Thursday, February 22, 2007

Quatros

Era um jogo que praticamente não tinha grande valor, exceto o de manter a mística do confronto entre Vasco e Fluminense. O Tricolor, já fora da disputa; o Vasco, já classificado. Entretanto, foi uma das melhores partidas do ano, até por causa do descompromisso das equipes. Mesmo sob o forte calor, foi uma partida de grande velocidade, ataques empolgantes e que, apesar da vantagem Tricolor no placar durante boa parte do tempo, jamais pareceu absolutamente decidida. Fora de campo, a polêmica envolvendo o treinador Renato, que poderia ter ido para Laranjeiras mas acabou optando pela estabilidade vascaína. Uma pena que a atual programação do futebol carioca, priorizando jogos no sábado de Carnaval para o comparecimento de turistas, tenha ficado desalinhada pelo baixo público no estádio, com quase unanimidade vascaína. Compareceram cerca de dez mil pessoas, e seria justo que lá tivessem uma quarenta mil. Preços altos, temperatura alta, falta de estrutura e outros fatores acabaram tornando o Maracanã vazio numa linda tarde de um excelente jogo.
O Fluminense começou vigoroso, abrindo o placar no começo da partida, coisa de dez minutos, com um potente chute do jovem Soares, de fora da área, bela finalização e típica dos centroavantes do passado. Minutos depois, ele perdeu um gol inacreditável, chutando duas vezes em cima do arqueiro vascaíno Cássio. Outros gols foram perdidos e, como se sabe, não há perdão no futebol: houve um cruzamento, e o atacante Leandro cabeceou a bola no meio do gol, ainda que com certa força. O goleiro Berna falhou clamorosamente e o empate foi decretado.
Em diante, o Vasco passou a pressionar ligeiramente, dentro da enorme velocidade da partida para uma temperatura abusiva de trinta e muitos graus. Curiosamente, quando o jogo parecia-lhe favorável, ao final do primeiro tempo, Cícero cabeceou e fez o segundo gol do time. Jogo encerrado, intervalo. Não é possível dizer se a mudança do comportamento Tricolor, para melhor, foi obra do trabalho do interino treinador Vinícius Eutrópio - mas que o time correu como nunca tinha feito este ano, é fato inegável. Além do mais, Vinícius mostrou ser dado a ajustes simpes e interessantes - como o de colocar os entrosados Cícero e Soares juntos, para facilitar a equipe.
Recomeçado o jogo, novamente o menino Soares voltou a marcar, abrindo 3 x 1 e talvez causando uma forte expectativa de vitória. Porém, todos sabemos que dois gols são sempre pouco para sustentar uma vitória quando dois times de tradição estão em campo. Em seguida, para delírio vascaíno, Romário adentrou gramado, bem ao seu estilo: poucos passos, leves trotes. Espreita.
A vantagem foi realmente ilusória, dado que Leandro fez novo gol, no laço, e manteve a diferença mínima. Equilíbrio absoluto, manutenção do corre-corre debaixo do sol equatorial. E novas emoções.
Houve uma jogada na área vascaína, a dividida com Cássio e a bola sobrou na entrada à direta da área, no ataque tricolor. O experiente Alex Dias, até então apagado no jogo, acertou um sem-pulo lindíssimo, no ângulo, e confirmou o quarto gol tricolor. Novamente os ares de vitória seriam contemplados? Novo engano. Diego, lateral-esquerdo do Vasco, motivador de imensas críticas do amigo Zé Catalano, cobrou uma falta na entrada da área do Tricolor, esquerda do ataque, e fuzilou Berna sem piedade, bola no ângulo e terceiro gol vascaíno, ainda mantendo a vantagem mínima do Fluminense, com tempo ainda suficiente para uma reação e vibração de torcedores como Amâncio Cezar. Os poucos torcedores das Laranjeiras perceberam o baque: nós tínhamos sempre golpeado o Vasco, feto fôssemos boxeadores com potentes jabs, mas eles retucavam em seguida e nos passavam a sensação de que não haveria knock-out de jeito algum. Marcamos quatro tentos, eles reagiram em todos.
Não deu outra. Final do jogo, uma jogada muito confusa e Thiago colocou seu braço rente ao corpo para desarmar um ataque do argentino Conca. Como torcedor, tenho absoluta tranquilidade em dizer que houve a intenção clara de Thiago, e seria fatalmente pênalti. O problema é que a jogada foi feita fora da área. O árbitro Gutemberg marcou dentro e, portanto, penal. Os protestos do Tricolor foram justos; contudo, pênalti é pênalti e caso encerrado. Todos esperavam que o até então discretíssimo Romário partisse para a cobrança; entretanto, percebendo o excelente momento de artilharia de Leandro, deixou para que ele cobrasse, sem pestanejar. Foi uma cobrança bem no canto direito de Berna, que foi bem na bola dessa vez, mas não a ponto de impedir o gol que, na altura dos acontecimentos, foi o carimbo do resultado final.
O clássico foi emocionante e corrido, digno do futebol carioca, quatro para lá, quatro para cá, quatros. Ao mesmo tempo, em Moça Bonita, de acordo com o velho placar de Maracanã, o Flamengo foi impiedosamente goleado pelo Madureira, sob o calor saudita, com quatro gols de Marcelo, cria de Laranjeiras. Classificaram-se por causa da inesperada derrota do Botafogo para o Boavista, e isso pode ser um dos desígnios que o futebol dá aos campeões, a sorte.
O Vasco segue em frente e luta pela Guanabara; a boa atuação do ataque Tricolor credencia o time para avanços. Resta saber se o novo comandante, a ser anunciado em breve, conseguirá cristalizar as expectativas. É o que já cogitávamos, desde já, eu e os amigos Leonardo e Rita, numa garbosa mesa da Parmê pós-jogo.
Paulo Roberto Andel, 19/02/2007

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