva feita pelo nosso futebol. O segundo tempo veio morno, até que um mau agouro sobrevoou o gramado: nosso Branco, velho de guerra, visivelmente desconfortável contra nossa camisa, acertou um balaço no travessão de Wellerson; isso despertou a Gávea e, logo depois, Romário marcaria seu primeiro gol como profissional contra o Fluminense. Ainda muito breve, Fabinho, que nunca tinha chutado bola na vida nem perto da grande área, driblou na direita do ataque e empatou o jogo num belo arremate. Pronto. Tudo parecia perdido. Cinco meses de competição, dois outros Fla-Flus vencidos por nós com total autoridade nos turnos iniciais, nove pontos de vantagem quase recuperados, um primeiro tempo impecável e devastador. Tudo jogado fora? A Gávea empatou o jogo num intervalo de seis minutos, entre os 26 e os 32; a treze minutos do fim, portanto. A massa flamenga explodiu no Maracanã de um jeito como eu nunca tinha visto antes, até então com dezessete anos de freqüência regular no estádio, e nem voltei a ver depois. A nossa torcida, sempre valente e fiel, mas inferiorizada numericamente, achou demais aquele golpe: um jogo praticamente ganho entregue em dois lances isolados, seguidos, afora testemunhar um tri-vice-campeonato (fomos os segundos em 1993 e 1993). Era demais. Nove anos sem títulos. E muitos foram embora das arquibancadas de Mário Filho, o que eu mesmo só não fiz por dois motivos: o primeiro, porque já tinha sentido o péssimo gosto do vice nas temporadas anteriores; segundo, porque como testemunha do monumental gol de Assis em 1983, não poderia deixar de acreditar no que muitos consideravam um milagre. E então Wellerson defendeu a bola no canto direito com o pé, e então o Fluminense foi para o contra-ataque e marcou o gol mais difícil e esperado de toda a sua história, vencendo uma das maiores partidas de todos os tempos com apenas oito jogadores em campo.

Depois do maior gol de todos os tempos, que selaria a maior vitória de todos os tempos, o que lembro era da enorme e colossal torcida da Gávea em absoluto silêncio, enquanto nossas arquibancadas eram cheias de gente chorando, ajoelhada, incrédula, estupefata. Tudo inédito para mim. Lembrei dos meus amigos botafoguenses do passado, que acompanhei várias vezes ao estádio para, na torcida alvinegra, ver fatos semelhantes. Nunca a torcida do Fluminense comemorou um gol daquele jeito. Não houve uma explosão, mas sim uma implosão. Ali, não éramos torcedores ensandecidos perto de testemunhar um dos maiores feitos da centenária história do nosso time, mas sim integrantes de uma procissão divina. E aqueles cinco minutos finais, com os descontos, duraram um ano-luz na escuridão. Antes disso, Gomão continuou impassível, tranqüilo, e Dória teve um espasmo contra a torcida flamenga. Assim como os mortos ressurgiram de suas tumbas para um grande Fla-Flu, nossos milhares de torcedores que deram a causa como perdida invadiram a nossa arquibancada de volta, o que feriu a Gávea de morte: setenta mil pessoas mergulhadas em silêncio e torpor esplêndidos, mesmo com seu time tendo dois jogadores a mais em campo. E os nossos adentrando e colorindo o cinza do concreto.

Quando Leo Feldman apitou o final do jogo, experimentei a sensação diferente de ver o Fluminense ser campeão depois de uma longa temporada, fato que nunca havia me acontecido. Muita alegria, mas também muito choro, não de tristeza, sim de emoção à flor da pele. Talvez não tivéssemos a exata noção da grandeza daquele momento épico e único: uma das maiores vitórias no maior estádio do mundo que abriga o melhor futebol do mundo. Lembro de, mais tarde, ter ido às Laranjeiras, onde Pierri Carvalho chorava ao falar do título; um pedacinho da grama está até hoje numa velha carteira que tenho em casa. No dia seguinte, abraçar minha linda amiga Luciene na faculdade, tão Tricolor, teve sabor de delicia dupla.

Quinze anos depois, o Fluminense teve grandes e maravilhosos momentos, assim como outros bastante tristes, mas já superados. Foram momentos. Vinte e cinco de junho não foi um momento. Não passou. Não passará jamais. Ainda hoje em certos jogos, quando chego mais cedo ao Maracanã, gosto de ir nas arquibancadas verdes do lado direito para ficar perto do que foi meu local naquele dia inesquecível. E revejo o lance, o corte e o gol. Niguém tirará esta imagem de mim durate o resto de minha vida.

Cheguei até esta linha e ainda não falei de Renato. Nem seria necessário. Todos sabem o que foi a passagem de Renato pelo Fluminense naquele ano. Chegou desacreditado, vetado por vários outros times cariocas; o Fluminense era sua última ficha. O campeonato estava badaladíssimo pela presença de Romário, então o melhor jogador do mundo; ao Fluminense, a imprensa, com exceção de Washington Rodrigues, reservava o papel de bobo da corte, de mero coadjuvante. Mergulharam no mar vermelho da ignorância. E Renato não foi apenas o autor de um dos gols mais importantes da história do Maracanã; não foi apenas o melhor jogador do campeonato. Renato É a própria taça de campeão carioca de 1995 em forma de carne, camisa e alma.

Quando vejo uma faixa jocosa da Gávea nos Fla-Flus recentes, acho graça. Quem debocha dos versos de nosso hino, “Quem espera sempre alcança”, está condenado ao maior dos fracassos – e certamente sem a elegância dos milhares de outros rubro-negros que, de pé, aplaudiram a monumental volta olímpica do Fluminense naquele nada distante vinte e cinco de junho, que foi, é e será um dos maiores dias de toda a nossa eterna história. Todas aquelas imagens eu carrego em mim como se fosse agora, há coisa de cinco minutos. Um choro de alegria. O melhor dia de torcedor de toda a minha vida.


Paulo-Roberto Andel